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OPINIÃO ECONÔMICA
Brasileiro
BENJAMIN STEINBRUCH
Com todo o respeito, acho
que o meu amigo Armínio
Fraga pisou na bola ao dizer, dias
atrás, que a forte presença dos
bancos estatais, especialmente do
BNDES, inibe o fortalecimento do
setor bancário privado e do mercado de capitais no Brasil.
O Brasil não pode prescindir do
BNDES, nosso único agente financeiro de longo prazo em reais.
Mesmo em um ano difícil, com
fortes restrições orçamentárias e
baixa demanda, o banco liberou
em 11 meses R$ 9 bilhões para micro, pequenas e médias empresas,
R$ 4,8 bilhões para a compra de
máquinas e equipamentos. Só em
novembro, concedeu R$ 4 bilhões
para financiar exportações, principalmente de automóveis e
aviões brasileiros, e ofertou R$ 2
bilhões para caminhoneiros autônomos comprarem veículos novos.
Infelizmente, apesar dos esforços e avanços recentes, o país não
tem ainda um mercado de capitais capaz de suprir as necessidades, como essas, de financiamento
em longo prazo. E, mesmo que
houvesse um mercado de capitais
mais eficiente, ainda assim um
banco como o BNDES seria fundamental para o desenvolvimento brasileiro.
Apoio e crescimento de setores
estratégicos jamais se dão por meros impulsos do mercado. Como
disse o presidente do BNDES,
Carlos Lessa, em entrevista à Folha, "não é o capital estrangeiro
que dá a partida para dinamizar
a economia". Os países precisam
primeiro se articular e, quando
são bem-sucedidos, aí sim atraem
o capital estrangeiro. Por isso, cabe ao Brasil estabelecer um plano
de prioridades nacionais, sustentado por instituições brasileiras,
como o BNDES. Ao fazer isso, nem
estamos dando demonstração de
inteligência ou criatividade. Simplesmente se trata de copiar o que
já foi feito, deu certo e continua
dando certo em países como Estados Unidos, Japão, Canadá, Alemanha e outros, que têm bancos
de desenvolvimento semelhantes
ao BNDES.
Considero excelente e correta a
atuação de Lessa e de sua diretoria, que enfrentou muitas críticas
em seu primeiro ano de gestão no
BNDES. Uma de suas estratégias,
já bastante explicitada, é a de
manter setores importantes como
mineração, siderurgia, celulose,
petroquímica e indústria naval,
entre outros, em mãos do capital
nacional. Mais do que isso, Lessa
considera que esses setores precisam se internacionalizar, adquirindo empresas ou participações
em companhias estrangeiras.
Lessa foi deslealmente criticado,
em novembro, quando o BNDES
comprou 8,5% do capital da Valepar, holding que controla a Vale
do Rio Doce, numa operação de
R$ 1,5 bilhão. Uma crítica dizia
que a iniciativa visava à reestatização da companhia. Outra sustentava que o banco havia pago
ágio excessivo (3,5% sobre o valor
de mercado das ações). As duas se
mostraram infundadas. A primeira, porque o objetivo da compra foi evitar que um grupo japonês, já detentor de 18,25% do capital votante da Valepar, tivesse
porta aberta para adquirir direito
de veto na Vale. Se isso ocorresse,
a empresa, de importância estratégica para o desenvolvimento, estaria escapando do controle brasileiro. A segunda crítica também
foi rebatida pelos fatos. Em pouco
tempo, revelou-se que o banco fez
um excelente negócio, embora esse não fosse o objetivo, porque o
valor das ações adquiridas já subiu 25% no mercado.
Nas mãos de Carlos Lessa, o
BNDES pode recuperar a sua função específica de apoiar o desenvolvimento. Por longos anos, em
razão de uma visão equivocada,
que considerava nacionalismo como sinônimo de xenofobia, as empresas nacionais ficaram relegadas à sua própria sorte. Acuadas
por juros elevados, sem crédito de
longo prazo e com deficiências de
capital, essas empresas se transformaram em presas fáceis para o
capital estrangeiro.
Para crescer, o país precisa aumentar a sua taxa de investimento e o BNDES pode ser o grande
instrumento desse processo, desde
que não se desvie de sua função
principal, que é o apoio ao desenvolvimento. Não faz o menor sentido o BNDES emprestar dinheiro
a multinacionais para que comprem empresas brasileiras, estatais ou privadas. Há dias, o banco
teve de renegociar a dívida da
AES, depois de tomar um calote
de US$ 1,2 bilhão, decorrente de
empréstimo tomado pela multinacional para comprar a Eletropaulo.
Sob Lessa, o BNDES certamente
não mais fará operações como essa, que se transformam em esqueletos assustadores para as futuras
administrações. Se o banco tiver
de assumir riscos, é melhor que o
faça internamente, com empresas
nacionais de todos os tamanhos,
para que se tornem competitivas e
possam, no presente e no futuro,
gerar mais empregos para mais
brasileiros.
Benjamin Steinbruch, 50, empresário,
é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional e presidente do conselho de administração da empresa.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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