São Paulo, quarta-feira, 05 de julho de 2006

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LUÍS NASSIF

O mau negócio da Cteep

O julgamento da apelação de ação sobre dívida da Cteep seria um dia depois do leilão. A lógica seria adiá-lo

Na semana passada, escrevi uma coluna em cima dos primeiros números divulgados sobre o leilão de venda da Cteep (Transmissão Paulista). Como se recorda, houve apenas dois candidatos, saindo vencedora a Interconexión Eléctrica, empresa colombiana, pagando R$ 38,09 por lote de mil ações, ou R$ 1,19 bilhão pelos 36% que o Estado de São Paulo tinha na companhia. Havia algumas inconsistências tanto nos números quanto no meu raciocínio.
No último exercício, de 2005, a Cteep distribuiu R$ 239 milhões em forma de juros sobre capital próprio e R$ 97,3 milhões em forma de dividendos -total de R$ 336 milhões, referentes ao exercício de 2005. Como o lucro foi de R$ 468 milhões, a distribuição correspondeu a 72% do lucro -incompreensível para uma companhia que, por ser estatal, contava apenas com a reaplicação de lucros para investir.
Como o Estado de São Paulo tinha 36% do capital, seu ganho foi de R$ 168,5 milhões -recebeu R$ 121 milhões em dinheiro e o resto ficou na conta lucro acumulado. O dinheiro vai para essa conta quando a empresa não tem planos de investimento para absorvê-lo. De quando foi privatizada até hoje, a empresa tem R$ 500 milhões em lucro acumulado.
Vamos agora às contas sobre o valor pago pela empresa: 1. O comprador pagou R$ 1,19 bilhão pelos 36% do Estado. Por lei, deverá pagar o equivalente a 80% pela parte dos minoritários ordinaristas (donos de ações ON), de acordo com o mecanismo do "tag along".
Se todos exercerem seu direito, o valor total da companhia sairá por R$ 2,9 bilhões -valor superestimado, porque as ações PN (preferenciais nominativas têm valor menor).
2. Se o lucro de 2005 foi de R$ 468 milhões, significa que o P/L (relação Preço/Lucro) é de apenas seis anos. Ora, nesse setor, devido ao capital intensivo e aos baixos riscos de investimento, o P/L costuma ser significativamente maior, de 10 a 12 anos. A remuneração da empresa é assegurada anualmente pela Aneel.
3. Por outra medida, o EBITDA (valor de mercado + dívida líquida sobre geração de caixa) da companhia é de apenas 3,7 vezes, contra uma média de 5 para o setor como um todo, incluindo aí geradores (que tem margem de risco maior) e distribuidores.
Por que o leilão atraiu tão poucos compradores, então? A principal razão é que, desde 1999, quando houve a cisão do sistema elétrico paulista, ficaram pendências não resolvidas no ar. Uma delas, uma dívida de R$ 370 milhões com a Eletrobrás, debitada à Eletropaulo. A empresa conseguiu, no indefectível Tribunal de Justiça do Rio, ser excluída da cobrança, jogando a conta para a Cteep. O julgamento da apelação pelo Superior Tribunal de Justiça seria um dia depois do leilão. A lógica seria adiar o leilão por alguns dias. Alguns candidatos a comprador entraram na Justiça pedindo o adiamento do leilão até que a ação fosse julgada.
Não conseguindo, não participaram. Houve o leilão, sem muita divulgação, com incertezas no ar e apenas dois candidatos. No dia seguinte saiu a sentença do STJ, favorável à Cteep, ao anular a decisão do TJ fluminense.


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