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ANÁLISE
Opiniões extremas emperram debate
MARCELO LEITE
EDITOR DE CIÊNCIA
Quem acredita que a querela dos transgênicos se resolve, após mais de cinco anos de
indecisão, com o projeto de lei
aprovado na Câmara dos Deputados não perde por esperar.
O texto ainda vai ao Senado, onde recomeçam as pressões dos
dois campos polarizados, para
não dizer fundamentalistas. E
sempre há a possibilidade de vetos presidenciais, no final da linha. Isso para não falar do conselhão interministerial criado acima
das agências técnicas em guerra,
CTNBio e Ibama.
A indecisão se prolonga porque
a esfera pública foi tomada por
uma dicotomia prematura entre
cientistas e agronegocistas, de um
lado, e "ambientalistas", de outro.
Ambos os lados se encastelaram
em posições irreconciliáveis, turvando o debate e impedindo uma
solução, se não racional, ao menos de compromisso, política. A
partir de certo ponto, já na administração Lula, qualquer definição passou a implicar derrota acachapante para um dos lados.
Neste round da disputa parece
sair vitorioso o campo simbolizado pela figura da ministra Marina
Silva (Meio Ambiente), diante do
oponente Roberto Rodrigues
(Agricultura). Ganhou a parada
no que adquiriu a configuração
extrema de um ponto de honra,
impedir que a CTNBio tivesse a
prerrogativa de dispensar estudos
de impacto ambiental de cultivares transgênicos.
Intransigência
Ocorre que os "ambientalistas"
já ganharam outras vezes, inclusive na Justiça, mas não levaram.
Seja por meio de medidas provisórias (no governo de Fernando
Henrique Cardoso), seja por um
substitutivo do então líder na Câmara (Aldo Rebelo) que desfazia
acordo patrocinado pelo Executivo, o lobby do agronegócio sempre mostrou força para reabrir a
questão e reinstituir os superpoderes da CTNBio.
Afinal, é a exportação de soja
que produz divisas para o país,
não a imagem íntegra que Marina
Silva ainda empresta ao governo
do PT, no quesito sensível do respeito ao ambiente, ao menos no
plano internacional.
Sua derrota teria efeitos políticos deletérios para a equipe
"hardcore" do governo Lula, mas
não seria prudente alimentar a
ilusão de que, no caso de um enfrentamento final, ela deixaria de
exercer a costumeira opção preferencial pelos dólares. O retrospecto dos lances dessa partida, neste
governo e no anterior, não recomenda tal aposta.
Entre o agronegócio e as ONGs,
no entanto, estão -ou deveriam
estar- os cientistas, para trazer
uma palavra de racionalidade ao
debate.
Até o presente, essa comunidade escolheu deixar-se representar,
na esfera pública, por uma tropa
de choque que se enrolou na bandeira da liberdade de pesquisa para defender carta-branca para a
CTNBio.
Maradona x Gérson
Ou seja, para todos os efeitos
práticos, seu poder de licenciar o
plantio comercial da soja transgênica da Monsanto e com isso criar
um precedente, pondo essa tecnologia a salvo do controle público (não-técnico), pelo menos antes do fato consumado.
De fato consumado em fato
consumado, o país foi vendo a
disseminação da soja Maradona,
inicialmente contrabandeada da
Argentina e hoje multiplicada
-ilegalmente, sempre- por
centenas de agricultores brasileiros, e por isso mesmo já merecedora de ser rebatizada como soja
Gérson. Pelo visto vem mais prorrogação pela frente, nesse partida
que não tem fim.
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