São Paulo, sábado, 07 de maio de 2005

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TRABALHO

Empresas detectam que tédio gerado pelo emprego tem pesado mais nas decisões de carreira do que pressões da vida doméstica

Frustrações motivam êxodo de executivas

CLAUDIA H. DEUTSCH
DO "NEW YORK TIMES"

O número de mulheres em posições de gerência e nas profissões liberais supera o de homens, hoje em dia, e a maior parte das empresas adotou normas que têm por objetivo ajudar suas líderes a equilibrar as demandas profissionais e as familiares.
No entanto, três décadas depois que uma mulher pela primeira vez assumiu o comando executivo de uma empresa do ranking Fortune 500, menos de 2% das grandes empresas são dirigidas por mulheres. Os especialistas em recrutamento de executivos e os conselhos supervisores têm motivos para querer descobrir a causa.
A resposta, começam a concluir alguns especialistas, tem menos a ver com discriminação nos corredores executivos ou pressões domésticas do que com a frustração e o tédio gerados pelos empregos. "Os homens suportam tudo, mesmo que rangendo os dentes, enquanto as mulheres avaliam se aquilo é tudo que um trabalho tem a oferecer e muitas vezes decidem que precisam de mais", disse Mabel M. Miguel, professora de administração de empresas na Escola Kenan-Flagler de Administração de Empresas, segmento da Universidade da Carolina do Norte, em Chapel Hill.
Deborah Merrill-Sands, reitora da Simmons School of Management, uma escola feminina de administração de empresas, em Boston, diz que a despeito de anos de esforço "a maioria das grandes empresas ainda não sabe exatamente como reter as mulheres de alto potencial".
As grandes empresas estão começando a procurar respostas. Gigantes da indústria como General Electric, Procter & Gamble e IBM, bem como empresas de consultoria e auditoria como Booz Allen Hamilton, Ernst & Young e Deloitte & Touche, criaram programas cujo objetivo é manter as mulheres interessadas em suas carreiras profissionais.

Sensação de estagnação
É o caso de Zara F. Larsen, 48, que descobriu há muito tempo de que maneira usar o e-mail, o trabalho, a distância e outros métodos para equilibrar suas responsabilidades familiares e seu emprego. Ela passou por quatro diferentes posições de grande responsabilidade na United Technologies, ao longo dos dez últimos anos. No ano passado, por que sentia certa estagnação em sua carreira, ela pediu demissão para fazer doutorado em administração de empresas. "Não estava mais recebendo o estímulo intelectual de que precisava", diz.
Uma oferta "irresistível" da Raytheon Missile Systems a atraiu de volta ao mundo empresarial. A empresa propôs que ela terminasse seu doutorado, levando o tempo que considerasse necessário, mas lhe ofereceu, ao mesmo tempo, o posto de diretora de eficiência empresarial, com responsabilidade por corte de custos, aceleração de processos e promoção de mudanças na cultura da empresa.
Uma história como essa não deveria surpreender os executivos de grandes empresas. Uma década atrás, a Procter & Gamble, prejudicada por um nível de "atrito" de mão-de-obra feminina duas vezes mais alto do que o predominante entre os homens, consultou as mulheres que classificara como "perdas lastimadas", profissionais de alto desempenho que a empresa gostaria de ter retido, sobre os motivos para que decidissem se demitir. A resposta é que não se sentiam valorizadas. "Muitas diziam que não compreendiam que sua partida era lastimada pela empresa até que foram contatadas para participar da pesquisa", disse Jeannie Tharrington, porta-voz da empresa.
A Deloitte passou por embaraço semelhante ao pesquisar mulheres consideradas como potenciais sócias da empresa que haviam preferido deixar a companhia, nos anos 90. "Descobrimos que mais de 90% delas continuavam empregadas, mas não por nós", relembra Cathleen A. Benko, que dirige o setor de alta tecnologia na Deloitte e seu programa de retenção e promoção de mulheres. "Foi o fim da idéia de que essas mulheres tinham optado por ficar em casa e cuidar de suas famílias".

Pesquisas
Isso pode surpreender algumas pessoas, mas não os pesquisadores da Catalyst, uma organização de consultoria sem fins lucrativos, com sede em Nova York, que concentra seus esforços na situação das mulheres em ambiente de trabalho. "Todas as nossas pesquisas demonstram que as mulheres têm ambição semelhante à dos homens, no que tange a chegar ao topo", disse Ilene H. Lang, presidente da Catalyst.
Mas apenas nos últimos anos as empresas começaram a agir com base nessas constatações. E seus índices de retenção de executivas vêm subindo em proporção aos seus esforços.
A Procter vem treinando suas executivas em técnicas de administração de tempo, em parte para permitir que aquelas que enfrentam pressões familiares aceitem funções "de frente", cargos que envolvem responsabilidade direta por lucros e prejuízos de marcas específicas. Ao permitir que as mulheres aceitem essas posições, nas quais a pressão é elevada e desempenho eficaz é importante para o futuro de uma carreira, disse Tharrington, a Procter elevou em 25% sua retenção de executivas, nos últimos cinco anos, e aumentou a proporção de mulheres entre os promovidos de cargos médios para cargos superiores.
Na IBM, as mulheres agora ocupam 19% dos postos executivos em todo o mundo. Jeannette Horan, vice-presidente, diz que acredita saber a razão. Horan, 49, trabalhou para cinco empresas antes de chegar à IBM, em 1998. Em cada uma delas, disse, "eu me interessava por desenvolver minhas capacidades, causar maior impacto e sempre tinha de me transferir para fazê-lo". Em seus sete anos de IBM, ela passou por três cargos, mudanças que ela mesma solicitou -e espera assumir novas responsabilidades, quando decidir que precisa de novos desafios.
A GE tem programas para promover a formação de redes femininas e para prover orientação e treinamento, além de adotar normas que permitem dedicar tempo à família. Mas Susan P. Peters, vice-presidente de desenvolvimento de executivos, diz que a insistência da GE de que "todos tenham quantidade e qualidade em seu trabalho" pode ser a maior responsável pelo fato de que hoje 15% de seus executivos são mulheres, ante 9% em 1997.

"Mamães"
Jeanne M. Rosario serve como exemplo. Quando seus dois filhos eram pequenos, trabalhava meio período e chegou a recusar uma grande promoção. Mas, conta, nem por isso a GE a colocou em trajetória de carreira reservada às "mamães". "Eles me davam o máximo de trabalho que eu podia realizar; sempre deixavam para mim a responsabilidade de dizer que aquele volume era o bastante", diz. Rosario, 53, é vice-presidente de engenharia de serviços e design comercial na GE Transportation, a mulher com posto mais elevado na área de tecnologia da empresa.
Quando Alisa L. Kennedy engravidou de seu segundo filho, seis anos atrás, ela se demitiu da empresa porque se preocupava com a possibilidade de que as responsabilidades domésticas a fizessem sentir "inconseqüente" no trabalho. A Ernst & Young a atraiu de volta com um projeto especial que permitia que ela avançasse gradualmente para um posto de período integral. Em 2004, 22% dos novos sócios selecionados eram mulheres, e Kennedy estava entre os escolhidos.
Com freqüência, dizem os especialistas em gestão, esse tipo de opção é negado às mulheres, muitas vezes por homens que consideram estar agindo em defesa dos interesses femininos. "Os executivos homens que não designam um cliente difícil para uma mulher que tem filhos acham que estão sendo compreensivos", diz Candida G. Bush, diretora do Conselho de Liderança e Espírito Empresarial da Mulher, na Boston University. "Mas estão apenas sendo condescendentes".


Tradução de Paulo Migliacci


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