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Encontro acaba sem acordo sobre novo crédito emergencial e cálculo diferente do superávit primário buscados pelo país
Brasil só obtém elogios em reunião do FMI
FERNANDO CANZIAN
DE WASHINGTON
NEY HAYASHI DA CRUZ
ENVIADO ESPECIAL A WASHINGTON
Muito elogiado pela sua política
monetária austera, o Brasil saiu
ontem do encontro anual de 2004
do FMI (Fundo Monetário Internacional) em Washington sem ter
obtido nada de prático. As demandas brasileiras continuam
em "fase de estudo" no Fundo.
Prevendo não renovar o atual
acordo, que vence em março, o
Brasil deve chegar lá sem que haja
um consenso sobre uma nova linha de empréstimo emergencial
para crises que propõe para países
que não tenham programas com
o FMI.
Na direção contrária, e com o
apoio de países como o Japão, ganhou força a criação de outro mecanismo, batizado de PMA (Acordo de Monitoramento de Políticas, na sigla em inglês).
Segundo ele, países sem um
acordo formal, como pretende estar o Brasil no ano que vem, poderiam ter o monitoramento do
FMI, mas nenhum acesso a dinheiro na iminência de uma crise.
Para ter os recursos do Fundo, um
programa completo com a instituição seria obrigatório.
O ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) reiterou novamente que o Brasil não renovará em
março o programa com o FMI,
que já dura seis anos. Segundo ele,
só uma -hoje improvável- crise internacional poderia obrigar o
Brasil a voltar ao Fundo.
Palocci disse que "não existe nenhum constrangimento" para
que o Brasil deixe o FMI, e afirma
que a sugestão da linha de crédito
serve para todos os países como
"um mecanismo preventivo".
O acesso à nova linha de crédito
deixaria o Brasil em uma situação
mais confortável para encerrar o
atual acordo com o FMI.
Apesar das declarações do ministro, alguns indicadores ainda
mostram vulnerabilidade na economia brasileira.
Do lado fiscal, o aumento da
meta de superávit primário (receitas menos despesas, exceto
gastos com juros), de 4,25% para
4,5% do PIB, ajudou o país a ganhar um pouco mais de confiança
do mercado internacional.
Por outro lado, os pagamentos
da dívida externa previstos para
os próximos anos permanecem
elevados. Só ao FMI, o governo
deverá pagar US$ 6,7 bilhões em
2005, devido a empréstimos contraídos pelo país desde 1998.
Em 2006 e em 2007, esses gastos
chegarão a US$ 8,3 bilhões e a US$
8,6 bilhões, respectivamente.
Além disso, em 2005 o governo
deverá pagar US$ 11,092 bilhões a
outros credores. Com todas essas
despesas, as reservas em moeda
estrangeira do país, segundo estimativa do Banco Central, cairiam
para US$ 18,291 bilhões ao final
do ano que vem -já excluídos do
cálculo os recursos emprestados
pelo FMI.
Na linha do que deseja Palocci,
o presidente do Banco Central da
França, Christian Noyer, defendeu ontem, sem citar o Brasil,
"acordos preventivos com financiamento" para os "países mais
pobres".
O representante alemão, Hans
Eichel, afirmou que, "em casos de
severas crises", o FMI deve "proporcionar extensos pacotes de
ajuda". "No entanto esses empréstimos devem atender, de maneira estrita, os critérios de acesso", ressalvou.
Novo critério
O que o FMI pretende "estudar"
nos próximos meses é se haverá
ou não um "critério de acesso" diferente do atual, a que o Brasil não
quer mais estar submetido. O diretor-gerente do FMI, Rodrigo
Rato, deixou claro, inúmeras vezes, que ainda não há um consenso sobre o assunto.
Alguns países apresentaram
uma visão ainda mais distante do
que quer o Brasil. A representante
holandesa, Agnes Van Ardenne,
cobrou a "aplicação firme" das regras existentes e criticou o Fundo
por ter "sido levado a uma alta e
prolongada exposição por um
grupo pequeno de países".
O atual acordo entre o Brasil e o
FMI, por exemplo, que envolveu
cerca de US$ 30 bilhões, é o maior
da história do Fundo.
"Há uma discussão em andamento. Esperamos que todos os
países que vêem isso com preocupação possam mudar de opinião,
mas não é uma questão de curto
prazo", afirmou ontem, em entrevista, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles.
Ele reiterou a posição do Brasil
de que a renovação ou não do
acordo com o FMI "não depende"
de uma decisão sobre o novo mecanismo de financiamento.
Outro tema de interesse do Brasil, a exclusão dos investimentos
em infra-estrutura da conta do
superávit primário, simplesmente sumiu da reunião do FMI.
A proposta também está em
"estudos" e não deve avançar antes do final do primeiro trimestre
de 2005, quando o Brasil já terá
decidido sobre a renovação do
acordo.
"A cada reunião, temos alguns
temas que canalizam maiores
atenções", disse Meirelles, justificando a ausência de discussões
sobre investimentos e superávit.
Ontem, já em Ribeirão Preto,
Palocci foi mais otimista em relação às reações às posições brasileiras: "Os dois temas que o Brasil
levantou nessas reuniões fizeram
parte das resoluções finais, o que
mostra que o Brasil é um país que
tem força no campo internacional
e mutilateral e tem conseguido
colocar suas teses com bastante
prioridade".
Colaborou a Folha Ribeirão
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