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PREVIDÊNCIA PRIVADA
Estudo diz que 76% não alcançaram objetivos no 1º semestre
Fundos de pensão não atingem metas
JONATHAN WHEATLEY
DO "FINANCIAL TIMES"
Foi um mau ano para os fundos
de pensão das empresas brasileiras. Um recente estudo do Risk
Office, consultoria financeira ligada à Abrapp (Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar), demonstra que pelo menos 76% dos
fundos não conseguiram cumprir
suas metas atuariais durante o
primeiro semestre.
Má notícia, de qualquer forma,
para os beneficiários dos fundos,
o resultado desfavorável pode
também se tornar um sério problema atuarial. Se um fundo fracassa por três anos consecutivos
no cumprimento de suas metas,
deve reduzir os benefícios ou elevar as contribuições.
A ironia para os administradores de fundos é que suas vidas foram dificultadas por desdobramentos que constituem excelentes notícias para a economia em
geral. Um deles é a recente queda
na taxa juros overnight brasileira,
à qual os certificados de depósitos
(CDIs, no Brasil), a maior classe
de ativos nas carteiras dos fundos,
estão vinculados.
A taxa atingiu 45% ao ano durante a crise cambial brasileira de
1999, e estava em 26,5% em fevereiro do ano passado, caindo a
16% no segundo trimestre deste
ano (ainda que tenha voltado a
subir, para 16,25%).
Embora favorável ao investimento e ao emprego, a queda nas
taxas de juros dificulta a vida dos
administradores de fundos. No
passado, eles podiam cumprir
suas metas simplesmente acumulando pilhas de CDIs e títulos da
dívida pública. Agora, cada vez
mais, precisam procurar por outros investimentos.
As más notícias não param por
aí. O Brasil está em meio a um
boom de exportações. As exportações devem atingir US$ 90 bilhões neste ano, produzindo superávit comercial de US$ 30 bilhões. Isso impulsiona o crescimento econômico, que deve exceder os 4,5% neste ano -depois da
contração de 0,2% em 2003- e
oferece o estímulo necessário à
confiança econômica.
As agências de classificação de
crédito Moody's e Finch elevaram
a classificação cambial e da dívida
soberana brasileira em setembro.
Uma vez mais, uma notícia excelente para a economia, mas nada
boa para os fundos de pensão.
A razão é que as metas de desempenho de muitos fundos estão estabelecidas na forma de um
determinado percentual acima da
inflação. A maior parte deles trabalha com inflação mais 6%. O índice mais comumente usado de
inflação é o IGP-M. O boom de
exportações deste ano resultou
em maior pressão sobre os preços
no atacado do que sobre os preços
no varejo.
Riscos maiores
A mais recente pesquisa do Banco Central no mercado financeiro
demonstra que a expectativa é
que o IGP-M atinja 12,6% neste
ano, ante 7,3% para o principal
índice de preços no varejo. Isso
significa que muitos administradores de fundos precisam procurar por retornos nominais da ordem de 18% ou mais ao ano.
"Quando os planos foram estabelecidos e as metas definidas, todo mundo acreditava que inflação
mais 6% fosse fácil", diz Fernando
Lovisotto, sócio da Risk Office.
"Mas hoje as coisas são muito diferentes".
Este ano, diz Alexandre Mathias, economista-chefe do Unibanco, um dos maiores administradores de ativos de fundos de
pensão, os dirigentes dos fundos
devem aceitar maiores riscos,
operando em Bolsa e com outros
ativos menos previsíveis, que oferecem retornos mais elevados.
"Tivemos um bom ano [nesses
ativos]", diz. "Em alguns casos,
estamos próximos das metas".
Os administradores de fundos
instruídos a evitar riscos e a investir passivamente, se equiparando
a padrões menos ambiciosos, podem ter de aceitar a segunda opção de Mathias, que é simplesmente arcar com o prejuízo. Isso
não é tão mau quanto parece, dado o ano deslumbrante de que
muitos fundos desfrutaram no
ano passado.
O índice da Bolsa de Valores de
São Paulo (Bovespa), por exemplo, subiu 97,3% em termos nominais (141,3% em termos de dólares), e os CDIs ofereceram retornos de 22,4%. Isso permitiu que
muitos fundos de pensão obtivessem retornos nominais da ordem
de 40% a 50% no ano passado. Os
administradores mais conservadores podem ter de abandonar
20% a 30% desses ganhos a fim de
cobrir o déficit deste ano.
Jogo para otários
A sabedoria convencional é de
que os ganhos de capital do ano
passado embutiam o crescimento
econômico previsto para este ano.
As ações estão estagnadas neste
ano (o índice Bovespa subiu apenas 4,4%), de acordo com esse raciocínio, porque os investidores
ainda não estão convencidos de
que a recuperação é sustentável.
Se as ações reconquistarem desempenho semelhante ao do ano
passado, os fundos de pensão não
precisam se preocupar com o
cumprimento de suas metas no
ano que vem. Mas prever preços
de ações, como todo mundo sabe,
é um jogo para otários.
Existem outras opções. Uma é
investir em papéis do governo,
vinculados ao mesmo índice que
a referência dos fundos. Existem
títulos do governo, por exemplo,
que pagam o IGP-M mais 8% ao
ano. Com ativos como esses,
cumprir metas deve ser tão fácil
quanto cair de uma árvore.
Mas os administradores de fundos relutam em colocar proporção muito elevada de seu dinheiro
em papéis de longo prazo e baixa
liquidez. Eles preferem os CDIs,
que são resgatáveis rapidamente,
e cuja liquidez é quase ilimitada.
Em média, entre 55% e 60% dos
ativos dos fundos de pensão são
compostos por CDIs.
Isso pode parecer estranho. Os
fundos de pensão, afinal, têm
compromissos de longo prazo e
deveriam estar famintos por ativos de longo prazo. O fato é que
no Brasil esses ativos são escassos
e não muito atraentes.
Como aponta Mathias, com taxa de 16,25% no overnight e inflação de 7% nos preços do varejo,
os CDIs oferecem retornos reais
de cerca de 8,6% ao ano. Um título público com prazo de um ano
terá retorno real de cerca de 9,6%.
"Vale a pena abrir mão do acesso
e liquidez instantâneos por um
ponto percentual a mais por
ano?", pergunta. "Aparentemente
não".
O Tesouro está trabalhando
com afinco para alongar o perfil
de sua dívida, e reduzindo o volume de títulos vinculados à inflação e a outros índices.
O governo também está adotando incentivos fiscais para investimentos em prazo mais longo. Isso
gradualmente ampliará a gama de
opções disponíveis para os administradores de fundos de pensão.
Enquanto isso, eles estão em larga medida à mercê de forças que
não controlam. Por isso, dedos
cruzados para o ano que vem.
Tradução de Paulo Migliacci
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