Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Procurador discutiu caso Varig com Dilma
Manoel Brandão, que deu parecer sobre sucessão de dívidas da Varig, diz que foi chamado várias vezes pela Casa Civil
Ex-procurador-geral da Fazenda nega ter sofrido pressão, mas diz que havia entendimento contrário da Casa Civil sobre o parecer
LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Uma das poucas vozes contrárias à venda da Varig nos
moldes desejados pelo governo, Manoel Felipe Brandão, 46,
ex-procurador-geral da Fazenda Nacional, disse à Folha que
foi chamado pela ministra Dilma Rousseff (Casa Civil), por
diversas vezes, para tratar do
assunto. Apesar de evitar usar
o termo pressão, disse que havia uma "polêmica muito grande na Casa Civil" e forte resistência contra sua posição, incluindo da número dois de Dilma, Erenice Guerra.
Brandão deu parecer pelo
qual as dívidas da Varig teriam
de ser assumidas pelo comprador da empresa. Esse era o
maior empecilho à venda da
companhia. Ele foi substituído
por Luiz Inácio Adams, que
deu parecer exatamente como
queria o Palácio do Planalto, ou
seja, a dívida não seria da responsabilidade do novo controlador da companhia aérea.
A Folha deixou recados ontem para a assessoria de imprensa da Casa Civil, mas não
houve resposta.
Abaixo, os principais trechos
da entrevista de Brandão.
FOLHA - Não está muito claro como a Casa Civil agiu em relação à
Procuradoria Geral da Fazenda no
episódio. Houve pressão sobre o sr.?
MANOEL FELIPE BRANDÃO - Havia
um entendimento contrário ao
meu.
FOLHA - Entendimento que vinha
da Casa Civil?
BRANDÃO - Vinha de várias
áreas do governo, e eu achava
normal [...]. O desencontro de
idéias era absolutamente natural. Eu tinha uma idéia muito
firme da sucessão [da dívida].
FOLHA - Quem no governo tinha
essa interpretação contrária à sucessão dívida?
BRANDÃO - Havia uma polêmica muito grande dentro da Casa
Civil contra a minha idéia. Havia uma polêmica muito grande
também dentro do Ministério
da Fazenda contrária ao meu
entendimento [...]. O meu pensamento jurídico eu não tenho
como negar porque foi público
e notório na época. O que eu
não quero jamais é que envolvam o meu nome numa polêmica entre uma eventual pressão da Casa Civil para a Anac aprovar a venda da Varig.
FOLHA - O senhor teve contato
com a sra. Erenice Guerra nesse episódio?
BRANDÃO - Óbvio, todos nós
nos encontrávamos. Não me
encontrei com a senhora Erenice só nesse caso, não. Em todas as questões que envolviam
matéria de interesse da Fazenda Nacional eu tinha encontros
com ela. Não foi só nesse caso.
FOLHA - O sr. se lembra quais eram
os argumentos dela contrários ao
parecer do senhor?
BRANDÃO - Por uma questão de
respeito e de ética, eu acho que
eu não deveria comentar. Se alguém tiver que comentar, tem
de ser ela.
FOLHA - O sr. se lembra de ter conversado com a ministra Dilma sobre
esse caso?
BRANDÃO - Sim, participei de
reuniões onde a ministra Dilma
estava, mas não me lembro exatamente o que a ministra Dilma
disse. Da mesma forma que em
relação à Erenice, eu não tenho
por que falar do pensamento da
ministra Dilma.
FOLHA - O sr. se recorda de onde foram essas reuniões com a ministra?
BRANDÃO - É lógico, você se
reúne com o ministro na sede
dele, né? É óbvio. Eu era de segundo escalão, e ela era ministra de Estado.
FOLHA - O sr. foi convidado para ir à
Casa Civil?
BRANDÃO - Eu fui convidado
para ir à Casa Civil assim como
fui inúmeras vezes para tratar
dos mais variados assuntos que
envolvessem interesses da Fazenda Nacional.
FOLHA - Foi mais de uma reunião?
BRANDÃO - Sim, esse assunto
foi exaustivamente discutido
no âmbito do governo.
FOLHA - O sr. diz que deu seu parecer com base na lei e na jurisprudência. Nesse caso, a interferência do
governo não seria equivocada?
BRANDÃO - Eu não acho que eu
tenha sofrido pressão, eu sofri
resistências ao meu pensamento. E eu resisti dignamente,
porque eu achava que estava
correto e mantive meu pensamento até o final. Se alguém se
sentiu pressionado e fez o que
não acreditava, eu não tenho
nada a ver com isso.
FOLHA - Não é muito coincidência
o sr. ser substituído logo após ter havido resistências ao seu parecer?
BRANDÃO - Essa é uma resposta
que eu não tenho que dar. A minha posição é clara e firme.
Qualquer coisa que eu fale nesse sentido pode parecer um
certo revanchismo, uma certa
vingança.
Texto Anterior: Caixa Econômica entra na área de câmbio Próximo Texto: Governistas tentam adiar audiência no Senado Índice
|