São Paulo, Sábado, 04 de Dezembro de 1999


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CRIME EM MÔNACO
Safra construiu fortuna nos Estados Unidos, mas perdeu dinheiro com a crise russa, em 98
Discreto, era banqueiro dos milionários

da Reportagem Local

Bilionário e reverenciado por financistas do mundo todo, Edmond Safra já foi apontado como o melhor entre os banqueiros que apareceram depois da Segunda Guerra Mundial. Tinha um talento enorme para transformar dinheiro em mais dinheiro, mas não foi apenas isso que fez a diferença a favor desse libanês naturalizado brasileiro, que vivia entre os Estados Unidos e a Europa, e que morreu aos 68 anos.
Sua principal mercadoria sempre foi a discrição. Apoiado nesse compromisso virou banqueiro dos super-ricos e transformou-se também num dos homens mais ricos do mundo. Este ano, a lista de magnatas da revista norte-americana "Forbes" estimou sua fortuna pessoal em US$ 3,3 bilhões. Entre os brasileiros ele era o mais rico, segundo a revista. Antonio Ermírio de Moraes, do Grupo Votorantim, tem a segunda maior fortuna pessoal do país -US$ 2,6 bilhões.
Safra era considerado uma lenda em seu próprio tempo, mas mostrou ser feito de carne e osso em outubro do ano passado, quando a moratória russa detonou uma crise financeira que se espalhou pelo mundo. O Republic National Bank of New York, maior dos bancos de Safra, apostou no mercado emergente da Rússia, comprou títulos da dívida do país, levou calote como todo mundo e perdeu mais de US$ 160 milhões.
A aventura na Rússia arranhou a reputação até então impecável do banqueiro, deixou-o aborrecido e foi um dos motivos que o levou a decidir pela venda do Republic para os britânicos do HSBC, anunciada em maio deste ano. A razão decisiva para o retiro, no entanto, foi outra: a necessidade de tratar o mal de Parkinson.

Vida particular
Casado com a carioca Lily Monteverde, maior acionista da rede de lojas Ponto Frio, Safra não tinha filhos. Lily tem um casal de filhos adultos. Sua filha vivia com eles em Mônaco.
Gostava de viajar, a passeio e a trabalho, e pelo menosuma vez por ano vinha ao Brasil para encontrar os irmãos mais novos - Joseph e Moise, donos do banco Safra, com sede em São Paulo.
Pouco se sabe a respeito do modo como gastava seu dinheiro, a não ser o gosto pelas artes plásticas e um pouco sobre suas atividades filantrópicas.
Edmond Safra vivia em função do banco e quem o conheceu diz que usufruiu muito menos do que sua fortuna pessoal permitia. Uma vez, ele vendeu um iate depois de tomar conhecimento de uma conta de compra de sabão usado na limpeza das cabinas.
No final dos anos 70, numa das raras entrevistas que deu, mostrou um pouco de sua personalidade. Contou o seguinte: "Muitos me perguntam por que não compro um jato. A razão é simples: isso me daria uma despesa anual demilhares de dólares. E esse péssimo exemplo serviria para muita gente me cobrar mais carpete para as agências, aumentos salariais e outras despesas extras".

Proteção aos negócios
Quando se tratava de favorecer ou mesmo proteger seu negócio, Safra não tinha o menor constrangimento em abrir a carteira. Ele e seus irmãos patrocinavam o evento social mais concorrido das reuniões anuais do FMI (Fundo Monetário Internacional) e do Banco Mundial, sempre na National Gallery, em Washington, nos Estados Unidos.
Os banqueiros mais importantes do mundo e também autoridades governamentais costumavam frequentar a festa. Este ano, em razão da venda do banco, a festa foi cancelada.
Edmond Safra herdou da família uma valiosa experiência financeira, que tem origem alguns séculos atrás, na cidade de Aleppo, na Síria, um cruzamento de rotas comerciais na região.
Naquele tempo, os Safra financiavam caravanas de comerciantes e trocavam moedas de regiões diferentes. Jacob Safra, pai de Edmond, abriu seu próprio banco em Beirute, onde nasceram seus filhos.
Os Safra deixaram o Oriente Médio no início dos anos 50 e emigraram para o Brasil, fugindo do conflito entre árabes e judeus. Abriram uma financeira, depois compraram um pequeno banco e os negócios da família não pararam mais de crescer.
Em 1962, Edmond Safra vendeu sua parte nos negócios aos irmãos, mudou para a Suíça e abriu seu primeiro banco, o Trade Development Bank. Quatro anos depois, abriu o Republic, nos Estados Unidos, que se transformou num dos 20 maiores bancos do país, com filiais na Europa, Oriente Médio e América Latina.

American Express
Nos anos 80, o banqueiro vendeu o Trade Development para a American Express, por US$ 520 milhões. Continuou sócio da Amex num outro negócio, mas acabou brigando com os parceiros norte-americanos que na época o acusaram de praticar operações ilegais.
Safra entrou na Justiça, provou que tinha sido vítima de difamação e acabou conseguindo uma indenização de US$ 8 milhões e um pedido público de desculpas por parte dos executivos da Amex.
Apesar de se destacar como banqueiro da elite, Safra soube cativar também o pequeno correntista americano. Em 1969, quando o Republic já tinha três anos de vida, ele lançou uma campanha inesperada para os padrões da época.
Edmond Safra publicou anúncios nos jornais de Nova York, nos Estados Unidos, oferecendo televisões coloridas a quem aparecesse em suas agências para abrir uma poupança acima de US$ 10 mil.
Formaram-se filas imensas na porta do Republic e o banco ganhou o apelido de "banco da tevê".


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