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São Paulo, sábado, 09 de agosto de 2003

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LUÍS NASSIF

Inflação e câmbio

Alguns jornalistas sérios indagam: se o Banco Central desvalorizar o câmbio e baixar as taxas de juros, como fica o combate à inflação?
Essa angústia decorre dessa idéia fixa que tomou conta do debate econômico, de que se deve esquecer qualquer outra variável da economia, em nome exclusivo do combate imediato à inflação. Essa cegueira leva a políticas que, ao reduzir temporariamente a inflação, abre as portas para um retorno dela no futuro, em alto estilo.
O economista fast food do Banco Central olha o momento e constata: se desvalorizar o câmbio agora, poderá ocorrer nova alta de preços agora. O estrategista olha o momento e pensa: se não desvalorizar o câmbio agora, o que poderá ocorrer com a inflação daqui a alguns meses?
Repare que, do Plano Real para cá, todos os surtos foram decorrentes da explosão do câmbio. Ou seja, manteve-se o câmbio apreciado por muito tempo para segurar a inflação do momento, o câmbio explodiu depois, trazendo de volta a inflação.
Aí é importante separar alta de preços (que ocorre uma vez) de inflação. Inflação é um processo continuado de alta de preços. Quando ocorre uma desvalorização cambial, a consequência é uma alta de preços, como ocorreu em 1999 e 2002. Os contratos indexados são reajustados e os preços dos produtos comercializáveis (exportados ou importados) tornam-se mais caros que os produtos internos. É esse movimento que torna as exportações competitivas, permitindo o aumento dos superávits comerciais.
Se se combate a alta de forma adequada, ela se esgota em si, como ocorreu nas últimas desvalorizações. Mas, se o movimento não deixa o câmbio no nível adequado, mais à frente ocorre outra crise cambial, com novos custos a serem pagos pela sociedade.
Portanto a maneira de criar o cenário sustentável de equilíbrio de preços é colocar o câmbio em um patamar tal que elimine de vez a possibilidade de novas desvalorizações. Desvaloriza uma vez em tal nível que nunca mais a economia precise depender de capital volátil -que é aquele que provoca os choques cambiais.
O governo Luiz Inácio Lula da Silva conseguiu o presente de um câmbio que garantiu o equilíbrio nas contas externas e uma inflação que, com três meses de juros altos, foi contida. O Banco Central permitiu que o câmbio se apreciasse de novo. Pagou a conta, mas não levou o bônus.
Agora vai ter que começar de novo, e esse processo poderá ter custo menor se bem administrado. Mas é importante que se comece a olhar para a frente, fugindo da síndrome do economista fast food.
Mesmo que signifique um pouco mais de inflação no momento, a desvalorização cambial é condição essencial para que não se tenha mais inflação no futuro.

Câmbio e contas externas
Em 1994, o Banco Central apreciou o câmbio e criou um rombo nas contas externas. Em 1999, o câmbio descomprimiu e o rombo diminuiu. Em 2002, o câmbio desvalorizou mais ainda e as contas externas se equilibraram. E o ex-ministro Pedro Malan continua falando que a uma desvalorização de câmbio corresponde uma inflação que anula os ganhos cambiais. Ele e Mailson da Nóbrega estão lá, cabeça a cabeça.

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