São Paulo, sexta, 4 de setembro de 1998

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A ÚLTIMA GOTA
Instituto que antecipou a moratória divulga hoje uma pesquisa provando que o país dará calote na dívida
Estudo prevê bancarrota russa para breve

CLÓVIS ROSSI
do Conselho Editorial

A Rússia entrará em bancarrota no máximo até o final do ano e, portanto, não terá como pagar sua dívida externa, avaliada em cerca de US$ 130 bilhões.
A informação apocalíptica foi divulgada ontem pelo jornal "Nezavisimaya Gazeta", de baixa circulação (52 mil exemplares), mas elevado prestígio nos meios financeiros.
O que dá maior credibilidade à notícia não é tanto o jornal que a publicou, mas o autor do estudo que será divulgado hoje, provando a impossibilidade de a Rússia cumprir com seus compromissos externos.
Chama-se Andrei Illarionov, é presidente do Instituto de Análises Econômicas e foi o autor da previsão de que o país decretaria a moratória e de que entraria em colapso o esquema de títulos do Tesouro russo chamados GKO.
Illarionov antecipou ao "Nezavisimaya Gazeta" que a bancarrota da Rússia é "inevitável", conforme os números de pesquisa que seu instituto só divulgará hoje.
Coincidência ou não, hoje a Duma (equivalente à Câmara de Deputados no Brasil) deverá votar, pela segunda vez, o nome de Viktor Tchernomirdin para primeiro-ministro, depois de tê-lo rejeitado no início da semana.
A "Nezavisimaya" é de propriedade do milionário Boris Berezovsky, um dos principais financiadores da campanha do presidente Boris Ieltsin, mas que rompeu com ele posteriormente, a ponto de ter dito ontem que o presidente deveria renunciar.
O jornal, com base na pesquisa de Illarionov, diz que, uma vez decretado o calote na dívida, os credores estrangeiros tentarão obter o sequestro de todos os ativos russos no exterior, sejam imóveis ou contas bancárias, como forma de cobrir seus prejuízos.
Anteontem, o jornal britânico "Financial Times" já havia anunciado que os credores da Rússia se preparavam para essa atitude extrema, mas para tentar recuperar os prejuízos decorrentes da recente moratória declarada pelo país.
Nesse cenário, tornam-se cada vez alarmistas as previsões sobre o desdobramento da crise na Rússia, a ponto de um jornal de negócios, usualmente moderado, ter comentado, anteontem, que o confronto entre o presidente Ielstin e o Parlamento poderia levar a uma crise institucional e a uma "possível guerra civil".
O comentário foi publicado pelo "Kommersant Daily", principal diário de negócios. O cenário previsto pelo jornal é o seguinte:
1 - o Partido Comunista, majoritário na Duma e contrário à indicação de Tchernomirdin, se recusará, quantas vezes for o caso, a aprovar sua indicação. Após a terceira recusa, Ieltsin tem o direito de dissolver o Parlamento e, em consequência, convocar novas eleições;
2 - mas os comunistas não aceitarão. Ao contrário, tentarão dar início a um processo de impeachment contra o presidente, conforme, de resto, foi confirmado ontem por Gennadi Seleznyov, líder do partido na Duma.
O raciocínio fecha com a avaliação de que "a esquerda, hoje, é capaz de levar muito mais gente às ruas e muitos serão líderes prontos para armar uma revolta mais firme que em outubro".
Em outubro de 1993, Ieltsin esmagou a fogo uma rebelião do Parlamento, montada por saudosistas do comunismo, tendo a rua a seu lado, ao contrário do que prevê agora o jornal.
Previsão, de resto, confirmada por pesquisa ontem divulgada e que mostra que apenas 26% dos consultados querem que o presidente continue no poder. Sessenta e sete por cento culpam Ieltsin pelos problemas da Rússia.



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