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OPINIÃO ECONÔMICA
Nove anos de Plano Real
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Faz nove anos que o real passou a ser a moeda legal dos
brasileiros. Esse aniversário, comemorado na última terça-feira,
não foi lembrado pela maioria
dos brasileiros. Nenhuma manchete nos jornais ou especial de televisão chamou a atenção do cidadão para tal data.
"Os brasileiros são uns injustos",
dirá algum seguidor contemporâneo de Machado de Assis! "Esquecem as datas mais importantes de
sua história", completaria o nosso
cético da cidadania brasileira. Tenho uma opinião diferente, mesmo pertencendo a uma geração
que lutou com empenho para que
tivéssemos no Brasil uma moeda
decente e estável. Aniversário da
criação de uma moeda nacional
estável e forte não é para ser comemorado como uma vitória cívica. Ter uma moeda estável é
uma obrigação de qualquer sociedade, mesmo tendo as mazelas sociais que caracterizam a brasileira.
Combatente precoce da busca
da estabilidade monetária, pertenci, em 1986, a um pequeno grupo de economistas que foi para as
trincheiras do Banco Central lutar
contra a inflação, que dominava
nossa economia havia mais de dez
anos. Abatidos pelo fogo amigo do
governo Sarney, este mesmo que
hoje preside nosso Congresso Nacional, fomos obrigados a nos retirar para a vida privada em meio à
revolta da população contra o engodo do Plano Cruzado. Entendemos, apesar de nossa juventude
profissional, que o cidadão não se
revoltava nas ruas contra a tentativa de devolver ao país uma moeda decente, mas contra a desilusão de ter de voltar a viver uma
corrida maluca para evitar a corrosão inexorável do poder de compra de seus salários.
Durante oito anos curtimos nosso fracasso, procurando corrigir,
sob a liderança intelectual de Pérsio Arida, André Lara Resende e
Chico Lopes, alguns conceitos que
haviam servido de base para o
Plano Cruzado e detalhando, com
mais cuidado e maturidade, procedimentos para uma nova investida -seria apenas um sonho?-
contra o dragão da inflação indexada. Fernando Henrique Cardoso foi nosso instrumento político
para essa segunda chance. Ao
contrário do político do Maranhão, FHC tinha entendido as vozes da rua em 1986 e estava disposto a liderar aquela nova investida para devolver ao Brasil o direito de ter uma moeda decente.
O resto é a história de sucesso
que todos conhecemos. Apesar de
inúmeras crises de natureza financeira por que passamos nestes
longos nove anos -a desvalorização de janeiro de 1999 ou o choque
de oferta que atingiu o setor elétrico no ano seguinte- ou de natureza política, como a que ocorreu
na campanha eleitoral do ano
passado, temos hoje uma taxa de
inflação decente, de 6% ao ano.
Prova cabal de que temos uma defesa estrutural, que ganhou a opinião pública -que aceita até sacrifícios brutais, como este pelo
qual estamos passando-, para
evitar a volta do dragão endemoninhado.
Sei que sempre teremos economistas radicais que vão me atacar
pela afirmação de que o índice de
6% ao ano é uma "inflação decente". Para esses verdadeiros zumbis
da nacionalidade, somente uma
inflação européia, próxima de 2%
ao ano, pode ser considerada aceitável -e ela deveria ser perseguida a ferro, fogo e sangue da sociedade e da democracia.
Mas vou deixar esses lunáticos
de lado, embora muitos deles estejam hoje em postos importantes
no governo Lula, e voltar a falar
do sucesso do real para aqueles
que entendem que a moeda de um
país é um valor social que reflete
as cores de uma sociedade em um
certo momento de sua história.
Aceita essa realidade, podemos ter
um certo orgulho do caminho trilhado e olhar para outros desafios
que se colocam para nós, brasileiros, hoje.
O povo, que é sempre uma referência importante para quem comanda a direção do país, já incorporou esse avanço, como mostra
recente pesquisa do Ibope, realizada sob o patrocínio da CNI. Para o
brasileiro, nesta ocasião em que
lembramos os nove anos do real,
os dois grandes desafios de hoje
são a volta de crescimento econômico (52% dos entrevistados) e a
melhoria dos salários (21%). A inflação é hoje uma preocupação
para apenas 18% dos entrevistados, principalmente entre aqueles
de mais idade. Para a faixa etária
mais jovem, o velho dragão endemoninhado não existe!
A razão para essa inversão de
prioridades é muito simples de entender. Nestes nove anos que
transcorreram, desde a entrada
em circulação do real, o crescimento foi medíocre: apenas 2,2%
ao ano, em média! Para uma sociedade cuja população cresce
perto de 1,4% ao ano, tal desempenho é insuficiente para provocar a melhoria do padrão de vida
dos brasileiros. Crescer de forma
constante durante os próximos
dez anos é a única via para termos
um Brasil melhor e mais justo. Esse é o nosso desafio de hoje, da
mesma forma que o combate à inflação foi a grande luta dos tucanos, então ainda jovens, na década de 90 do século passado.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 60,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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