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São Paulo, domingo, 06 de abril de 2003

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EXUBERÂNCIA DE PAPEL

Indicadores da economia americana não são suficientes para determinar recessão, diz comitê

EUA devem ter espasmos de crescimento

CÍNTIA CARDOSO
DA REPORTAGEM LOCAL

A alternância de pequenos espasmos de crescimento com momentos de declínio será a tônica da economia americana nos próximos anos.
A afirmação é do Serviço Nacional de Pesquisa Econômica (NBER, na sigla em inglês). O comitê, que reúne renomados economistas dos EUA, determina a duração dos ciclos econômicos norte-americanos.
Indicadores de atividade econômica, como índice de confiança dos consumidores e queda das vendas no varejo, também apontam para esse caminho. Dados revelados na semana passada pelo OEF (Oxford Economic Forecast) mostram que em fevereiro deste ano as vendas no varejo caíram 1,6% em relação ao mês anterior. A compra de bens duráveis também declinou 1,9% no período.
O estudo do OEF mostra que o índice de confiança dos consumidores caiu 2,3%, atingindo 62,5 pontos em março. Esse é o patamar mais baixo desde 1991, quando a economia americana passava por uma grave recessão.
Para o NBER, entretanto, esses sinais não são suficientes para endossar previsões de uma nova recessão. "Não se pode falar que os EUA estão atravessando um novo período de recessão, já que o fim da recessão [pós-bolha" ainda não foi declarado. Mas, obviamente, a queda da confiança dos consumidores é preocupante pois o crescimento que os EUA tiveram no último ano foi sustentado principalmente pelo consumo interno", afirma Jeffrey Frankel, um dos membros do conselho de economistas da instituição.
David Gould, diretor de Análise Econômica Global do IIF (Instituto Internacional de Finanças), também faz coro com os que dizem não prever uma recessão iminente. "Ano passado foi um ano positivo no que diz respeito ao consumo interno dos EUA. Já, no primeiro trimestre deste ano, percebemos um decréscimo no ritmo de consumo. Não dá para saber, porém, se essa é uma tendência de longo prazo ou apenas um espasmo. Afinal, os EUA acabaram de sair de uma recessão, tivemos um crescimento muito pequeno no ano passado e prevemos um patamar modesto para este ano", diz.
Na semana passada, o IIF divulgou uma carta alertando para o perigo de uma estagnação global em decorrência de problemas estruturais nas economias do G-7.

Desequilíbrios estruturais
No caso dos EUA, há dois nós estruturais evidentes que atravancam uma aceleração do crescimento. Um deles é o déficit comercial do país. No último trimestre de 2002, o valor chegou a US$ 548 bilhões, equivalente a 5,2% do PIB (Produto Interno Bruto). A manutenção desse déficit faz com que o país se torne cada vez mais dependente de investimentos estrangeiros a fim de cobrir esse rombo, caso contrário o dólar corre o risco de despencar. A estimativa é que sejam necessários US$ 400 bilhões ao ano.
Esse desequilíbrio também pode levar à alta do déficit orçamentário, que se tornará muito mais difícil de financiar. Neste ano, a cifra prevista é de US$ 350 bilhões.
Se esses sintomas de fragilidade da economia americana são incontestáveis, há também aqueles que ainda são pouco explícitos. O mais controverso é a perspectiva da explosão de uma nova "bolha", desta vez no mercado imobiliário.
Segundo relatório divulgado pelo FMI (Fundo Monetário Internacional) na última sexta-feira, os preços dos imóveis nos EUA aumentaram 27% acima da inflação desde a metade da década de 90. Esse recorde preocupa os economistas do Fundo, que temem que o estouro da "bolha" desencadeie uma crise bancária.
Entretanto Frankel, do NBER é cauteloso na avaliação desse indicador."Não existem sinais claros de uma "bolha imobiliária". Não há elevação generalizada nos preços dos imóveis nos EUA", diz.
A guerra no Iraque é mais um motivo de inquietação. "Uma guerra prolongada poderia agravar o já elevado déficit orçamentário. Também poderia acarretar o encolhimento da poupança interna e alargar o déficit comercial", analisa Stephen Roach, economista-chefe do banco de investimentos Morgan Stanley no seu recente artigo "A dysfunctional world" (em português, algo como mundo caótico).
O espectro de novas fraudes nas empresas norte-americanas, que poderiam recrudescer a crise de confiança do mercado, e o prognóstico de uma guerra mais longa que o previsto anteriormente também são apontados como pontos de fragilidade dos EUA pelo comitê.

Dólar fraco
Ao longo de 2002, a cotação do dólar se desvalorizou 25% em relação à do euro. O aspecto positivo desse fenômeno é que um dólar mais fraco poderia servir para ajustar o déficit comercial americano. O lado ruim, porém, é que esse enfraquecimento sinaliza recuo no nível de investimentos estrangeiros no país.
Para Nariman Behravesh, economista-chefe da consultoria GlobalInsight, a tendência é a retomada gradual a um patamar de equilíbrio entre as duas moedas. "Os Estados Unidos ainda são o melhor mercado entre os países industrializados no que se refere a oportunidades de investimento e dinamismo econômico", afirma.
Antonio de Lacerda, presidente da Sobeet (Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica), diverge: "A desvalorização do dólar deverá acentuar-se ante o euro, já que os efeitos dos gastos com a guerra contra o Iraque deverão agravar o desequilíbrio orçamentário", avalia.



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