São Paulo, segunda-feira, 09 de junho de 2008

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Procurador discutiu caso Varig com Dilma

Manoel Brandão, que deu parecer sobre sucessão de dívidas da Varig, diz que foi chamado várias vezes pela Casa Civil

Ex-procurador-geral da Fazenda nega ter sofrido pressão, mas diz que havia entendimento contrário da Casa Civil sobre o parecer

LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Uma das poucas vozes contrárias à venda da Varig nos moldes desejados pelo governo, Manoel Felipe Brandão, 46, ex-procurador-geral da Fazenda Nacional, disse à Folha que foi chamado pela ministra Dilma Rousseff (Casa Civil), por diversas vezes, para tratar do assunto. Apesar de evitar usar o termo pressão, disse que havia uma "polêmica muito grande na Casa Civil" e forte resistência contra sua posição, incluindo da número dois de Dilma, Erenice Guerra.
Brandão deu parecer pelo qual as dívidas da Varig teriam de ser assumidas pelo comprador da empresa. Esse era o maior empecilho à venda da companhia. Ele foi substituído por Luiz Inácio Adams, que deu parecer exatamente como queria o Palácio do Planalto, ou seja, a dívida não seria da responsabilidade do novo controlador da companhia aérea.
A Folha deixou recados ontem para a assessoria de imprensa da Casa Civil, mas não houve resposta.
Abaixo, os principais trechos da entrevista de Brandão.  

FOLHA - Não está muito claro como a Casa Civil agiu em relação à Procuradoria Geral da Fazenda no episódio. Houve pressão sobre o sr.?
MANOEL FELIPE BRANDÃO
- Havia um entendimento contrário ao meu.

FOLHA - Entendimento que vinha da Casa Civil?
BRANDÃO
- Vinha de várias áreas do governo, e eu achava normal [...]. O desencontro de idéias era absolutamente natural. Eu tinha uma idéia muito firme da sucessão [da dívida].

FOLHA - Quem no governo tinha essa interpretação contrária à sucessão dívida?
BRANDÃO
- Havia uma polêmica muito grande dentro da Casa Civil contra a minha idéia. Havia uma polêmica muito grande também dentro do Ministério da Fazenda contrária ao meu entendimento [...]. O meu pensamento jurídico eu não tenho como negar porque foi público e notório na época. O que eu não quero jamais é que envolvam o meu nome numa polêmica entre uma eventual pressão da Casa Civil para a Anac aprovar a venda da Varig.

FOLHA - O senhor teve contato com a sra. Erenice Guerra nesse episódio?
BRANDÃO
- Óbvio, todos nós nos encontrávamos. Não me encontrei com a senhora Erenice só nesse caso, não. Em todas as questões que envolviam matéria de interesse da Fazenda Nacional eu tinha encontros com ela. Não foi só nesse caso.

FOLHA - O sr. se lembra quais eram os argumentos dela contrários ao parecer do senhor?
BRANDÃO
- Por uma questão de respeito e de ética, eu acho que eu não deveria comentar. Se alguém tiver que comentar, tem de ser ela.

FOLHA - O sr. se lembra de ter conversado com a ministra Dilma sobre esse caso?
BRANDÃO
- Sim, participei de reuniões onde a ministra Dilma estava, mas não me lembro exatamente o que a ministra Dilma disse. Da mesma forma que em relação à Erenice, eu não tenho por que falar do pensamento da ministra Dilma.

FOLHA - O sr. se recorda de onde foram essas reuniões com a ministra?
BRANDÃO
- É lógico, você se reúne com o ministro na sede dele, né? É óbvio. Eu era de segundo escalão, e ela era ministra de Estado.

FOLHA - O sr. foi convidado para ir à Casa Civil?
BRANDÃO
- Eu fui convidado para ir à Casa Civil assim como fui inúmeras vezes para tratar dos mais variados assuntos que envolvessem interesses da Fazenda Nacional.

FOLHA - Foi mais de uma reunião?
BRANDÃO
- Sim, esse assunto foi exaustivamente discutido no âmbito do governo.

FOLHA - O sr. diz que deu seu parecer com base na lei e na jurisprudência. Nesse caso, a interferência do governo não seria equivocada?
BRANDÃO
- Eu não acho que eu tenha sofrido pressão, eu sofri resistências ao meu pensamento. E eu resisti dignamente, porque eu achava que estava correto e mantive meu pensamento até o final. Se alguém se sentiu pressionado e fez o que não acreditava, eu não tenho nada a ver com isso.

FOLHA - Não é muito coincidência o sr. ser substituído logo após ter havido resistências ao seu parecer?
BRANDÃO
- Essa é uma resposta que eu não tenho que dar. A minha posição é clara e firme. Qualquer coisa que eu fale nesse sentido pode parecer um certo revanchismo, uma certa vingança.


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