São Paulo, domingo, 12 de maio de 2002

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CONJUNTURA

Já se esperava por turbulências, mas apenas no segundo semestre

Aumento de risco ameaça rolagem de dívida externa

MARCIO AITH
DE WASHINGTON

MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL

O diretor de mercados emergentes da corretora Goldman Sachs de Nova York, Paulo Leme, e o economista-chefe para a América Latina do banco de investimentos Lehman Brothers, Paulo Vieira da Cunha, avaliam que o setor privado brasileiro terá dificuldades de rolar parcela do total dos vencimentos de sua dívida externa que vence até agosto. Ambos concordam que essas dificuldades deverão pressionar o câmbio brasileiro, forçando uma desvalorização adicional do real.
A alta da moeda norte-americana pegou as empresas despreparadas. Quem têm dívida em dólares já esperava por turbulências, mas apenas no segundo semestre. A expectativa era que a corrida presidencial só iria esquentar após junho. A turbulência chegou antes e tem dois efeitos. Quando não restringe o acesso ao mercado global de capitais, torna as fontes de financiamento mais caras.
"Apenas as linhas de financiamento ligadas ao comércio exterior tendem a ficar estáveis. Quem não é exportador tem mais dificuldade", diz Alfred Dangoor, diretor do Dresdner.
O primeiro sinal de deterioração visível foi o risco-país, que fechou essa semana em alta de 7,5%. Esse aumento significa que, na prática, se o governo ou empresas brasileiras quiserem colocar mais títulos no mercado externo, terão que pagar juros maiores que o que pagavam na semana passada.
Para as empresas, os custos tornam-se proibitivos. A saída é captar no mercado interno, rolar apenas parte da dívida ou captar dólares com outros instrumentos, como empréstimos sindicalizados. "Mas são todas opções com custos maiores", afirma Dangoor.
Paulo Leme estima que haveria problemas para a rolagem de US$ 3 bilhões da dívida. Como no mesmo período ocorrerá a entrada sazonal de dólares das exportações agrícolas, o saldo líquido dos vencimentos da dívida privada que tende efetivamente a pressionar o câmbio deve cair para US$ 2 bilhões. Leme prevê que a cotação do dólar vá chegar a R$ 2,55 em setembro e R$ 2,65 em outubro.
A retração das captações tende a pressionar mais o dólar, que já subiu 2,53% esta semana. Com menos dólares entrando na economia, a tendência é de alta. A incerteza faz também com que as empresas tentem se proteger, comprando dólares, e novamente alimentando uma alta da moeda norte-americana.
Vieira da Cunha acredita que o risco para o câmbio não se limita às dívidas do setor privado que vencem nos próximos meses. Ele dá ainda mais importância à demanda por proteção ("hedge"), que tende a aumentar com a proximidade das eleições e que, como no ano passado, poderá provocar uma desvalorização indesejada na cotação do real.
"A demanda por hedge [proteção" deve subir nas próximas semanas", diz o economista Otaviano Canuto. Ele lembra ainda que há uma concentração de vencimentos da dívida externa privada nos próximos três meses.
Entre junho e agosto, vencem 40% das dívidas das empresas brasileiras. São cerca de US$ 7,3 bilhões que precisam ser pagos ou refinanciados nos três meses. Dangoor, do Dresdner, avalia que não é possível prever o qual o impacto que haveria no câmbio se parte das dívidas não forem refinanciadas no mercado externo.
Mas há quem prepara-se para o pior. A RC Consultores traça um cenário em que a cotação do dólar a R$ 3,50 em dezembro. Nesse caso, o candidato governista perderia a eleição. Nos cálculos da consultoria, a probabilidade de que isso ocorra, é pequena: 15%.


Colaborou Isabel Campos, da Reportagem Local


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