São Paulo, terça-feira, 05 de março de 2002

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SISTEMA FINANCEIRO

Crime só teria sido descoberto porque instituição desconfiou de sinais de riqueza dos funcionários

Fraude no Santander não é caso isolado, diz delegado

ISABEL CAMPOS
DA REPORTAGEM LOCAL

A fraude de US$ 1,9 milhão no Santander, que veio a público há cerca de 15 dias, expôs uma ferida do mercado financeiro. Oficialmente, as instituições afirmam que seus controles são rígidos e imunes a fraudes.
Extra-oficialmente, quando os gravadores estão desligados, a conversa é outra: a fraude no Santander não seria um caso isolado, mas mais um entre os vários que ocorrem no cotidiano do mercado financeiro. O próprio delegado que dirigiu o inquérito, Ruy Ferraz Fontes, titular da Delegacia de Roubo a Bancos de São Paulo, constatou esse fato.
Nos dias 20 e 21 de fevereiro, foram presos três ex-operadores de mesa do Santander. Conforme Fontes, os três, aliados a um diretor da corretora Ipanema, teriam desviado US$ 1,9 milhão em 18 operações de "swap".
"Swap" é uma operação de troca de indexador. Se uma empresa tem uma dívida, por exemplo, indexada ao dólar, mas teme que a cotação dessa moeda venha a subir muito, ela pode procurar uma instituição financeira e solicitar um "swap", isto é, que a variação cambial do seu contrato seja trocada por outro indexador.
A negociação é feita caso a caso, e, de acordo com normas do Banco Central, todas devem ser registradas na BM&F (Bolsa de Mercadorias e Futuros) ou na Cetip (Central de Custódia e Liquidação Financeira de Títulos).
No caso Santander, conforme Fontes, foi constatada fraude em 18 operações de "swap" realizadas entre abril e agosto de 2001, sendo todas de dólar contra DI. A corretora envolvida entrava na operação, negociando para clientes com dívida em dólar que queriam trocar a variação cambial pela do CDI (Certificado de Depósito Interbancário, título utilizado como referência na renda fixa).
Já o Santander, por meio dos ex-operadores, atuava na outra ponta, assumindo o risco da variação cambial e possibilitando que a dívida do cliente da corretora passasse a ser corrigida pelo CDI.
Seguindo o procedimento padrão, a operação era fechada, por telefone, entre um representante da corretora e um operador de mesa do Santander e registrada no final do dia na BM&F.
Esse tipo de operação resulta em uma taxa de juro por determinado prazo. No caso da fraude, explica Fontes, os acusados estariam fechando as operações, por telefone, por uma taxa e as registrando na BM&F por outra mais baixa. Por exemplo: se a taxa, ao telefone, tivesse sido de 10%, no registro ela aparecia como 9%.
A corretora cobrava os 10% do seu cliente, mas repassava 9% ao Santander. A diferença de um ponto percentual, informalmente, era dividida entre a corretora e os operadores de mesa do Santander. Fontes diz que a fraude teria sido comprovada pelo banco ao checar se os valores acordados por telefone conferiam com os registrados na Bolsa.
Segundo o que o delegado apurou durante as investigações, a fraude cometida seria comum no mercado financeiro. Uma das suposições é que ela só teria vindo à tona porque os ex-operadores e a corretora envolvidos estariam sendo muito gananciosos.
Enquanto os acusados ficavam com 0,6 a um ponto percentual dos juros acordados, no dia-a-dia do mercado financeiro, as "comissões" estariam na casa de 0,01 ponto percentual -bem menores e mais difíceis de serem flagradas, principalmente porque os contratos costumam ser de valores muito altos.
Segundo a Folha apurou no Santander, os valores surrupiados não estariam fora da praxe de mercado. O que teria chamado a atenção da direção do banco e deflagrado a investigação seriam os sinais exteriores de riqueza dos acusados, acima de suas posses.

Os envolvidos
Os acusados no caso Santander são os ex-operadores do banco Marcos Aylon Leão Luz, 32, Roberto Cantoni Rosa, 27, e Lincoln Dias Miranda, 28, além de Alcyr Duarte Collaço Filho, diretor da corretora Ipanema.
Rosa e Luz estão em prisão preventiva e afirmam que são inocentes. Miranda está em liberdade, pois a Justiça entendeu que não há provas contra ele.
Collaço também deveria estar em prisão preventiva, mas encontra-se foragido.
O banco Santander tem evitado falar no caso para não atrapalhar as investigações.



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