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Reforma mantém regra que disfarça imposto maior
Usado hoje no ICMS, "cálculo por dentro" transforma alíquota de 25% em 33,33%
Regra diz que o "imposto integrará sua própria base de cálculo", ou seja, será cobrado sobre o produto ou serviço e sobre ele mesmo
GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Com uma frase que passou
quase despercebida em seu novo projeto de reforma tributária, o governo Luiz Inácio Lula
da Silva procura ampliar o uso
de um expediente capaz de
mascarar as reais alíquotas dos
tributos incidentes sobre mercadorias e serviços.
Pela proposta, o IVA (Imposto sobre Valor Agregado), a ser
criado com a fusão de quatro
tributos federais, "integrará
sua própria base de cálculo",
conforme um inciso que se pretende acrescentar ao artigo 153
da Constituição, referente aos
impostos da União. Em português mais claro, as alíquotas do
imposto incidirão não apenas
sobre o valor do produto, mas
também sobre o próprio imposto embutido no produto.
Trata-se do que os especialistas chamam de "cálculo por
dentro", hoje utilizado no
ICMS, principal fonte de receita dos Estados. Por meio desse
mecanismo, uma alíquota nominal de 25%, por exemplo,
corresponde a uma tributação
efetiva de 33,33% para os contribuintes, ou seja, para os consumidores dos bens e serviços
(ver quadro nesta página).
No exemplo, um produto que
custa R$ 100 passa a R$ 133,33.
É que os 25% incidem sobre R$
133,33 -e não sobre R$ 100.
Segundo a reforma proposta,
o IVA será, se não o maior, um
dos três maiores tributos federais, ao lado do Imposto de
Renda e da contribuição previdenciária. O imposto deverá
substituir os atuais Cofins,
PIS/Pasep, Cide e contribuição
para o salário-educação.
A crítica mais comum ao expediente aponta a falta de
transparência: quem compra
um automóvel ou um quilo de
feijão não sabe quanto está pagando de fato em tributos, nem
mesmo se consultar a tabela do
ICMS de seu Estado. Esse desconhecimento, argumenta-se,
diminui a resistência política à
criação e à elevação de tributos.
"Quando estudei o modelo
do IVA nos países europeus,
descobri que nenhum país adota esse critério de cálculo", diz o
advogado Antonio Carlos Rodrigues do Amaral, que, por requerimento da oposição, falou
sobre o tema na semana passada à CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara.
União, Estados e municípios,
porém, têm outro interesse em
consagrar na Constituição a regra do "cálculo por dentro": a
resolução de conflitos jurídicos
em torno do mecanismo.
Está em curso no Supremo
Tribunal Federal, por exemplo,
uma batalha jurídica contra a
inclusão do ICMS na base de
cálculo da Cofins.
O STF já deu seis votos pela
inconstitucionalidade, mas um
pedido de vista interrompeu o
julgamento, em 2006. "Se estou incluindo um imposto na
base de cálculo de outro imposto, estou tributando dinheiro
público, que não é do contribuinte", diz a tributarista Ângela Martinelli.
Com argumento semelhante,
o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, votou contra o "cálculo por dentro" do ICMS em
1999, mas, na época, foi voto
vencido. O julgamento da Cofins pode reabrir a discussão.
Justificativa do governo
A Fazenda também aponta a
segurança jurídica como uma
das razões para a inclusão do
assunto na reforma tributária,
mas dá mais ênfase às peculiaridades do Brasil. "A metodologia de cobrar "por fora" se presta mais a países com apenas um
tributo sobre o consumo", afirma André Paiva, secretário-adjunto de Política Econômica.
Paiva avalia que, embora não
haja menção na legislação, a tributação do PIS e da Cofins já
segue esse modelo na prática,
porque as duas contribuições
incidem sobre a receita das empresas -composta pela venda
de produtos em cujos preços
estão embutidas as próprias
contribuições e outros tributos.
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