São Paulo, domingo, 09 de dezembro de 2001

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SALTO NO ESCURO

Falta de licenciamento ambiental e inoperância do Mercado Atacadista de Energia atrasam um terço das obras de usinas

Licença e mercado emperram termelétricas

PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO

Das 32 termelétricas que integram o programa emergencial do governo federal para aumentar a oferta de energia no país, 11 -um terço do total- enfrentam problemas. Levantamento feito pela Folha revela que as obras de oito usinas estão atrasadas.
Pior: três térmicas que já foram inauguradas não estão gerando um quilowatt de energia.
As usinas que já deveriam estar funcionando são Macaé e Seropédica, no Rio de Janeiro, e Fafen, na Bahia. Juntas, elas têm capacidade para gerar 1.245 MW, o que corresponde à energia gasta em média por 4,5 milhões de residências de classe média da região Sudeste.
As empresas responsáveis pelas três usinas afirmam que elas estão paradas simplesmente porque não conseguem vender a energia produzida, devido à inoperância do MAE (Mercado Atacadista de Energia). Para o atraso na obras das outras oito térmicas, o principal obstáculo apontado é a demora nas licenças ambientais.
Para aumentar a geração de energia em meio à crise, o governo dobrou em meados deste ano o número de termelétricas do programa emergencial, sem resolver a questão do licenciamento e desemperrar o MAE.
Peça-chave para o atual modelo do setor elétrico e criado para negociar energia excedente das geradoras, o MAE não conseguiu funcionar até hoje.
O primeiro obstáculo ocorreu quando Furnas não reconheceu uma dívida de R$ 800 milhões que teria com o MAE. A dívida é resultado do atraso de mais de um ano do início do funcionamento da usina nuclear de Angra 2, no Rio. Sua energia já estava sendo comercializada pelo mercado antes mesmo de começar a operar. Por ser o maior negócio até então, o mercado ficou paralisado.
Depois, foi a vez de denúncias de irregularidades em sua gestão e uma intervenção da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), que culminou com a demissão de toda a diretoria, o inviabilizarem.
Investidores e Petrobras afirmam que, se o governo não solucionar o problema do MAE, novos investimentos estarão comprometidos.
O superintendente de geração da Aneel, Cristiano Amaral, admite que a maior parte das usinas com cronogramas atrasados não tem o licenciamento ambiental. O caso mais grave é o da usina de Cubatão, um projeto da Petrobras e da Marubeni. Depois de quase três anos, a autorização para a obra foi dada em outubro.
O diretor de gás e energia da Petrobras, Antonio Luiz Menezes, disse que o problema das licenças é mais grave em São Paulo. Em relação ao MAE, ele disse que espera para abril de 2002, no máximo, uma solução do problema.
O vice-presidente da El Paso -dona da usina de Macaé-, Eduardo Karrer, se disse preocupado com a situação, afirmando que novos investidores podem fugir do país se a situação prosseguir. A empresa tem o custo da compra do gás de Macaé, mas não tem para quem vender a energia.
Tanto Menezes como Karrer apontam a mesma solução para as térmicas enquanto o MAE não sair do papel: a CBE (Comercializadora Brasileira de Energia), empresa criada pelo governo para negociar energia a preços diferenciados durante a crise.
Maurício Bähr, presidente da Tractebel, disse que só irá ampliar a usina William Arjona (MS) em 80 MW se o governo garantir a compra da energia pela CBE. Bähr defende também um realinhamento de preço da energia e afirma que, se não houver um comprador firme (sem interrupções) para a carga das térmicas, por meio de um contrato com distribuidoras, elas ficam inviáveis.
Cristiano Amaral, da Aneel, afirma que as empresas já sabiam do risco de investir em térmicas, tanto de firmar os contratos para a compra do gás como de fornecimento de energia. Disse que isso não é "argumento para qualquer atraso em seus cronogramas".
Para Fernando Quartim, do grupo Rede, os problemas do MAE foram criados pelo próprio governo, que permitiu que Furnas devesse R$ 800 milhões e a Eletrobrás pleiteasse o direito, ganho na Justiça, de comercializar as sobras de energia de Furnas.
O assessor para termelétricas do Ministério de Minas e Energia, Rui Feijão, disse que o governo, por meio da Câmara de Gestão da Crise de Energia, "busca alternativas para garantir que as termelétricas já em condições de operar possam ter sua energia despachada". Mas não as detalhou.


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