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BENJAMIN STEINBRUCH
O controle do controle do controle
Normas de governança são
novidade admirável na área
corporativa. Mas excessos de burocracia são retrocessos
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NÃO VI em jornais brasileiros
nenhuma referência a declarações feitas na semana passada pelo ex-presidente do banco central americano Alan Greenspan
sobre a Lei Sarbanes-Oxley. Vale a
pena citá-las.
Greenspan disse que a maior parte dessa lei americana, que estabeleceu regras de governança corporativa, é "criadora de custos sem benefícios". Ele tem uma forma jocosa de encarar o problema. Acha que todo o
processo de contabilidade imposto
pela lei é essencialmente um passatempo que desvia as atenções dos
principais executivos das tarefas
que eles efetivamente devem realizar, como projetar investimentos.
"Em vez disso, eles dedicam a maior
parte de seu tempo tentando descobrir como ficar fora da cadeia", afirmou Greenspan.
Quem é bom é bom mesmo. Aos
80 anos, aposentado depois de prestar inestimáveis serviços à economia dos Estados Unidos e do mundo, Greenspan continua a dar lições
de bom senso.
Para quem não é do ramo, a Lei
Sarbanes-Oxley é um conjunto de
normas baixadas nos Estados Unidos, em julho de 2002, em reação
aos escândalos financeiros como o
da Enron, em que os administradores da empresa fraudaram demonstrações financeiras e obtiveram lucros pessoais. Temia-se, naquela
época, que pudesse haver uma fuga
de investidores do mercado de ações
causada pela insegurança que os escândalos corporativos lançaram em
relação à governança das grandes
companhias. Então, um senador democrata (Paul Sarbanes) e um deputado republicano (Michael Oxley)
propuseram essa lei, apelidada de
SOX.
A SOX tem um conjunto de obrigações que as empresas com ações
negociadas na Bolsa de Nova York
-entre elas muitas brasileiras- devem seguir para evitar fraudes ou
identificá-las e divulgá-las quando
ocorrem. Obriga, por exemplo, a
criação de mecanismos de auditorias e comitês para supervisionar todas as atividades e operações.
É uma ótima lei. Ninguém pode
ser contra normas que defendam
ética, transparência e combate a
fraudes. Ocorre que o conjunto de
controles internos criados pela SOX
gera um sem-número de burocracias de contabilidade que representa
enormes aumentos de custos para
as empresas e de receitas para os auditores. Segundo a Financial Executive International, uma entidade
mundial que reúne diretores financeiros, uma empresa de capital aberto precisa gastar em média US$ 4
milhões por ano para cumprir a lei.
Um item da SOX (seção 404) exige
avaliação anual dos controles e procedimentos internos. Além disso, a
eficácia desses controles internos
deve ser atestada por relatórios de
auditores independentes. Em algumas empresas, a normatização da
SOX exige a contratação de até 40
pessoas.
Outro item (seção 302) determina
que o diretor-executivo e o diretor
financeiro da companhia devem declarar que conhecem e são responsáveis por todos os controles e procedimentos internos. Sei de um presidente de filial brasileira de empresa americana que, preocupado com
essa responsabilidade, rubrica pessoalmente todos os boletos de táxi
emitidos para uso dos funcionários
da empresa.
Nada contra as normas de governança. Elas representam uma novidade admirável deste novo século na
área corporativa. Mas os excessos de
burocracias significam retrocesso.
Pela lei, a eficácia operacional das
atividades de controle, por exemplo,
precisa ser avaliada por equipes que
gerenciam os programas de controle. Essas são controladas pelas auditorias independentes. Ou seja,
criou-se o controle do controle do
controle, com custos e burocracias
que atrapalham a funcionalidade
das empresas.
Greenspan não é o primeiro a criticar pontos da SOX. Alguns empresários e o próprio presidente da SEC
(Securities and Exchange Commission), Christopher Cox, já defenderam a idéia de que a lei precisa ser
revista, principalmente a seção 404.
Os senadores americanos Chuck
Schumer e Barney Frank promovem uma reavaliação da lei no Congresso dos EUA.
Mas Greenspan é ao mesmo tempo cáustico e pragmático em suas
críticas. Ao lembrar que os órgãos
reguladores e o Congresso estudam
ajustes nas normas da SOX, ele
acrescenta uma frase ferina: "Espero que isso ocorra antes que todo o
sistema financeiro se transfira para
Londres". Dá-lhe, Alan!
BENJAMIN STEINBRUCH , 53, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do
conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de
São Paulo).
bvictoria@psi.com.br
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