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BENJAMIN STEINBRUCH
O país do "deixa pra lá'
Por que os brasileiros saíram
de campo contra a França
como se tivessem perdido um
jogo de campeonato regional?
RESISTI QUANTO pude à idéia de
retomar o tema da Copa do
Mundo. A decepção com a
derrota da seleção brasileira para a
França foi tão grande que parecia
melhor esquecer o assunto, na suposição de que esse infortúnio seria
apenas esporte, nada mais. Mas me
dei conta de que as coisas não são
bem assim.
Nós, brasileiros, não podemos nos
acostumar com uma espécie de
comportamento que não apura responsabilidades e, principalmente,
não tira lições de seus erros e fracassos. Coisa parecida costuma ocorrer
em outras áreas. No caso do mensalão, por exemplo, depois de todo o
barulho que se fez, a maior parte das
dúvidas foi jogada para debaixo do
tapete, para que seja esquecida.
Há que resistir à cultura do "deixa
pra lá", muito comum no país. Não
se trata de cobrar a seleção pela derrota -derrotas fazem parte do futebol e da vida. Ela tem de ser cobrada
pelo comportamento dos jogadores
e da comissão técnica. Por que o técnico não escalou os jogadores que
estavam em melhor condição, mais
motivados, principalmente os mais
jovens? Por que insistiu com outros
que pareciam apenas interessados
em quebrar recordes pessoais? Por
que os jogadores brasileiros não
mostraram determinação para buscar as vitórias durante toda a Copa?
Por que saíram de campo no jogo
contra a França como se tivessem
perdido uma partida qualquer de
um campeonato regional?
É preciso buscar respostas para
essas perguntas, porque, se isso não
for feito, tudo pode se repetir na próxima Copa. Algumas lições já estão
muito claras. Não se pode mais, por
exemplo, formar toda a seleção com
jogadores que atuam no exterior, os
chamados "estrangeiros". Esses
atletas, com honrosas exceções, são
pessoas "globalizadas", que já não
carregam como os jogadores do passado o sentimento forte de brasilidade. Terminada a Copa, um vai para uma balada em Madri, outro para
Nova York, outro para Milão. Nenhuma lágrima. Desembarcam no
Brasil apenas alguns reservas bois
de piranha e dois ou três que atuam
em clubes daqui.
A segunda lição, banal, que se adota também nas corporações empresariais, é que sempre se deve mesclar experiência com juventude. Nada contra jogadores veteranos. Zidane, com 34 anos, estava no Estádio
Olímpico de Berlim, na final de domingo, quando a Itália ganhou seu
tetracampeonato, e jogava bem até o
momento em que perdeu a cabeça e
agrediu o zagueiro italiano Materazzi. Mas nossos veteranos estavam
fora de forma, e a comissão técnica,
que se gaba de formar equipes vencedoras, não teve coragem para
substituí-los. Muito diferente do
que fez Vicente Feola na distante
Copa de 1958, na Suécia, quando pôs
em campo, no lugar de velhas estrelas, um garoto de 18 anos, Pelé, e um
jovem ponta-direita de pernas tortas, Garrincha.
Talvez escape à percepção de jogadores e de membros da comissão
técnica o fato de que Copa do Mundo não é apenas futebol. Em tempos
de paz, essa competição, mais do que
qualquer outra, é a exibição on-line
de qualidades nacionais. Durante
um mês, o mundo fica parado diariamente por horas a fio diante das
TVs. Bilhões de pessoas interrompem suas atividades, gostem ou não
de futebol, para ver nações em combate. Jogadores são quase soldados
com pés de baionetas. Nesse contexto, o que ocorreu no jogo contra a
França foi uma deserção. Nossos
soldados desistiram da batalha e
perderam sem honra.
Portugal, por exemplo, comandado pelo treinador brasileiro Luiz Felipe Scolari, é um caso exemplar.
Perdeu com honra e foi aclamado
por sua torcida. Em 1982, a seleção
brasileira formada pelo técnico Telê
Santana foi eliminada pela Itália na
Copa da Espanha, mas voltou ao
Brasil sob aplausos e até hoje é citada como uma das melhores de todos
os tempos.
A campanha da Copa 2010, na
África do Sul, começa já, com uma
obrigatória modificação completa
da comissão técnica. Por coincidência, as escolhas dos novos dirigentes
se darão ao mesmo tempo em que o
país escolhe também seus novos representantes no governo. Está na
hora de escolher melhor essa gente,
seja no futebol, seja na política. Volta, Felipão!
BENJAMIN STEINBRUCH , 52, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do
conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de
São Paulo).
@ - bvictoria@psi.com.br
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