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ONGs atacam acordo sobre remédios
DO ENVIADO ESPECIAL A CANCÚN
O único acordo até agora obtido nas negociações da OMC para
a Conferência Ministerial de Cancún entrou ontem na alça de mira
das ONGs (organizações não-governamentais).
Um grupo de dez jovens, moças
e rapazes, invadiu o Centro de
Convenções gritando "medications for all nations" (cântico que
rima em inglês e, em português,
quer dizer "medicamentos para
todas as nações"), em alusão ao
acordo que, segundo os manifestantes, emperra a importação de
remédios genéricos pelos países
pobres que enfrentem crises de
saúde pública.
Nos preparativos para o encontro de Cancún, o Brasil aceitou o
acordo que estabelece condições
para que países pobres, incapazes
de produzir genéricos, importem
esse tipo de medicamento (mais
barato do que remédios patenteados). Reduziu-se, com o acordo, o
alcance do entendimento alcançado na conferência ministerial
anterior, em 2001, a respeito do
assunto.
Os manifestantes usavam fitas
adesivas vermelhas no rosto, exatamente para simbolizar a principal crítica ao acordo: ele estabelece procedimentos burocráticos
que dificultarão ou impossibilitarão o acesso de países pobres aos
genéricos (fita adesiva vermelha
é, em inglês, "red tape", expressão
que também designa entraves burocráticos).
Os manifestantes pertenciam ao
Projeto Acesso Global à Saúde,
cuja porta-voz, Sharonann Lynch,
diz que "o acordo prioriza o interesse pelo lucro dos grandes laboratórios e compromete o acesso a
medicamentos".
Menos radical, a ONG "Médicos
sem Fronteiras" também atacou o
acordo ontem, com argumento
parecido: "Suas complexas regras
podem, na prática, atrapalhar o
acesso a medicamentos", diz
Ellen Hoen, da Campanha para
Acesso a Medicamentos Essenciais.
A maior inquietação da ONG
não é com a OMC, mas com a Alca (Área de Livre Comércio das
Américas), que terá sua própria
reunião ministerial em novembro, em Miami.
No âmbito da Alca e no capítulo
relativo aos direitos de propriedade intelectual, "os Estados Unidos
pressionam para aumentar a proteção da propriedade intelectual
sobre produtos farmacêuticos
que estão em mãos da indústria
farmacêutica inovadora, assim
como para reduzir o direito dos
países da zona de tomar as medidas necessárias para proteger a
saúde pública", diz documento
divulgado pela ONG.
A entidade diz que os EUA, na
prática, querem impor, na Alca,
critérios que vão além do que estabelecem acordos da OMC que já
são questionados pelas ONGs do
setor de saúde.
A recomendação da ONG é para
que os países pobres testem na
prática o novo acordo sobre acesso a medicamentos, para ver até
que ponto ele de fato atrapalha.
A ONG tem casos de sucesso a
contar para justificar a importação de genéricos. Na República de
Camarões, por exemplo, a central
nacional de compras está pagando US$ 277 por pessoa por ano
para o tratamento completo de
primeira linha em pacientes soropositivos, "um dos preços mais
baixos disponíveis no mercado
internacional".
(CR)
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