São Paulo, segunda-feira, 13 de janeiro de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

OPINIÃO ECONÔMICA

Assentamentos: a pré reforma agrária

RUBENS TELLECHEA CLAUSELL

Na constituição deste novo governo federal, toma grande importância o prévio entendimento e troca de informações do ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto, com seu colega da Agricultura, o ministro Roberto Rodrigues, de grande vivência em vida rural e em organizações de cooperativas. O território brasileiro tem condições diversas para a implantação de moderna reforma agrária. Muitos detalhes deverão ser discutidos para assegurar sucesso a essa demanda de populações e de técnicos. O sucesso para cada região deverá ser estudado, mas nem sempre poderá ser transferido para outras localizações.
O Nordeste, onde muitos operários rurais estão reunidos à espera de assentamentos, tem condições muito diversas das do Sul -especialmente das do Rio Grande do Sul e das de Santa Catarina, onde são no geral favoráveis a organizações comunitárias, em grande parte pela origem européia de sua população. Diferem das dos Estados nordestinos, onde os grandes problemas são as secas e os "minifúndios". Essa é a razão primeira da baixíssima produtividade coletiva. Diferem também das do Brasil central, onde grandes áreas dos cerrados foram previamente estudadas por comissão técnica da "Aliança para o Progresso" -cooperação com os Estados Unidos, gerando informações para agrônomos, veterinários e engenheiros se iniciarem na agricultura e na pecuária, corrigindo os solos, fertilizando-os e permitindo maior produtividade.
Nossa agricultura, em seu conjunto, necessita de reforma agrária tecnológica, em muitos de seus aspectos: conservação dos solos, fertilizantes, melhores sementes, equipamento, formação e manutenção de pastagens, manejo dos rebanhos e processamento dos produtos, entre outros. Já somos grandes produtores mundiais de soja, açúcar, álcool e frangos. Dispomos de condições favoráveis de solos e climas para liderar na produção de carnes, algodão, frutas tropicais e equatoriais, cacau, celulose e madeiras florestais e óleos vegetais -que, tratados, serão carburantes econômicos para automóveis, caminhões e tratores, dispensando importações complementares de petróleo.
É para esse futuro que nos devemos preparar, organizando populações e técnicos em terras conservacionadas, corrigidas e fertilizadas, elevando a produtividade e o valor da produção. Organizações agropecuárias em cooperativas poderão, dentro da reforma agrária, dar nova vivência a pelo menos 10 milhões de famílias, com vida bem nutrida, saudável e digna. Estaremos cooperando com outros países, que lutam com as mesmas deficiências.
Essa é a grande possibilidade e a esperança com que recebemos o novo governo federal: a nova era em nossa agropecuária. As terras agriculturáveis de que dispomos -de imediato cerca de 50 milhões de hectares-, com técnicos engenheiros, agrônomos, veterinários e administradores, com tecnologia e a experiência do já realizado e hoje em melhoria nas nossas universidades. Esse quadro nos faz antever o potencial de produção das populações vacantes e em dificuldades, que aguardam por essa revolução tecnológica. Mas devemos convir que não será com a distribuição primária de terras, escrituradas na posse para assentamentos, que faremos o que o Brasil necessita para cooperar no combate à fome na economia mundial.
Será tarefa inicial para o ministro Rossetto dar estrutura a esse contingente de sem-terra para que, no sistema cooperativo, sejam tecnicamente assentados, dentro de prévio planejamento, em instalações financiadas por nossos bancos e também por organizações internacionais. Devemos construir com esse mesmo contingente, devidamente treinado e assistido, as planejadas agrovilas rurais, com todas as suas instalações básicas: eletricidade, saneamento, irrigação, agricultura de manutenção, equipamentos mecânicos para a conservação dos solos, suprimento básico de criatórios animais e beneficiamento da produção. Organizadas em cooperativas, com pessoal treinado para a administração rural e a vida associativa. Chegaremos à alta produtividade suficientes na alimentação e complementação da vida coletiva. Terrenos e residências na agrovila terão propriedade familiar, com escritura para pagamento em até 30 anos, com cinco de carência inicial. Todo o trabalho deverá ser remunerado pela organização cooperativa, estabelecendo reserva para eventualidades.
A organização jurídica desses assentamentos, dentro de uma reforma sociotecnológica, com instalações de saúde, estudo fundamental, centro ecumênico, vida social e transporte coletivo, racionalmente administrada, garantirá seu trabalho e rentabilidade. Serão necessários alguns meses de treinamento coletivo, para que se iniciem suas construções administrativas e residenciais, depósitos ou silos para a estocagem da produção e sua comercialização. Na área coletiva será estabelecida a reserva legal de 25%, na qual se incluirá a indispensável reserva de água.
Creio que é esse, em linhas gerais, o caminho para a reforma agrária, apolítica e sem atritos, com a agropecuária já implantada e suas cooperativas, complementando o progresso desta grande nação.O ministro Rossetto terá realizado sua grande tarefa de reforma agrária moderna e pacífica e de alta produtividade que todo o Brasil almeja.


Rubens Tellechea Clausell é engenheiro agrônomo zootecnista.
E-mail: rtellechea@terra.com.br


Texto Anterior: Comércio: Lojas abrem em SP, e sindicato quer entrar na Justiça contra a prefeita
Próximo Texto: Energia: Opep vai aumentar produção de petróleo em 1,5 milhão de barris
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.