São Paulo, terça-feira, 10 de agosto de 2004

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OPINIÃO ECONÔMICA

Confiamos neles

BENJAMIN STEINBRUCH

Cruzo os dedos para que, dentro de duas semanas, no dia 23, lá pelas quatro horas da tarde, todo o Brasil esteja parado diante da televisão. Se tudo correr bem, nesse dia a ginasta Daiane dos Santos disputará a final da prova de solo, sua especialidade, na Olimpíada de Atenas.
Caso ganhe uma medalha, essa gauchinha de 1,45 m de altura conseguirá um registro inédito tanto para o esporte brasileiro quanto para os Jogos Olímpicos. Pela primeira vez, uma atleta negra subirá ao pódio olímpico na ginástica artística.
Daiane é, na verdade, uma esperança de medalha de ouro na Olimpíada que começa na sexta-feira. Mas, salvo casos isolados como esse, o Brasil entra nos Jogos ainda com poucas chances de apresentar um desempenho esportivo digno do tamanho do país.
O futebol e o basquete masculino não conseguiram classificação, e só as meninas nos representarão nessas duas tradicionais modalidades. Vôlei masculino e feminino, basquete feminino, futebol feminino, vela, salto triplo, natação, judô e equitação, entre outras modalidades, também podem trazer medalhas.
De qualquer forma, as conquistas continuarão sendo mais decorrência de determinação e perseverança individual de atletas e treinadores obstinados do que de organização e apoio oficial ao esporte.
Comparado com o de outros países, o apoio brasileiro aos esportes olímpicos é ainda inexpressivo. Os Estados Unidos, por exemplo, destinaram recursos públicos da ordem de US$ 500 milhões às modalidades olímpicas nos últimos quatro anos, quase dez vezes mais do que o Brasil.
Tudo bem, nada a reclamar. Não se podem exigir mais recursos para desenvolver novas modalidades, dadas as dificuldades enfrentadas pelo país nos últimos anos. Mas também é inaceitável o retrocesso observado nos esportes olímpicos brasileiros. Em Sydney, quatro anos atrás, mesmo ressalvada a má sorte de alguns atletas, a verdade é que o país regrediu mais de 20 anos em matéria de conquistas. Desde 1976, em Montréal, foi a primeira vez em que o Brasil saiu de uma Olimpíada sem nenhuma medalha de ouro. O país foi o 52º colocado no quadro geral de medalhas.
Todos se lembram das tristes madrugadas de Sydney. O cavalo Baloubet du Rouet, que, aliás, volta a competir em Atenas, refugou ao saltar os últimos obstáculos, que dariam a medalha de ouro a Rodrigo Pessoa. O futebol caiu nas quartas-de-final diante de nove valentes camaroneses, derrotado pela empáfia de um time que se considerava campeão por antecipação. O velejador Robert Scheidt foi vítima de manobras "agressivas" do britânico Ben Ainslie e perdeu o ouro na regata final. O vôlei de praia, masculino e feminino, também caiu na final.
O esporte é um negócio bilionário. A Olimpíada de Atenas, que exigiu investimentos de US$ 12 bilhões da Grécia, será vista por 2,5 bilhões de pessoas pelo mundo. Estima-se que os patrocínios esportivos alcancem US$ 26 bilhões por ano em todo o mundo.
Mas o fator econômico do esporte não é o mais importante. Não custa lembrar que a prática do esporte ajuda na formação dos jovens e, bem direcionada, proporciona vida saudável para as pessoas de todas as idades. Além disso, conquistas esportivas são fundamentais para um país porque despertam a auto-estima e o nacionalismo sadio, aquele que não tem vergonha de cantar hinos e balançar bandeiras, sem o que não se vai a lugar nenhum em matéria de desenvolvimento de uma nação.
Ganhar ou perder é uma contingência do esporte. Mas há, sem dúvida, muita responsabilidade sobre os ombros da pequena Daiane dos Santos e dos demais 244 atletas brasileiros que participam das Olimpíadas. Confiamos neles.


Benjamin Steinbruch, 50, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional e presidente do conselho de administração da empresa.

E-mail - bvictoria@psi.com.br


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