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ANO DO DRAGÃO
Próximo governo terá de manter juros altos se quiser evitar o repasse dos preços do atacado para o varejo
Crise de financiamento é a maior desde 93
ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL
O abismo que separa a variação
dos preços no atacado em relação
aos do varejo atingiu em outubro
passado seu nível mais elevado
desde 1993, ano em que o Brasil
ainda vivia o drama da inflação
descontrolada.
A conta, feita pela Consultoria
Econômica do banco Itaú, revela
que o país vive a maior crise de financiamento externo dos últimos
nove anos e indica o risco de repasse da desvalorização para os
preços pagos pelo consumidor.
O Itaú construiu um índice que
mostra as variações mensais do
IPA-M (Índice de Preço por Atacado) e do IPC-M (Índice de Preço ao Consumidor), medidos pela
Fundação Getúlio Vargas, nos últimos nove anos. A relação entre
os dois índices de inflação, calculada pelo banco, atingiu 1,20 em
outubro passado, valor 3,4% superior ao registrado nos últimos
meses de 93, época da hiperinflação. Em comparação com meados de 2000, a diferença do IPA
em relação ao IPC já subiu 21%.
Isso mostra que os preços dos
bens no atacado -que são principalmente aqueles comercializados por um país no exterior- estão subindo em ritmo muito mais
acelerado que os do varejo.
A notícia que pode parecer boa
-afinal, a alta dos preços provocada pela pressão cambial não está chegando ao bolso do consumidor- indica, na verdade, que
o país vive uma severa crise de financiamento externo.
Mostra ainda que o próximo
governo terá de manter a taxa de
juros alta se quiser evitar o repasse dos preços no atacado para a
ponta do varejo, enquanto o câmbio estiver pressionado.
A política econômica dos últimos oito anos, principalmente no
período de sobrevalorização do
real, produziu um enorme déficit
nas contas do Brasil com o exterior. Para fechar o buraco das
contas externas, a solução passou
a ser a atração de investimentos
de fora que garantissem a entrada
de dólares suficientes no país.
No entanto com a desaceleração
da economia mundial e a crise de
confiança que abala o país, o fluxo
de recursos estrangeiros desabou.
Para cobrir o déficit externo, o saldo comercial -que havia se
transformado em déficit entre
1995 e 2001 -teve de aumentar
de forma significativa, garantindo
a entrada de dólares no país.
Se a desvalorização do real garante o financiamento para o déficit externo, via aumento de exportações, por outro lado faz a
economia flertar com a inflação.
A alta do dólar provoca o reajuste nos preços internos dos produtos que são comercializados no
exterior, como soja e trigo.
Por ora, as altas taxas de juros
têm impedido o repasse da alta
dos preços. Juros elevados dificultam a tomada de financiamentos
e inibem a demanda interna. Lojas, supermercados e prestadores
de serviços evitam repassar a alta
dos preços no atacado para não
perder mais consumidores.
Segundo Alexandre Schwartsman, economista-chefe da BBA
Corretora, a falta de financiamento externo é a maior semelhança
entre o que ocorre atualmente e o
que acontecia em 1993. A grande
diferença, diz ele, é que, naquela
época, a inflação estava descontrolada e era muito mais alta.
Tomás Málaga, economista-chefe do Itaú, acrescenta que a falta de financiamento externo hoje
é provocada por uma crise de
confiança que pode ser contornada. Entre 1982 e 1993, a escassez de
recursos era reflexo do calote da
dívida externa, ocorrido em 1982.
O maior risco hoje é o eventual
repasse da alta dos preços no atacado para os do varejo. Isso poderia fazer a inflação disparar.
Schwartsman lembra que o IPA
já subiu 21% nos últimos 12 meses, contra a alta de 8% do IPC.
Segundo Málaga, o próximo governo terá de manter forte esforço
fiscal, que permita a redução do
déficit externo. Isso abriria espaço
para o retorno de investidores e a
queda do dólar, o que diminuiria
a pressão sobre a inflação.
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