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OPINIÃO ECONÔMICA
Reclamos de um Estado celeiro
JOSÉ DOMINGOS FONTANA
Uma oscilação climática
impediu que o solo brasileiro colocasse exatamente 100 milhões de toneladas de grãos da safra 2001/2 nos pratos da balança
comercial, principalmente a externa, agora em franca convalescência. Foram apenas 98,5 milhões de toneladas. O pequeno
Paraná entregou 25 milhões de
toneladas, a maior parcela (como
sempre) entre todas as unidades
da federação. É campeão histórico em milho, feijão, mandioca e
batata. Agora, vice em soja (atrás
de Mato Grosso) e em outras tantas agrocommodities. A laranja
de Paranavaí caiu nas graças dos
europeus, pois não tem impressão
digital de criança sem escola. O
cadinho étnico ítalo-teuto-nipo-ucraíno-luso-polaco mais as minorias árabe-judaica e crioula
(conte mais do negro paranaense,
professora Márcia Graf!) plantam
e colhem adoidados. Influem e
muito na Ceagesp paulista, estômago do Brasil. O porto de Paranaguá abarrota-se de grãos. Invisíveis, 180 mil pequenos agricultores catalogados pensam na retórica a desfiar ante cada gerente do
Banco do Brasil e, mais ainda, no
que podem ouvir de animador
dos quatro candidatos a presidente da República. E, se pudessem "unissonizar" as vozes, certamente diriam o que vem a seguir,
pois o que é bom para o Paraná
bom é também para o resto do
país.
O Pronaf (Programa Nacional
da Agricultura Familiar) anuncia 10% de seu orçamento para o
Paraná. É pouco para quem produz 25%. Até mesmo quem só
consome está indignado, por
exemplo, com os escandalosos 120
quilômetros da BR-116 que separam a bela Curitiba da fronteira
com Santa Catarina na direção
do outro celeiro, o Rio Grande do
Sul. Pista simples, remendada,
sem um único quilômetro de faixa central ou marginalmente sinalizada visível. Um inferno rodoviário nesta viagem de anoitecer chuvoso do domingo 21 de julho (que falta faz um Jimmy Hoffa tupi-guarani!). A BR-277, de
Foz do Iguaçu a Cascavel, e a
Transbrasiliana BR-153, outros
dois cacos.
Há uma fatia enorme neste país
que produz infinitamente mais
do que os banqueiros financiadores de campanhas. São os consumidores de pão, arroz e feijão, como cardápio repetitivo e obrigatório. Devem perfazer mais de
75% dos 115 milhões de eleitores
anunciados pelo IBGE. A maioria
deles (e talvez até os quatro postulantes) não sabe que o Paraná
produziu 57% dos 3,8 milhões de
toneladas de trigo da última colheita e, de quebra, 20% (605 mil
toneladas) também de todo o feijão trissafra (a Bahia tem de se
contentar disputando o vice!). A
gauchada faria rir meia Ásia: colhe metade dos 11 milhões de toneladas de arroz. Mas o país historicamente importa o dobro do
trigo que aqui produz! Muita gente explica (momento de solidariedade à Argentina; melhor o grão
canadense do que seu Bombardier), mas protelar "ad aeternum" a auto-suficiência em pão
convence?
Os candidatos em visita ao Sul
têm duas escolhas: dar aulas preferenciais aos agricultores, didaticamente dividindo-as em capítulos de financiamento de plantio/
safra e de economês regente do
vai-e-vem dos preços mínimos.
Groxko, um metódico agrônomo,
espanta-se com os R$ 35 por tonelada de raiz de mandioca. Esperavam-se R$ 50. Há feculeiro garantindo "no fio do bigode e no
rabisco da Bic" R$ 70 futuros, senão o negócio paranaense de 4
milhões de toneladas ao ano fecha. No Paraná é assim: mandioca, com capital nacional, vira mel
no Noroeste e compete com o mel
de milho que uma multinacional
faz no Sul. Sol, espaço e lucro para
todos. Terra de todas as gentes,
tem muito a ensinar aos candidatos, enquanto alimenta eleitores
da maioria dos outros Estados.
Em termos de agricultura, o que o
paranaense reclama, o gaúcho reforça e o catarinense aplaude.
Nem precisam de fitoviagras da
marca "farm bill". O Iapar tem de
estar ao lado da Embrapa, não
atrás.
Ah! A outra escolha dos candidatos por aqui seria comprimir
um pouco o palanque disputado
pelos papagaios de pirata e chamar para o lugar deles esses formidáveis gerentes de cooperativas agropecuárias. Sabem muito
bem como sugerir lucros menores
para a Petrobras (combustível) e
para o Banco do Brasil (juros), como desenhar mecânicas de seguro
agrícola com prêmios em espécie,
ou seja, sacaria cheia e balança
em vez de chequeira, e ainda declamar vantagens do trator (made in Brazil) de modelo chinês, de
baixa potência, mas, mesmo assim, com boa eficiência em favor
do pequeno agricultor. Sobretudo, como ensina uma microneo-empresa de nutracêuticos em Rolândia (PR), é melhor extrair e comercializar isoflavonas de germe
ou broto de soja para fitoterapia
de reposição hormonal do que
simplesmente despejar todos os
grãos ou mesmo toda torta de soja nos navios de Paranaguá para
engordar crias alheias e alhures.
Senhores candidatos: conjuguem, por favor, o verbo "agroindustrializar". O eleitorado, faminto, está esperando. De sobremesa, contem como vão "amansar" o MST ao mesmo tempo em
que vão ordenar a cobrança de
impostos decentemente compatíveis de alguns latifundiários continentalistas desta nação. Como
licor de campanha, comentem,
por favor, se vamos subir ao terceiro posto do pódio das colheitas
transgênicas, logo atrás dos americanos e dos argentinos.
José Domingos Fontana é professor titular na Bioquímica e visitante na Farmácia-UFPR, 11º Prêmio PR em C&T (1996) e
pesquisador 1A do CNPq.
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