São Paulo, domingo, 09 de julho de 2000


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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS

China mantém controle das teles

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A Conferência Bienal da Sociedade Internacional de Telecomunicações talvez seja hoje o mais eclético e amplo espaço de discussões sobre a nova sociedade da informação. Participam da sociedade técnicos, funcionários de governos, acadêmicos e operadoras do setor econômico que está redefinindo as próprias regras de funcionamento da economia.
Na semana passada acompanhei por três dias, em Buenos Aires, uma verdadeira maratona de painéis e sessões de debate. Ficou claro que a questão da regulamentação continua na ordem do dia, mesmo em países onde houve maior liberalização (caso da Argentina ou do Chile).
Novas funções para o Estado e para as agências reguladoras são debatidas. E os impactos da convergência entre infra-estrutura de telecomunicações, plataformas de comércio eletrônico e sistemas de produção de conteúdo continuam muito longe de qualquer indício de nitidez.
Numa das sessões se discutiu em profundidade a estratégia dos chineses. Além do gradualismo e do planejamento estratégico, ficou evidente que a admissão do gigante oriental à OMC levará a concessões, mas sem que o Estado abra mão de deter o controle sobre o processo e, acima de tudo, capacidade de induzir desenvolvimento tecnológico nacional. Estratégia, aliás, semelhante à que tem sido adotada pelos japoneses, que apesar da liberalização e mesmo abertura do mercado continuam operando com uma gigantesca telefônica nacional em situação de quase-monopólio.
Quanto à defesa de uma estratégia nacional, a literatura especializada nota que a OMC exige a liberalização das telecomunicações, mas deixa a critério de cada país decidir quanto ao ritmo dessa liberalização.
A receita chinesa é pragmática. Para abrir o seu gigantesco mercado à participação estrangeira, os chineses continuam irredutíveis na proteção ao mercado doméstico, na preservação de capacitação em desenvolvimento tecnológico e no exercício permanente de pressões para que haja transferência de tecnologia, sobretudo por meio de joint ventures com empresas locais. O cenário da política chinesa para o setor de telecomunicações (com US$ 1,5 bilhão de investimentos públicos em 99) foi apresentado por Xu Yan, professor da Universidade de Ciência e Tecnologia de Hong Kong.
Yan caracteriza a estratégia da China com uma imagem cinematográfica: o governo estaria "dançando com os lobos" (o processo já dura 14 anos).
Em sua negociação com a OMC, o governo chinês conseguiu manter o direito a impedir o controle estrangeiro do setor de telecomunicações, estabelecendo um limite de participação de 49% para capitais externos.
O exemplo mostra que não se trata de um retorno ao nacionalismo nem de xenofobia: os investimentos diretos no setor têm sido significativos, mas subordinados a estratégias locais.
Na China prevalecia, até pouco tempo, a política dos "três 90%": 90% dos lucros são retidos pela operadora; 90% da receita em moeda forte é retida pela operadora e 90% do investimento governamental no setor é dado como gasto a fundo perdido.
Conclusão: o compromisso com a liberalização já foi assumido pela China, que tem todo o interesse em entrar na OMC. Quanto ao "modus operandi", às formas de financiamento e às regras de associação com capitais estrangeiros, o território chinês continua ambíguo e regulado e, mais que nunca, os reguladores chineses sabem que a pressa é inimiga da perfeição.


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