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CONJUNTURA
Ministro admite dificuldades, mas afirma que política econômica tem rumo e não pode mudar todo dia
Para Malan, crise deve ser vista com frieza
VALDO CRUZ
Diretor-executivo da Sucursal de Brasília
VIVALDO DE SOUSA
da Sucursal de Brasília
Ao analisar ontem o agravamento da crise asiática, o ministro Pedro Malan (Fazenda) disse que o
momento é "cheio de incertezas".
Segundo ele, essa situação deve ser
analisada com frieza e serenidade.
"Não podemos mudar a política
(econômica) todo dia", afirmou.
Malan disse que a crise pode ser
explicada pelos seguintes fatores:
1) possibilidade de forte queda na
Bolsa de Nova York; 2) dificuldades do Japão; 3) desvalorização do
iene (moeda japonesa) em relação
ao dólar; e 4) efeitos da crise em
toda a Ásia, incluindo a China.
Apesar disso, o ministro vê pelo
menos dois pontos positivos: os
juros não deverão subir nos EUA e
os países latino-americanos podem ser beneficiados com maior
volume de recursos estrangeiros.
A seguir, trechos da entrevista
concedida à Folha.
Folha - Como o senhor vê a crise
na Ásia, agravada pelo anúncio de
recessão no Japão?
Pedro Malan - São três conjuntos de problemas. O primeiro diz
respeito à situação de dificuldade
pela qual passaram, estão passando e continuarão passando por algum tempo as três economias que
necessitaram de pacote de assistência financeira: Indonésia, Coréia e Tailândia. As três terão taxa
de crescimento do PIB fortemente
negativa neste ano -algo já esperado. O segundo se refere ao Japão.
Não sabemos como vai reagir a segunda economia do mundo.
O Japão está estagnado desde o
início desta década. Agora, temos
essa queda, nos dois últimos trimestres. Eles têm problemas sérios ainda não resolvidos no seu
sistema financeiro. Há uma estimativa oficial de débitos que não
estão sendo pagos de pelo menos
US$ 700 bilhões. Eles não conseguiram ainda uma forma de reativar a economia, mesmo estando
com uma taxa de juros anuais de
0,5%. O terceiro problema são as
incertezas sobre a depreciação do
iene em relação ao dólar.
Isso está começando a gerar inquietações nas outras economias
asiáticas que competem com o Japão. Há uma grande inquietação
na China e em Hong Kong. Até
agora, a China tem o compromisso público e reiterado de não desvalorizar o yuan. Se o fizer, aquilo
é um problema, levará a uma nova
rodada de desvalorizações com todos os efeitos sobre os fluxos de
comércio na região.
Folha - Temos outras incertezas?
Malan - Tem a situação da Rússia. Uma economia de certo peso
que está passando por dificuldades institucionais e fiscais. E, por
último, embora não menos importante, continua pairando no ar
aquela famosa advertência feita
pelo presidente do Federal Reserve, Alan Greenspan, sobre a exuberância irracional dos preços dos
ativos na Bolsa de Nova York. Mas
isso faz parte do mundo em que
vivemos. Esses sustos estarão conosco por um tempo. Eu gostaria
de dizer que a chave aqui está no
Japão.
Folha - O sr. não teme um reflexo
da crise japonesa na economia
norte-americana?
Malan - O Japão afeta na medida em que é um mercado importante para as exportações norte-americanas. Mas tem um outro
efeito também. Nesse contexto,
muitos analistas acham que o Federal Reserve não vai elevar os juros.
Folha - O agravamento da crise
pode prejudicar a captação de recursos externos por parte do país?
Malan - Eu acho que não vai
afetar a captação de recursos diretos, que chegaram a US$ 17 bilhões
no ano passado e deve ser um valor equivalente neste ano. Dos US$
17 bilhões do ano passado, US$ 5
bilhões e pouco foram de privatizações. O restante foi de decisões
de investimento de médio e longo
prazos. Essa situação asiática pode
até ter um efeito positivo para a
América Latina. É uma região que
tem vantagens: não tem testes nucleares, não tem conflitos de fronteiras, não tem conflitos étnicos. É
uma região com democracias consolidadas ou em processo de consolidação. É possível que a região
da América Latina seja vista como
uma região de interesse do ponto
de vista de quem está tomando decisões de investimento no médio e
longo prazos. Outra coisa são os
demais fluxos de capital. E eu acho
que há espaço para crescimento
aqui no Brasil. Investimento em
Bolsas e de seguros.
Folha - O sr. não teme uma desvalorização da moeda chinesa ou
uma alta dos juros nos EUA?
Malan - Eu acho que as preocupações que eu teria estão nesses
cenários, que poderiam se materializar de forma negativa. Mas
nós já vivemos situações como essas no passado. Não existe algo
inusitado que o mundo não tenha
experimentado antes. Isso faz parte do mundo em que nós vivemos.
E que é mais perigoso em certo
sentido por conta da quase instantaneidade em que as pessoas têm
as informações e as transações financeiras podem ser feitas.
Folha - O sr. está tranquilo?
Malan - Eu não quis dizer que a
crise não preocupa. Eu acho que é
preciso vê-la com relativa serenidade. Seria irresponsável da minha parte falar que está tudo tranquilo. Mesmo porque eu tracei
aqui um quadro cheio de incertezas. As coisas podem caminhar em
várias direções. Eu só digo que é
preciso encarar o momento com
frieza, com serenidade. Não nos
pautamos pela notícia do
dia-a-dia. Não achamos que tenhamos de mudar a política todo
dia. Achamos que a política econômica tem um rumo.
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