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VINICIUS TORRES FREIRE
Sarkozy e "Manô Marron"
Presidente quer proteger capital e "liberalizar" por baixo, mas país ainda está dividido e periferias continuam quentes
O QUE IMPORTA a eleição francesa? A França é menos e
menos relevante na economia mundial. Menos que a Inglaterra, com sua grande finança, seus impostos baixos e sua desigualdade social crescente. O PIB francês era
20% maior que o inglês pré-revolução thatcherista, em 1980. Hoje é
10% menor. Na política, tem direito
de veto na cúpula da ONU, embora a
ONU tenha virado pó-de-traque
após George Bush 2º. Vinha sendo
um pólo regional de resistência retórica contra o império americano.
Tem também bombas nucleares, a
"bombette", como dizem diplomatas americanos, fazendo chacota.
Além de ser um museu, uma livraria, um centro de debates, um restaurante e um jardim maravilhosos,
belos e civilizadíssimos, o interesse
da França pode ser o de um grande e
inteligente laboratório do conflito
social e econômico do mundo desenvolvido maduro -provavelmente o último laboratório.
Discute-se, especialmente na mídia anglo-saxã, em que lugar da escala entre Thatcher e Blair ficará a política de Nicolas Sarkozy. Mas, quanto ao grande capital, Sarkô sugere
mais um Colbert transgênico ou um
"bonapartista protecionista", como
o chamaram no "Le Monde", do que
um liberal (Colbert, o ministro mercantilista de Luís 14, rei da França
no século 17). Sarkozy na campanha
mesmo defendeu a proteção da
grande empresa francesa contra
aquisições estrangeiras. Quer difundir na União Européia o protecionismo francês e tem um histórico de
"parcerias público-privadas".
Ministro da Economia de Jacques
Chirac, usou dinheiro público para
salvar a gigante Alstom da concordata ou de uma aquisição alemã.
Apadrinhou grandes fusões. Alguns
de seus amigos megaempresários,
esperam seu concurso para resolver
grossas questões corporativas.
Sarkô decerto quer quebrar a espinha dos sindicatos, em especial no
serviço público, cortar empregos
públicos e o quanto puder da lei da
jornada de trabalho de 35 horas, reduzir o livre acesso às universidades
e baixar impostos em geral. A França "privada" votou nele, do pequeno
comerciante e agricultor aos executivos e megaempresários.
Isto é, a bronca vai sobrar para
funcionalismo, sindicalistas e os
"Manos Browns" da periferia das
grandes cidades, os "Manô Marrons", imigrantes e descendentes,
marginalizados quase todos.
Em 1995, Alain Juppé, premiê de
Chirac, tentou reformar a Previdência Social francesa. Greves pararam
o país e tinham o apoio de 65% da
população. A era Chirac morreu aí.
Houve tentativas liberalizantes de
2003 a 2005, quase todas barradas
nas ruas, com protestos muito menores, é verdade. Mas ao protesto
declinante da "França branca" protegida pelo Estado haverá o protesto
da França "Manô Marron", que por
ora é mais fúria do que política.
Apesar da decrepitude da esquerda, Sarkô vai lidar com uma França
ainda dividida e nem de longe preparada para o mercadismo "cum"
desigualdade inglês. O comparecimento maciço às urnas mostrou que
o país em massa quer tanto mudanças de fato como defender o conservantismo social-democrata. A depender da rapidez e da vontade que
Sarkozy evoluir na escala Blair-Thatcher, o pau pode comer.
vinit@uol.com.br
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