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OPINIÃO ECONÔMICA
Um livro
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Na segunda-feira passada, chegou às minhas mãos
o meu novo livro, "A Economia
como ela é...". Eu sei, leitor, que
não há nada de excepcional em
publicar um livro nos dias de hoje. Políticos, economistas, jornalistas, atrizes, proprietários de circo, dançarinas de ventre, enfim,
toda uma variada fauna acredita
ter uma mensagem a oferecer ao
distinto público e encontra, sem
grande dificuldade, meios de chegar à página impressa.
Antigamente, era diferente. Ter
um livro publicado era uma honra e uma distinção. Quando um
autor passava na rua, as pessoas
cochichavam, reverentes: "Aquele
lá tem livro publicado, tem livro
publicado!". E o autor, mesmo
que de um único e solitário opúsculo, desfilava, tranquilo, orgulhoso da sua condição de escritor
impresso.
O tempo passou e o livro se trivializou. É cada vez maior o número de escritores e menor o número de leitores.
Se tiver um mínimo de sensibilidade, o sujeito que resolve lançar
um livro tem que se explicar direitinho, quase deve pedir desculpas.
Bem. Preliminarmente, posso
dizer que em 20 anos de atividade
como economista e pesquisador, e
descontadas as obras em co-autoria, só havia publicado dois livros
até agora. Não abusei, portanto.
E acredite, leitor, nem sempre é
fácil escrever um livro e assegurar
que ele seja editado corretamente.
De todos os meus livros, o que
mais me custou foi, sem dúvida,
este último, que será lançado em
São Paulo na próxima segunda-feira à noite, na livraria Cultura,
e no Rio, na livraria Argumento
do Leblon, na segunda seguinte,
dia 20.
Foi um parto difícil. O drama
começou com a escolha da editora errada, a Revan, do Rio de Janeiro, que tratou de forma extraordinariamente incompetente
e desleixada o meu pobre e indefeso livro. Revi e corrigi as provas
durante meses e meses. A editora
cometia e repetia uma montanha
de erros, misturava arquivos, alterava o texto sem avisar o autor.
Quase me levou à loucura.
Um exemplo cômico foi a insistência em trocar a expressão rodriguiana "idiotas da objetividade" por "idiotas da juventude",
algo que poderia me incompatibilizar com toda uma nova geração
de leitores. Por alguma razão
misteriosa, o erro era corrigido e
reaparecia em provas subsequentes, quem sabe se por alguma auto-referência inconsciente da jovem equipe da Revan.
Depois de meses de desacertos e
adiamentos, briguei com a editora e a publicação voltou à estaca
zero. Alguns amigos, solidários
com as minhas agruras, se prontificaram a me ajudar a encontrar
uma boa editora. E, lá do céu,
vendo que eu já havia padecido o
bastante, Deus resolveu finalmente me colocar no caminho
certo.
Conheci a Ivana Jinkings, dona
da Boitempo Editorial, que se interessou imediatamente pelo trabalho. A Ivana era a editora ideal
para um autor traumatizado.
Cuidou pessoalmente do livro,
com carinho e dedicação.
A troca de editora atrasou a publicação mais alguns meses. Mas
valeu a pena. O livro foi reestruturado e submetido a novas atualizações e revisões. Aproveitei para incluir material novo de pesquisa, ainda inédito, que ficara
pronto nesse meio tempo.
Graças à Ivana, o livro ficou
uma beleza. Foi tudo checado e
rechecado, nos mínimos detalhes.
A uma certa altura do trabalhoso
processo de revisão e correção, a
Ivana comentou: "O pior é que
ninguém vai reparar nesse cuidado todo que estamos tendo".
Quem sabe? A verdade é que
nós tivemos um esmero de artesão de catedral gótica medieval.
Os restauradores do século 20 descobriram maravilhados que, nos
pontos mais altos e inacessíveis
das catedrais góticas, os artesãos
haviam ornamentado as construções com detalhes rigorosamente
invisíveis de qualquer ponto do
chão ou das galerias. Era um trabalho de amor e fé, que jamais seria contemplado por ninguém,
feito pelo artista para Deus e para
si.
Mas repare, leitor, que o bonito
dessa história é que, séculos e séculos depois, os restauradores
modernos redescobriram, afinal,
os detalhes ocultos do trabalho
desses artesãos anônimos.
Vamos parar por aqui. Percebo
que, no meu entusiasmo de ex-autor traumatizado, estou exagerando na comparação.
Quero dizer apenas que o livro
recapitula e sistematiza um pouco as minhas lutas e polêmicas
dos anos recentes. Conta a história de uma batalha geralmente
inglória contra as tendências dominantes no pensamento e na política econômica do país.
Desse esforço talvez se possa dizer, "mutatis mutandis", o que
disse François Truffaut do seu filme-livro "O Homem que Amava
as Mulheres": de todas essas peripécias e controvérsias, ficará de
qualquer modo alguma coisa, um
traço, um testemunho, um objeto
retangular, 426 páginas em brochura -um livro.
Paulo Nogueira Batista Jr., 45, economista e professor da Fundação Getúlio
Vargas-SP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "A Economia
como ela é..." (Boitempo Editorial. E-mail: boitempo@ensino.net).
E-mail - pnbjr@attglobal.net
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