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São Paulo, quinta-feira, 09 de outubro de 2003

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COMÉRCIO MUNDIAL

Chanceler diz que é preciso "mais diálogo" dentro do governo, mas defende a postura do Itamaraty

Para Amorim, houve "falha de comunicação"

ANDRÉ SOLIANI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

As divergências internas do governo em relação à Alca (Área de Livre Comércio das Américas), explicitadas pelos ministros Roberto Rodrigues (Agricultura) e Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento), são resultados de falha na comunicação interna do governo, disse o ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim.
"[É preciso] melhorar o nível de comunicação interna", afirmou, ao comentar as principais conclusões da reunião de ontem com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os ministros Furlan, Antonio Palocci Filho (Fazenda) José Dirceu (Casa Civil) e Jaques Wagner (Trabalho) e o assessor especial da Presidência, Marco Aurélio Garcia.
Apesar do discurso conciliatório de Amorim, a Folha apurou com diplomatas brasileiros que o Itamaraty avalia que sua obrigação não é defender os interesses de um ou de outro ministério nas negociações, mas apresentar uma política de governo, que leve em conta as mais diversas opiniões, inclusive as contrárias à Alca.
Amorim deixou claro que cabe ao Itamaraty "coordenar as negociações". E disse que nem sempre é possível consultar seus pares sobre estratégias de negociação.
"Todos elogiaram a atuação do Itamaraty em Cancún. O Itamaraty, no entanto, nunca consultou outro ministério sobre a criação do G20", disse o ministro.
Cancún foi a última reunião da OMC (Organização Mundial do Comércio), na qual o Brasil liderou a formação de um grupo de países em desenvolvimento para pressionar os países ricos a flexibilizar as negociações agrícolas.
Amorim, embora reconheça a necessidade de maior diálogo com seus pares, defendeu a posição do Itamaraty na reunião. "Não havia nada de essencialmente novo na proposta que o Mercosul fez na reunião."
Segundo ele, o Brasil e seus parceiros no Mercosul apresentaram uma proposta baseada em decisões que haviam sido tomadas em reuniões ministeriais no Brasil e que tinham o aval do presidente Lula. "Era de pleno conhecimento dos ministros", disse ele.
Segundo Amorim, o presidente demonstrou preocupação com o impacto da disputa pública dos seus ministros na imagem externa do país. Seria prejudicial para o país nas negociações passar a idéia de que existem diferenças internas sobre como deve ser conduzido o processo negociador.
"Nós todos temos telefone. É muito fácil", ironizou Amorim, ao comentar a necessidade de manter um diálogo mais intenso com outros ministros.
Segundo diplomatas do Itamaraty, o governo brasileiro nunca tratou de forma tão transparente e democrática o debate interno sobre a Alca. A reunião da semana passada foi a primeira na qual participaram como delegados oficiais do Brasil representantes sindicais, de ONGs e de ministérios, como o do Desenvolvimento Agrário, que não eram incluídos nas negociações.

Com relação às críticas de que o Brasil estaria isolado nas negociações da Alca por ser intransigente -Rodrigues fez comentários nesse sentido há dois dias-, Amorim foi categórico: "Essa idéia de isolamento ou é um certo complexo de perseguição ou uma tática para desacreditar a posição brasileira".
A declaração não foi feita como resposta a Rodrigues. Quando questionado sobre as afirmações do seu colega, Amorim indicou que não havia problemas entre os dois. O ministro da Agricultura não participou da reunião ontem porque estava no Uruguai.

Bastidores
Os setores defensores da Alca, como o Ministério do Desenvolvimento, não estão nada satisfeitos com a atuação do secretário-geral do Itamaraty, embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, nas negociações.
Guimarães ficou conhecido ainda no governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), quando foi exonerado, em 2001, da direção do Ipri (Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais) por criticar abertamente a participação do Brasil na Alca. Guimarães estava viajando ontem e não foi encontrado.
Para alguns integrantes do governo, Guimarães tenta centralizar as discussões internas sobre a Alca e não permite aos ministérios mais favoráveis ao acordo defenderem suas posições. Ele é cotado para substituir o atual embaixador brasileiro em Buenos Aires, José Botafogo Gonçalves.


Colaborou Sílvia Mugnatto, da Sucursal de Brasília


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