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OPINIÃO ECONÔMICA
O Banco Central e os juros
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Na próxima reunião do Copom a diretoria do Banco
Central vai começar a lidar com a
questão do crescimento econômico. A partir de sua decisão e de
outras que serão tomadas ao longo do tempo que resta deste primeiro ano do governo Lula, poderemos avaliar até onde vai o real
compromisso de nosso presidente
com a recuperação da atividade
econômica em 2004. A intensidade das próximas reduções dos juros nominais, que certamente vão
ocorrer ao longo dos próximos
meses, nos dará uma boa medida
do nível da taxa real -esta, sim,
a variável mais importante para
definir a velocidade da recuperação procurada pelo governo-
com que o Banco Central vai trabalhar nos próximos meses.
Os diretores de nossa autoridade monetária têm procurado, em
contatos com economistas da
academia e do mercado financeiro, definir alguns critérios para
encontrar uma resposta para essa
questão. Os conselhos de cautela e
conservadorismo que dominam
esses encontros são os mesmos
que foram dados em situações semelhantes à que vivemos hoje:
"Cuidado com a queda acentuada de juros, pois ela pode destruir,
em pouco tempo, o instável equilíbrio externo que foi conseguido
nos últimos meses".
Juros reais baixos podem criar
uma bolha de consumo na economia, via crédito mais barato, reduzindo rapidamente o saldo comercial e recolocando nossa conta corrente externa em uma trajetória de déficit. Nessa situação,
juros internos mais baixos podem
levar os investidores estrangeiros
e os bancos brasileiros a reduzir
suas aplicações em dólar no país.
Com isso, teríamos uma depreciação do real e uma elevação da inflação, obrigando o BC a elevar
novamente os juros internos, interrompendo a retomada do crescimento da economia. O que já
chamei nesta coluna de "o círculo
do diabo"!
Esse cuidado com a redução de
juros é defendido, também, por
aqueles que entendem que a economia brasileira, por alguma razão desconhecida de nossos economistas, acostumou-se a juros
reais elevados, da ordem de 12%
ao ano. Por causa desse mito, toda vez que os agentes econômicos
se convencem de que o Banco
Central vai trabalhar com números mais civilizados -da ordem
de 6% ao ano- inicia-se um movimento especulativo com ativos
financeiros, commodities e bens.
Esse comportamento acaba por
criar "o círculo do diabo" descrito
acima, reforçando ainda mais a
força desse mito dos juros reais altos.
Precisamos superar esse medo
desconhecido para podermos andar adiante, e creio que este seja o
momento correto para iniciarmos
essa tentativa. Para não parecer
apenas voluntarismo de minha
parte, é necessário que analisemos de forma mais racional a
constatação histórica de que juros
reais menores nos levarão sempre
a um desastre conjuntural. Proponho que façamos essa reflexão
em nível estrutural e olhando,
também, para a situação conjuntural em que vivemos hoje.
Defendo a tese de que essa verdadeira assombração, que nós,
economistas, criamos em relação
aos juros reais no Brasil, tem a ver
com problemas que não mais
existem ou, pelo menos, que existem hoje em escala bem menor do
que no passado. O primeiro deles
é a estabilidade dos superávits
primários acima de 3% ao ano
que ocorre desde 1999. Depois de
um período de absoluta irresponsabilidade fiscal na década de 80
e da primeira parte dos anos 90
do século passado, faz quase dez
anos que temos equilíbrio ou superávit nas contas públicas antes
do pagamento de juros.
O Orçamento para 2004 mais o
compromisso do governo Lula
-hoje com grande credibilidade
nos agentes econômicos- de
manter essa situação ao longo de
seu governo garantem essa condição para o futuro imediato. Essa
nova realidade é o ponto mais sólido na argumentação daqueles
que, como eu, defendem que já
podemos buscar juros reais mais
baixos.
Outro ponto importante a ser
considerado é que vivemos hoje
um momento em que a presença
de capitais especulativos em nossa economia é bastante reduzida.
Os juros internos nos contratos
dolarizados são negativos, ou
muito baixos, nas operações acima de seis meses. Com isso, os recursos de curto prazo que entraram em nosso mercado a partir
do fim do ano passado já foram
embora ou estão sendo repatriados de forma continuada. Nada
parecido com o que ocorreu nos
anos FHC.
Finalmente, a redução do poder
aquisitivo dos brasileiros e os níveis atuais do desemprego garantem que nenhuma onda explosiva de consumo vá ocorrer ao longo dos próximos meses.
Mesmo sabendo que o espaço
para crescermos ainda está limitado pelas restrições criadas pela
baixa relação entre nossas reservas externas e a dívida em moeda
forte, não podemos, mais uma
vez, jogar fora a oportunidade de
colocar nossa economia em movimento. Com a palavra, o ministro
Palocci e sua equipe econômica!
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 60,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e
ministro das Comunicações (governo
FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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