São Paulo, Sexta-feira, 07 de Maio de 1999
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LUÍS NASSIF

O Brasil visto de fora

O Brasil deve ser visto com otimismo moderado, na opinião dos cinco debatedores que participaram da mesa "Cenários econômicos: o que o investidor pode esperar do Mercosul", do World Economic Forum, que transcorre em Santiago do Chile. Os debatedores eram Eliana Cardoso, do Banco Mundial, Felipe Larrain, da John Kennedy School of Government, de Harvard, Luís Rubio, do Centro de Estudos para o Desenvolvimento, do México, e este colunista, mediados por Guillermo de la Dehesas, vice-chairman da Goldman Sachs Europa, da Espanha.
Economista criteriosa, que não costuma se envolver com as ciclotimias do mercado, Eliana abriu um quadro do déficit em conta corrente, mostrando uma região ainda muito dependente de financiamentos internacionais. Mantida a dependência, qualquer refluxo significaria aumento da recessão.
Internacionalmente, os EUA continuam a exibir vigor, mas Japão, China e Europa preocupam, e sinalizam para um crescimento internacional medíocre.
Os indicadores de risco do Brasil vêm diminuindo desde fevereiro, segundo estudo do J.P.Morgan, mencionado por Eliana, enquanto os da Argentina estão em ascensão. Dos estudos de Eliana, constata-se que países que adotaram taxas de câmbio flexíveis tiveram menores índices de desemprego e de queda da atividade industrial após as crises asiática, da Rússia e do Brasil. A apresentação do representante do México mostrou as semelhanças entre a realidade dos dois países. No México, a abertura da economia produziu novas regiões industriais e condenou à decadência os velhos centros, de indústrias tradicionais. As empresas nacionais foram sacrificadas pela falta de mecanismos de financiamento e pelo endividamento provocado por políticas monetárias ortodoxas.
De minha parte, aproveitei o caráter internacional do encontro para questionar o padrão de análise consolidado nesses fóruns e no mercado financeiro internacional. A necessidade de tornar seus estudos compreensíveis fez com que esse mercado padronizasse análises, indicadores e conclusões, sem se preocupar em analisar a realidade por trás dos indicadores e características nacionais não-mensuráveis.
Sem conhecer as realidades nacionais, a cada crise nacional esses analistas tiram conclusões universais, que são desmontadas pela crise seguinte. Quando governos se rendem a essas análises, e deixam de lado a observação de suas realidades econômicas específicas, resulta o desastre ocorrido com a política cambial brasileira.
Resta a lição de que, se governos nacionais não dispuserem de capacidade analítica autônoma para adaptar as conclusões internacionais às suas realidades específicas, estarão fadados a mergulhar seus países em crise permanente.

Escândalos
A CPI dos Bancos continua mais preocupada com episódios policiais do que com temas institucionais relevantes. A apresentação do deputado Aloizio Mercadante (PT-SP) mostrando que bancos ganharam R$ 10 bilhões em poucos dias apostando contra o real, por conta de uma simples vacilação do governo -quatro dias entre a demissão e o anúncio oficial da saída de Gustavo Franco-, não foi considerada relevante. O que se quer são bilhetes, telefonemas comprometedores, contas secretas, impressões digitais.
Repito: o simples fato de o presidente da República e o ministro da Fazenda Pedro Malan terem aguardado três dias para formalizar a demissão de Gustavo Franco, naquela semana fatídica, custou R$ 10 bilhões ao país. O homem incumbido de tomar as decisões mais estratégicas do país não sabia que reter aquela informação por alguns dias teria um custo equivalente a metade do ajuste fiscal -que está sendo bancado com o sacrifício de todo o país.
Espera-se que, com o refluxo do escândalo fácil, a CPI comece a discutir temas institucionais relevantes, que permitam manter sob controle os governantes, impedindo-os de continuar no Banco Central, como fizeram até agora. E o Congresso passe a exigir o mínimo do governo: competência para administrar a crise.

E-mail: lnassif@uol.com.br


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