São Paulo, domingo, 11 de agosto de 2002

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LUÍS NASSIF

Nosso amigo Esmê

Esmeraldino é uma das lendas mais consistentes e desconhecidas do choro nacional. Cavaquinhista, compositor, conheci-o em 1978, durante o Festival do Choro da TV Bandeirantes, pouco antes de ele morrer. Fui cumprimentá-lo, ele me convidou para uma rodada, mas a conversa ficou nisso. Morreu no ano seguinte.
Apresentada no festival, sua música "Arabiando" era um primor de complexidade, herdeira da geração do início dos anos 50 que promoveu a modernização do choro. Do regional que o acompanhou, participava o João Macacão, meu amigo e companheiro de noitadas.
Esmeraldino era do time de Severino Araújo, Guio de Moraes, Radamés, K-Ximbinho, Luiz Americano, Orlando Silveira e outros instrumentistas que foram beber na grande evolução do jazz no pós-guerra, ajudando a renovar o choro.
Era um negro retinto, alegre, dono de um sorriso largo. Em 1980, eu já no "Jornal da Tarde", o crítico e produtor Armando Aflalo me deu a honra de escrever a contracapa do mais importante disco de choro do período: o "São Paulo no Balanço do Choro - Ao Meu Amigo Esmê", que transportou o pianista Laércio de Freitas ao panteão dos gênios da música instrumental brasileira.
O "amigo Esmê" era Esmeraldino. Egresso da rádio paulistana e da TV Tupi, assim como Armandinho, o violonista redescoberto pelo jornalista Sérgio Gomes nos anos 70, fez parte de um grupo de músicos talentosos, mas que não tinham uma caixa de ressonância como o Rio para fazer ecoar seu trabalho.
Laércio conheceu Esmeraldino aos 11 anos, quando sua mãe o levou para assistir ao "Gurilândia", programa de auditório da rádio Tupi. Desde então, Esmeraldino transformou-se em referência maior de Laércio e responsável pelo primeiro cachê recebido por ele, aos 16 anos.
Não foi o único gênio formado por Esmeraldino. O acordeonista Orlando Silveira foi outro. A parte mais substanciosa da obra de Esmeraldino, aliás, foi uma série de parcerias com Orlando Silveira, o grande mestre do instrumento ao lado de Chiquinho do Acordeom, mas que ganharia projeção nacional só depois de ele se mudar para o Rio de Janeiro, onde firmou reputação também como grande arranjador. Nos anos 90, um mês antes de sua morte, entrevistei Orlando em seu apartamento no Rio. Na entrevista, falou bastante de sua parceria com Esmeraldino.
Agora, o conjunto Um x 0, com o qual tive a honra de tocar domingo desses no bar Piratininga, da Vila Madalena, acaba de lançar "Tributo a Esmeraldino", um CD particular, aliás como 90% dos CDs relevantes que estão sendo lançados no país, e com dez composições inéditas do mestre. O conjunto foi criado por Osvaldo Colagrande, que assina as oito composições restantes, sozinho ou em parceria com Esmeraldino, e que integrou o conjunto de Esmeraldino na rádio Tupi, em 1957.
No início de carreira, Esmeraldino participou do regional do Rago -violonista- e do clarinetista Siles. Depois, formou o Conjunto Moderno Siles Esmeraldino e passou a chefiar o Conjunto da Tupi. Além de cavaquinho, tocou violão e contrabaixo acústico. E, especialmente, o violão dinâmico, onde interpretava "standards" do jazz que muito o influenciaram, especialmente Benny Goodman e Louis Armstrong.
É desse período sua parceria com Orlando Silveira, que gerou obras-primas como "Noites do Sumaré", "Equilibrando", "Dedilhando", "Perigoso", e que Orlando relançaria em 1979, no LP "Ontem, Hoje e Amanhã".
Hoje em dia, nem todos -só os melhores- ousam interpretar outras preciosidades como "Bons Tempos", "Moderno", "Por Acaso", "É Isso Aí, Bicho!".
É uma das figuras referenciais do choro moderno brasileiro.
E-mail - lnassif@uol.com.br


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