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São Paulo, terça-feira, 12 de agosto de 2003

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OPINIÃO ECONÔMICA

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BENJAMIN STEINBRUCH

A questão do déficit público tem sido amplamente discutida em toda parte. Em princípio, ninguém é a favor de déficits. As divergências começam quando se discutem as formas para alcançar o equilíbrio das contas.
Nos Estados Unidos, por exemplo, os republicanos abominam os déficits tanto quanto os democratas. Os republicanos defendem o combate ao déficit por meio do corte de gastos, de forma que seja possível até reduzir impostos. Os democratas, em geral, preferem o aumento de impostos.
George W. Bush tem adotado a receita republicana, pelo menos na parte da redução de impostos. No início do governo, como prometera na campanha eleitoral, ele sustentou que havia dinheiro para tudo e promoveu um corte radical no Imposto de Renda, pelo qual as famílias pagariam em média US$ 2.500 a menos por ano.
A lógica republicana diz que, com mais dinheiro no bolso, os consumidores fazem mais compras. Isso estimula a economia, e, na sequência, o governo recupera os impostos perdidos, em razão do aumento da produção e das vendas.
Quando Bush pôs em prática seu plano de corte de impostos, em 2001, os democratas o contestaram. Disseram que a redução do Imposto de Renda beneficiaria muito mais fortemente os ricos, que não aumentariam seu nível de consumo porque já consomem tudo o que precisam.
O fato de que as famílias teriam em média US$ 2.500 a mais por ano não significaria que todos esses recursos iriam efetivamente para o consumo. Ou seja, seria errado raciocinar em termos de média. O economista Paul Krugman, em artigo no "New York Times", fez uma piadinha com isso. Disse que, quando Bill Gates entra num restaurante, a renda média dos fregueses dispara, mas isso não os torna todos milionários.
Piadas à parte, o fato é que, aqui no Brasil, o corte de impostos raramente entra em cogitação, a não ser em casos específicos e sob fortes pressões. Na semana passada, o governo concordou com um corte de três pontos percentuais no IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) dos automóveis.
Redução temporária de IPI para estimular consumo é uma fórmula já usada algumas vezes em anos anteriores, sempre com objetivo específico de reativar vendas de carros nas faixas populares. Desta vez, porém, o acordo verbal entre governo e montadoras incluiu cláusulas novas. A primeira é a manutenção do número de empregos em cerca de 520 mil nas montadoras, concessionárias e autopeças. E a segunda é a que prevê o rompimento do acordo se ao fim do primeiro bimestre de sua vigência houver queda de arrecadação no IPI dos automóveis.
O governo, portanto, não deu um presente às montadoras, porque a manutenção do acordo dependerá de seu sucesso. Pelos cálculos do Ministério da Fazenda, durante o período de vigência, até novembro, o governo abrirá mão de receitas de R$ 342 milhões. Mas esse valor terá de ser compensado pelo crescimento das vendas de automóveis, o que só poderá ser conseguido se as montadoras fizerem a sua parte e reduzirem os preços dos carros.
Na teoria, portanto, o acordo é bom para todos os lados. O governo não perde receita, os trabalhadores não perdem postos de trabalho e as empresas ganham vendas. E, se ninguém perde nada, por que não estender o esquema para outros setores igualmente afetados pela queda de vendas? Essa pergunta instigou um sentimento de "também quero" na indústria. O setor de máquinas, que recolhe IPI de 5% a 35%, também quer. O mesmo ocorre com alguns setores de eletroeletrônicos, materiais de construção e vários outros. Só não dá para pensar em reduzir IPI de bebidas e cigarros, porque incentivar o consumo desses itens seria "politicamente incorreto".
De fato, acordos setoriais podem ser medidas de emergência para a economia estagnada. A redução da alíquota do IPI e de outros impostos pode funcionar como estimulante temporário enquanto não se aplica uma política de longo prazo, com redução geral da carga tributária, oferta de crédito a custos moderados e investimentos públicos.


Benjamin Steinbruch, 50, empresário, é presidente do conselho de administração da Companhia Siderúrgica Nacional.

E-mail - bvictoria@psi.com.br


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