São Paulo, Terça-feira, 05 de Outubro de 1999
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OPINIÃO ECONÔMICA

Esperança

BENJAMIN STEINBRUCH

Hoje em Brasília o presidente Fernando Henrique Cardoso estará sancionando a lei que se constitui em resposta concreta aos anseios de empresários e trabalhadores das micro e pequenas empresas.
Devemos, realmente, comemorar. Todo mundo concorda que para a economia brasileira é importante que haja estímulos à criação e operação das micro e pequenas empresas. Elas são, no conjunto, certamente a maior fonte empregadora do país. São também o grande celeiro de executivos e de empreendedores, gente que se dispõe, muitas vezes, a arriscar suas carreiras, a mudar de profissão, a abrir mão de empregos seguros e até a pedir demissão do serviço público só para ousar, para apostar, para acreditar que vale a pena partir para o que antes se chamava "trabalhar por conta própria".
A verdade é que o pequeno empreendedor poderá agora, com a nova lei, livrar-se de uma série de garrotes burocráticos e trabalhistas que praticamente o empurraram na direção da economia submersa. Só quem já tentou "abrir uma firma" tem idéia do inferno que é. Sabe o que se exige de tempo e dinheiro como punição pela ousadia de inventar novos negócios e criar novos empregos.
Nos últimos anos o Sebrae passou a atacar o problema de maneira mais forte e decidida. Conseguiu alguns avanços e certamente deu uma importante contribuição ao Congresso para que a legislação simplificadora (e estimuladora) se concretizasse. E pudesse ser sancionada, como está ocorrendo hoje.
Na cerimônia do Palácio do Planalto, o presidente da República terá a seu lado parlamentares e ministros que são responsáveis pelo pacote de medidas que, em paralelo com a nova lei, serão hoje anunciados. Essas providências resultam de sugestões advindas de várias frentes governamentais. É justo, no entanto, valorizar o esforço realizado pelos ministérios do Trabalho e da Previdência e Assistência Social para desatar o nó da relação empregado/empregador nas micro e pequenas empresas. E a coordenação que o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior já realizou para materializar medidas de estímulo a esse importante segmento. Uma coordenação que, a partir de hoje, está oficializada pelo presidente da República e que é, certamente, um atestado do novo entendimento que o governo está adotando para estimular o crescimento da produção e que tem sido repetidamente explicado pelo ministro Alcides Tápias em entrevistas que deu na sequência de seu discurso de posse.
Todos esperamos que as medidas que hoje serão formalizadas sejam, apenas, o ponto de partida para a compreensão do papel que as micro e as pequenas empresas podem e devem representar na nova economia brasileira. Um papel preponderante como geradoras de riqueza, promotoras de emprego e estimuladoras da luta pelo crescimento sustentado.
Essa é uma boa hora, também, para um olhar mais largo para o papel das empresas e dos empresários brasileiros no seu total, um grande arco que começa na micro empresa e, passando pelas médias e grandes, vai até os maiores grupos brasileiros, as nossas megacorporações.
O governo, em seus programas e nas declarações de seus delegados, demonstra compreender o papel que precisa ser desempenhado pelo empresariado nacional nos desdobramentos futuros da nossa economia.
A abertura econômica e os avanços da globalização puseram à prova essas empresas. Muitas estavam despreparadas para os novos ventos da competição. Outras estavam acostumadas a resolver seus problemas pelos processos antigos que somavam incentivos, isenções, reservas de mercado e todo um elenco de medidas protecionistas que não tinham mais como se sustentar no mundo de hoje.
O choque foi grande. De repente chegou a hora da verdade, representada pela concorrência internacional que, de forma decidida, às vezes até de maneira desleal, veio para ofertar produtos e serviços com custo compatível com as demandas do mercado.
Na outra ponta chegaram os investidores internacionais buscando adquirir empresas locais ou criar parcerias que lhes permitissem um pé firme em um mercado de dezenas de milhões de consumidores ativos e exigentes.
Em paralelo, assistimos a um verdadeiro renascimento de empresas e empresários nacionais que partiram para a luta e prepararam suas indústrias e seus negócios para competir de igual para igual com os concorrentes estrangeiros não só no mercado doméstico mas também nos mercados externos onde começamos a descobrir a grande avenida das exportações.
Os problemas são muitos. Para resolvê-los, o Brasil conta hoje com o talento de seus executivos -esse capital intangível de inteligência e experiência-que está transformando as nossas empresas em celeiros para dirigentes que já são chamados para tocar e gerir negócios nos cinco continentes.
Temos também segmentos econômicos que se mostram resistentes às investidas dos capitais externos que, em muitos setores, promoveram uma profunda desnacionalização de empresas de todos os portes, muitas delas vitoriosas e detentoras de histórias de décadas de sucesso.
Na Espanha e em Portugal, por exemplo, as autoridades caminharam para a abertura e a globalização sem esquecer que era necessário estimular, de todas as formas, a criação de grandes grupos empresariais locais, a partir dos núcleos já existentes. Assim foi feito e o sucesso dessa política explica porque no Brasil os investidores da Península Ibérica vieram para disputar, com grande êxito, o controle de inúmeras estatais de grande porte que foram privatizadas.
O governo sabe que os nossos megagrupos só são grandes no cenário doméstico. E é por isso que já divulga suas preocupações e seus estudos para fusões e associações que permitam à nossa economia, por meio de empresas privadas nacionais, colocar-se em condições de enfrentar as gigantes internacionais e, mais do que isso, tirar partido das oportunidades que só as maiores têm condições de disputar.
Está na hora de avançar com as micro, pequenas e médias empresas. Mas o momento não pode ser perdido pelo governo, com o apoio da sociedade, no sentido de estabelecer diretrizes e definir parâmetros que fortaleçam o empresariado nacional de médio e grande porte nas suas lutas, permitindo que, em todo o país, essas empresas possam ampliar negócios, criar empregos, gerar tributos e produzir os lucros (econômicos e sociais) que são essenciais para movimentar, com segurança, a roda da economia e da esperança.


Benjamin Steinbruch, 45, empresário, graduado em administração de empresas e marketing financeiro pela Fundação Getúlio Vargas (SP), é presidente dos conselhos de administração da Companhia Siderúrgica Nacional e da Companhia Vale do Rio Doce. E-mail: bvictoria@psi.com.br


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