São Paulo, domingo, 04 de dezembro de 2005

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TERRA EM TRANSE

Especialistas temem ressurgimento de políticas inadequadas na região, que terá 12 eleições no próximo ano

Novo populismo na AL preocupa economistas

MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Dezembro inaugura o ano das eleições presidenciais na América Latina. Serão nove a partir de agora e, se incluídas as eleições legislativas, 12, nada menos do que uma por mês, em média.
Com as mudanças políticas, surge o risco de mudanças econômicas, o que faz os economistas, ou pelo menos parte importante deles, preocuparem-se com o que tem sido chamado de nascimento do "novo populismo" na região.
"O macropopulismo está morto" diz Sebastian Edwards, ex-economista-chefe do Banco Mundial para a América Latina, hoje economista da Universidade da Califórnia. Edwards, com Rudiger Dornbusch, é autor de "A Macroeconomia do Populismo na América Latina", em que ele explica: "A macroeconomia do populismo enfatiza o crescimento e a distribuição de renda, mas não leva em conta os riscos da inflação, do déficit público, das restrições externas e da reação dos agentes econômicos a políticas agressivas".
No Brasil para participar do Seminário Interamericano de Economia, realizado na PUC-RJ pelo NBER (ONG norte-americana que reúne pesquisadores da área de economia), ele debateu o suposto ressurgimento do populismo com o ex-ministro Pedro Malan (Fazenda), o brasilianista Albert Fishlow e o economista Dionísio Carneiro, da PUC.
Em maior ou menor grau, todos concordam que há uma espécie de "novo populismo" espreitando a região. Para Edwards, ele é novo porque não traz de volta o mesmo tipo de abordagem dos anos 60 e 70. Ao invés de política macroeconômica alternativa, surgiu, na avaliação dele, o "micropopulismo". Ou seja, há pouca dúvida a respeito da necessidade de se preocupar com o controle de inflação e gastos públicos, mas há uma série de políticas microeconômicas, como proteção à indústria, que ele considera fazer parte de um novo populismo.
Fishlow concorda que o que era chamado de populismo no campo econômico há 20 anos perdeu praticamente todo o espaço. O novo populismo, diz ele, não propõe um novo modelo econômico. "O Equador está dolarizado, a Venezuela sobrevaloriza moeda e a Argentina tem modelo econômico com câmbio desvalorizado e controlado", exemplifica, com países que ele considera como focos do novo populismo.
O que ele chama de novo populismo é basicamente o que Edwards chama de micropopulismo. "Política de elevação irresponsável de salários, proteção à indústria, incerteza em relação às regras", diz.
Há motivo para se preocupar com o surgimento de um novo populismo? Para a Fitch Ratings, o risco é pequeno. A maioria dos países deve manter políticas similares à brasileira, em menor ou maior grau. De qualquer maneira, o risco sempre existe e há indícios de que a população da região não está muito satisfeita com os resultados da política adotada até agora. Em 2002, nada menos do que 45% dos latino-americanos disseram ao Latinobarômetro que eles apoiariam um governo não-democrático se ele resolvesse os "problemas econômicos". É verdade que, desde então, os países da região pegaram carona na onda de crescimento mundial, mas continuam andando mais devagar que outros países emergentes.
A agência de classificação de risco chega a dividir os países pelo grau de risco político. Brasil e México estão no grupo de médio risco, Chile, no de risco baixo. Entre os mais arriscados, estão Venezuela e Bolívia. O risco político, nesse caso, é entendido como a possibilidade de mudanças drásticas na política econômica.
Dionísio Carneiro, mais pessimista, vê uma espécie de "janela de oportunidade" para o ressurgimento do populismo. Ele lembra a boa conjuntura internacional, com preços de commodities em alta, dinheiro sobrando nos mercados e investidores mais tolerantes. O que tudo isso tem a ver com o renascimento de políticas econômicas inadequadas?
Os países, apesar de relativamente mais abertos, estão menos dependentes do mercado financeiro internacional e menos vulneráveis. Com isso, ficam também menos sujeitos à vigilância do mercado. Por outro lado, diz Carneiro, "o desempenho medíocre do crescimento aumenta a intolerância com as políticas monetárias conservadoras".
Fishlow lembra que não é à toa que cresce a insatisfação dos latino-americanos com a "boa política econômica", já que, depois de quase duas décadas de abertura, privatização e reformas, o crescimento não apareceu.
Malan também diz duvidar da "morte do macropopulismo", mas diz que há um processo de aprendizagem pelo qual a própria população acaba descobrindo que "não há mágicas".
"A saída é aprofundar o debate público para mostrar que algumas promessas não são viáveis, possíveis", diz.
Claro, o que Malan, Edwards, Carneiro e Fishlow consideram populismo é visto por economistas de outras linhas teóricas como política adequada para emergentes, que inclui política industrial, controle de capitais e adoção de câmbio desvalorizado.


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