São Paulo, sábado, 04 de setembro de 2004

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RECEITA ORTODOXA

Diretor do Fundo diz em Brasília que não vê ameaça inflacionária e admite reduzir meta do superávit primário

FMI sinaliza com alívio no aperto fiscal

ANDRÉ SOLIANI
NEY HAYASHI DA CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O FMI (Fundo Monetário Internacional) sinalizou ontem que o Brasil poderá, no futuro, reduzir seu esforço fiscal. É a primeira vez desde que o país começou seu atual programa de estabilização com a instituição, em 1998, que uma autoridade do Fundo fala sobre a possibilidade de reduzir, não de aumentar, a meta de superávit primário (economia do governo para pagamento de juros).
"No futuro, talvez haja alguma margem para a alteração dos objetivos fiscais de modo a criar espaço adicional para o investimento público, contanto que isso seja feito em perfeita sintonia com a sustentabilidade da dívida", afirmou, por meio de nota, o diretor-gerente do FMI, Rodrigo Rato, que esteve ontem em Brasília.
A meta de superávit primário acertada com o Fundo é de 4,25% do PIB (Produto Interno Bruto, a medida das riquezas produzidas no país) neste e no próximo ano.
O atual acordo termina em dezembro, e o Brasil ainda não decidiu se irá renová-lo.
Rato, que almoçou com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, não poupou elogios à economia brasileira. Foi até um pouco mais otimista que o Banco Central com relação à inflação. "Neste momento, não vemos grandes pressões inflacionárias", disse, ao responder a pergunta sobre a necessidade de o BC elevar os juros. Rato ressaltou que a decisão dos juros é exclusiva do Banco Central. "A política monetária brasileira está adequada", concluiu.
A ata da última reunião do Copom (Comitê de Política Econômica) indicou na semana passada que poderia ser necessário subir os juros para compensar a alta do petróleo e o pessimismo do mercado em relação à inflação.
Nas discussões que Rato manteve com as autoridades, a necessidade de aumentar os investimentos públicos foi tema central. Ele concordou com o governo que é preciso elevar os investimentos públicos para manter o ritmo de crescimento. Rato também se encontrou com o presidente do BC, Henrique Meirelles, e o ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda).
"O aumento do investimento público também é importante para incrementar a produtividade e eliminar os gargalos que impedem o desenvolvimento econômico", diz a nota do Fundo.
A maior parte desses novos investimentos, contudo, não deverá sair do novo sistema de contabilidade que o Fundo está disposto a criar, retirando gastos do cálculo do superávit primário, que deve ser anunciado em março.
"As possibilidades de aumento sustentado do investimento público deverão ser criadas, sobretudo, pela transferência de despesas correntes provenientes de áreas menos prioritárias", disse ele.
Rato deixou claro que o espaço para mudanças no sistema de contabilidade é limitado: "O que nos parece imprescindível são duas questões: a primeira é não perder a credibilidade da contabilidade pública. A segunda é reconhecer que determinados investimentos, que são divididos com o setor privado, devem ser incluídos no Orçamento de forma diferenciada e ao longo de um prazo mais amplo".
Palocci fez questão de ressaltar que o Brasil não pretende usar essas mudanças nos critérios para reduzir a economia para o pagamento de juros. "Não há reivindicação do governo brasileiro de mudar o cálculo de superávit primário. Isso não seria benéfico." Para ele, o país não pretende "enfraquecer seu esforço fiscal".
Sobre a sustentabilidade de crescimento econômico, Rato se mostrou confiante. "Acreditamos que foram assentadas bases profundas para avançar no desenvolvimento do potencial de crescimento da economia brasileira e fazê-la ter uma maior capacidade de absorver choques externos."
Rato enfatizou a importância de seguir com reformas estruturais, como a aprovação de uma nova legislação trabalhista, a criação de um ambiente mais favorável ao investimento privado e o estímulo a uma maior concorrência entre os bancos, para manter o ritmo de crescimento. "Estamos num momento muito adequado, numa janela de oportunidade para continuar num processo de reforma."


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