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OPINIÃO ECONÔMICA
Telefones, bananas e mentiras
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
As campanhas eleitorais nas democracias modernas
são realizadas hoje, principalmente, por meio da TV. As grandes concentrações públicas como
veículo de divulgação de um candidato e de suas idéias são coisas
do passado. Com a entrada da
mídia eletrônica, uma outra linguagem foi adotada, e os grandes
discursos foram substituídos por
frases curtas, de fácil fixação pelo
público, pronunciadas pelos candidatos. No embate entre o conteúdo e a forma, a primeira foi
definitivamente relegada a um
segundo plano! Por isso a importância dos chamados marqueteiros nas eleições modernas.
Essa nova realidade está presente na campanha deste ano no
Brasil. As declarações dos candidatos na TV seguem disciplinadamente o novo paradigma,
orientados por seus publicitários.
Nesse cenário, o papel da imprensa escrita como instrumento de
separação do joio do trigo é fundamental para a democracia. Recolocar a verdade em seu lugar e
mostrar os aspectos negativos e as
dificuldades não explicitadas das
propostas miraculosas dos candidatos são alguns aspectos importantes dessa ação complementar e
corretiva.
A imprensa brasileira tem cumprido com eficiência esse papel. O
leitor da Folha pode verificar esse
fato, comparando as palavras dos
candidatos no início da campanha e suas posições hoje. A maioria das grandes besteiras e propostas demagógicas ou foram
abandonadas no caminho ou foram mudadas e são defendidas
hoje com uma ênfase muito menor. As dificuldades práticas e as
inconsistências do salário mínimo de Garotinho, da demonização das contas CC-5, da reforma
da Previdência e da renegociação
das dívidas do governo de Ciro
Gomes já foram expostas em detalhes à opinião pública.
Entretanto algumas dessas mistificações continuam vivas e sendo utilizadas pelos candidatos na
TV. Vou me ocupar de uma delas
na minha coluna de hoje. No último debate entre os candidatos à
Presidência da Republica, na Record, Lula voltou a insistir em que
a privatização do Sistema Telebrás foi feita "a preço de banana".
Para justificar sua afirmação,
lembrou uma declaração do ex-ministro Sérgio Motta, feita muito antes de o processo de privatização ser iniciado, em que ele dizia que as ações do governo valiam mais de R$ 40 bilhões. Como
o valor efetivo da venda foi pouco
superior à metade desse valor, estaria caracterizada uma má venda.
Como já se passaram quatro
anos do leilão de privatização
-virou história, portanto-, a
realidade dos fatos está disponível àqueles que procuram a verdade, e não a mistificação e o engodo. A queda brutal dos preços
pagos por um telefone no Brasil, a
obrigação de instalar por R$ 50
um telefone em 48 horas, a democratização dos celulares, a farta
disponibilidade de orelhões nas
periferias das grandes cidades, os
volumosos investimentos realizados por obrigações contratuais
dos novos concessionários privados ridicularizaram os argumentos usados por muito tempo pelo
PT para tentar desqualificar os
benefícios da privatização do Sistema Telebrás. A crítica de que o
cidadão, principalmente o mais
pobre, foi prejudicado foi abandonada. Sobrou a questão do
"preço de banana"!
As declarações de Sérgio Motta
lembradas pelo PT foram feitas,
como já disse, muito antes da definição do modelo de privatização do setor, informação fundamental para o cálculo do preço de
venda das ações do governo. Se a
Telebrás tivesse sido vendida como monopólio, como foi feito no
México, o valor a ser obtido estaria próximo do número citado
por Lula. Mas foi uma decisão do
próprio Serjão de dividir a empresa em 12 companhias para criar a
competição e diminuir o poder de
monopólio das empresas privatizadas. O custo dessa decisão foi
uma redução importante no valor das ações, como qualquer manual barato de finanças mostra.
Posteriormente à morte de Sérgio, com o modelo de competição
definido, foram realizadas duas
avaliações sobre o valor econômico da empresa pelos seus lucros,
forma como se deve proceder em
casos como esse. Aliás o PT fez o
mesmo em Ribeirão Preto, ainda
em 1998. O número obtido para
as 12 companhias foi de cerca de
R$ 8 bilhões. Como vivíamos um
momento de grande excitação
nos mercados de ações de empresas de telecomunicações, o governo fixou o preço mínimo para o
sistema em mais de R$ 13 bilhões.
O resultado final da venda dos
pouco menos de 20% do capital
das empresas que pertenciam ao
Tesouro foi de mais de R$ 22 bilhões, ou seja, um ágio de 64%.
O site primeiraleitura.com.br
mostrou ontem o valor de mercado hoje de cada uma das empresas privatizadas e sua relação
com os valores do leilão de privatização. Eles são impressionantes
e mostram uma realidade totalmente diferente da demagogia
barata de Lula. Em dólar, o valor
de mercado da antiga Telebrás
hoje é apenas 14,5% do valor de
venda em julho de 1998: os US$ 19
bilhões de quatro anos atrás valem hoje, nas Bolsas de São Paulo
e Nova York, US$ 2,7 bilhões.
Em reais correntes a diferença é
de R$ 8,4 bilhões hoje, contra R$
22 bilhões no leilão. Se corrigirmos o valor obtido pelo Tesouro
em 1998 pela taxa Selic, temos um
cenário semelhante ao dos valores em dólares: R$ 46 bilhões em
1998, contra R$ 8,4 bilhões hoje,
segundo a avaliação diária dos
mercados, ou seja, apenas 18% do
valor obtido no leilão de privatização.
Para uma pessoa que está querendo provar aos eleitores que
evoluiu e amadureceu durante os
últimos anos, essa demagogia barata de Lula pega muito mal! Ela
nos lembra o passado, e, como ele
mesmo disse no debate, o passado
precisa ser considerado pelo eleitor em sua escolha na urna eletrônica.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 59, engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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