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OPINIÃO ECONÔMICA
E la nave va
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
O ano de 2002 começa a "pegar no breu", como diz a sabedoria popular. No Brasil, só a
Quarta-Feira de Cinzas marca
efetivamente o início do ano novo
para a sociedade! Mas, no mundo
dos negócios, a dinâmica é outra.
Já estamos vivendo com intensidade o último ano da era FHC.
Para o analista das coisas da política e da economia de nosso país,
os eventos estão ocorrendo com
uma velocidade impressionante.
Quem bobear ou ficar preso a seus
valores ideológicos menores corre
o risco de ficar desmoralizado. A
força dos eventos da política será
bastante forte e merece uma atenção especial de todos.
Vivemos também no exterior
um momento de revisão de alguns valores, que marcaram e deram segurança à economia internacional nos últimos anos. Principalmente nos EUA, onde até o
endeusado Alan Greenspan está
sob acusação de ter feito vista
grossa a uma nova era de irresponsabilidade fiscal do Partido
Republicano. Terminou a era do
delírio ultraliberal e as expectativas dos agentes econômicos estarão mais comedidas e realistas. A
economia mundial deve voltar a
uma fase de crescimento sustentado e de expectativas diminuídas.
Vamos aos fatos! A mudança
mais marcante que estamos vivendo hoje está no quadro eleitoral brasileiro. A candidatura Roseana zerou a disputa pela Presidência da República, em outubro
próximo. Destruiu as candidaturas alternativas de Ciro Gomes e
Itamar Franco e mostrou que a de
Lula tem pés de barro. O candidato do PT está estacionado há mais
de um ano nos 30% de apoio declarado do eleitorado e corre o risco de cair para a faixa alta dos
20% nas próximas pesquisas.
Uma de suas âncoras externas, o
presidente da Venezuela, começa
a viver seu inferno astral depois
de alguns anos de ilusória liderança, na triste pátria de Simon
Bolívar. Seu último confronto
com a imprensa daquele país parece marcar o início de seu fim.
Será muito ruim para a candidatura de Lula a vinculação com
um ditador decadente e que foi
documentada fartamente por toda a imprensa brasileira.
Nesse cenário, a possibilidade
de duas candidaturas que saem
do grupo que dá apoio político a
FHC passou a ser uma realidade.
Roseana com o apoio do PFL, do
PTB e do PPB e José Serra com o
PSDB e PMDB de seu lado. Isso
abre um campo riquíssimo de
manobra para um político hábil
como nosso presidente. Poderemos ter em abril um quadro eleitoral que tire um fantasma importante que está aparecendo nas
expectativas do mercado sobre a
economia brasileira.
Um segundo vetor importante
para as cores do ano no Brasil é a
evolução do drama argentino. Os
fatos ganharam uma dinâmica
muito forte a partir da ruptura
definitiva do sistema monetário e
cambial que vigorou nos últimos
anos. Nas próximas semanas, ficará claro se a crise atual vai desembocar em uma saída exitosa,
como ocorreu no México em 1995
e no Brasil em janeiro de 1999, ou
se vai repetir o mesmo México em
1982. O nó principal da situação
na Argentina está no descasamento entre ativos em peso e passivos em dólares que passou a
existir no sistema bancário argentino, depois do fim da paridade cambial. São mais de US$ 10
bilhões, que podem levar os bancos à falência. Duas saídas são
possíveis: a cobertura da diferença com títulos do Tesouro ou a
nacionalização do sistema financeiro. A hipótese de prejuízos elevados para o investidor estrangeiro pode criar alguma dificuldade
para a normalização de nossas
relações financeiras com os mercados internacionais e atrasar
um pouco a recuperação de nosso
crescimento econômico.
Mas, de qualquer maneira, o
descolamento entre as duas economias e o volume elevado de investimento estrangeiro ao longo
de dezembro são indicadores a
mais dessa situação já garantindo um cenário econômico mais
positivo para 2002. Principalmente depois que as chuvas de verão eliminaram definitivamente
do cenário o fantasma da restrição no consumo de energia elétrica.
Outra força relevante para a
construção do cenário brasileiro
em 2002 será o comportamento
da economia americana ao longo
do ano. Uma recuperação do nível de atividade na economia líder do mundo será fundamental
para a volta do otimismo nos investidores e empresas em relação
ao futuro. Os analistas americanos estão ainda divididos em relação a esse tema, embora a corrente majoritária esteja otimista
em relação ao último semestre do
ano. Na minha opinião, o reaquecimento de nossa economia depende hoje muito mais de fatores
internos, principalmente juros,
mas uma ajuda da economia externa será importante. Reafirmo
minha previsão de que o crescimento do PIB deve voltar ao nível
de 4% ao ano à época das eleições
presidenciais. Não devemos ter
grandes mudanças no quadro do
emprego e do salário real, mas a
volta do crescimento deve afetar
positivamente o humor do eleitor.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 59,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e
ministro das Comunicações (governo
FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail: lcmb2@terra.com.br
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