São Paulo, domingo, 04 de dezembro de 2005

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Estagnação gera instabilidade política, afirma professor de Harvard

LEILA SUWWAN
DE NOVA YORK

Num momento em que o governo brasileiro culpa a crise política pela atual queda no crescimento, um professor da Universidade Harvard aponta em outra direção: é o histórico de crescimento pífio, ligado a uma intenção equivocada de estabilidade financeira, que causa um espiral de instabilidade política e regressos cívicos.
Em seu livro recém-lançado nos Estados Unidos, "As Conseqüências Morais do Crescimento Econômico", Benjamin Friedman defende a supremacia do crescimento econômico em território geralmente não-navegado por macroeconomistas: o avanço social e a felicidade da sociedade.
Sua tese parece intuitiva: o aumento de renda sustentado e bem distribuído cria as bases para uma sociedade mais tolerante, generosa, aberta e democrática.
É uma resposta indireta, e por vezes arrogante, à geração de desenvolvimentistas e cientistas políticos que pregam políticas diretas de liberdade, inclusão, trabalho digno, segurança e sustentabilidade ambiental -apesar de possíveis impactos negativos no PIB (Produto Interno Bruto).
Em entrevista à Folha, Friedman afirmou, com serenidade professoral, que não há um "dilema cruel" entre crescimento e desenvolvimento. Desde que, claro, o desenvolvimento não prejudique diretamente o crescimento, este, sim, o motor sustentável para o avanço de ideais liberais.
"Não sou especialista em Brasil, mas a lição da história é bastante clara. Para países nessa faixa de renda, o resultado da estagnação de longo prazo é a instabilidade política. Pensar que se está perseguindo estabilidade por meios que geram estagnação é simplesmente equivocado. Esse não é o caminho", disse.
Não caiu na provocação da resenha do jornal "The New York Times" que chamou seu livro de "manifesto capitalista". De fato, Friedman não prega uma visão puramente mercadista. Ele vai além. Para ele, o governo deve estimular, com investimentos sociais, os patamares de crescimento estabelecidos pelo mercado, que não contabiliza os benefícios morais de longo prazo.
"Não é crescer só por crescer. Depois de muitos anos estudando como maximizar a produção e aumentar a capacidade, quis explicar por que isso importa. E daí se a economia funciona a plena potência? Quando o país é pobre, a reposta é óbvia. Mas até quando o país é rico isso é importante", disse o professor, que leciona em Harvard desde 1972 e já foi chefe do departamento de economia.
Friedman se calça em estudos psicológicos sobre a felicidade. "A felicidade é um conceito absolutamente relativo, com dois fatores. A comparação com a nossa situação anterior e a comparação com os demais", disse.
"Queremos avançar em ambas medidas, mas melhorar em uma dimensão tira a ansiedade em melhorar na outra. Com crescimento econômico amplo, há menos urgência em nos comparar com os demais."

Desigualdade
Friedman escapa da polêmica do aprofundamento da desigualdade, armadilha recorrente do crescimento setorializado. "Temos mais evidência para a queda na curva de Kuznets do que para a escalada", disse, em referência à relação primeiro positiva e depois negativa entre crescimento e concentração de renda.
Friedman se recusa a chamar de crescimento o aumento de renda nacional que beneficia apenas os ricos. "Eu não considero isso crescimento econômico. Tem que ser amplo", protesta.
No entanto, ele também acha difícil considerar ruim, em termos absolutos, um aumento da desigualdade. "Se todos estão com renda melhor, mas há mais desigualdade, a metade de baixo se incomoda, mas a metade de cima acha bom", relativizou.
Em seu livro, rejeita com apenas uma frase a tese de Amartya Sen, Prêmio Nobel de Economia. Para Sen, apenas o desenvolvimento econômico não garante ideais de liberdades fundamentais. Para Friedman, a história indica que o avanço econômico propicia essas liberdades humanas melhor que as políticas focadas de Sen.
Friedman defende investimentos sociais para propulsionar o crescimento. Mas, na prática, não há fórmula fácil. O que fazer quando o orçamento é apertado e o governo tem que fazer escolhas?
"Mas sempre há restrições orçamentárias. Essa é a primeira lição no primeiro dia de estudo de economia. A minha mensagem é apenas que o crescimento deve ser promovido, aqui ou em países em desenvolvimento", disse.


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