São Paulo, sexta-feira, 13 de julho de 2007

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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

Ainda a questão dos salários


O crescimento do emprego vem ocorrendo nos setores de menor qualificação e, por isso, de menores salários


O LEITOR da Folha já conhece minha opinião sobre o incrível processo de mudanças que vivemos na economia brasileira. Ele ocorre em razão de uma alteração de longo prazo nos preços relativos de uma ampla cesta de commodities em relação aos produtos industriais. A partir do real forte e do interesse amplo dos investidores internacionais pelo nosso país uma série de pequenas revoluções microeconômicas vêm ocorrendo, criando condições para um crescimento da demanda interna em ritmo pelo menos duas vezes maior do que o verificado nas últimas décadas.
Mas não é apenas a velocidade maior de crescimento que chama a atenção. Pela primeira vez os agentes econômicos estão acreditando em certa perenidade nesse novo ciclo. Nada parecido com os períodos de "stop and go" -aqui chamado de "vôo da galinha"- do passado mais recente. São claros os sinais dessa nova fase no comportamento de empresários e investidores. Marina Helena Santos, economista da Quest, desenvolveu um gráfico, associando horas trabalhadas por empregado e ocupação na indústria que mostra, de forma clara, redução nas horas extras e aumento da contratação de novos funcionários.
Esse movimento é um excelente indicador de confiança do empregador na manutenção, por prazo longo, do nível de suas atividades. Não por outra razão vivemos uma aceleração da contratação no setor industrial que veio atrasada em relação a outros setores com maior grau de informalidade. Mas outros dados mostram uma dinâmica menos eufórica da economia -e da sociedade- em prazos mais longos e com uma visão menos demagógica do que a do governo Lula e seu ministro do Trabalho.
O crescimento do emprego vem ocorrendo nos segmentos de menor qualificação e, por isso mesmo, de menores salários, comportamento, aliás confirmado pelo pesquisador do Ipea Ricardo Paes de Barros em recente entrevista ao jornal "O Estado de S. Paulo". Os dados de emprego em São Paulo disponibilizados pela Fiesp também confirmam essa tendência. Quase três quartos dos novos empregos criados em 2007 estão no setor de açúcar e álcool. E, com o desenvolvimento do mercado mundial dos chamados biocombustíveis -no qual seremos um dos grandes fornecedores-, esse processo de precarização de emprego pela valorização de nossa moeda vai se acelerar ainda mais.
No quadro ao lado fica nítida a dimensão desse fenômeno. Ele está associado ao crescimento das exportações brasileiras de produtos primários, nesse novo quadro de preços relativos, e se realiza via o real valorizado. Essa é uma tendência de longo prazo e que precisa ser debatida pela sociedade de forma madura, e não com lugares comuns do tipo "é bom porque reduz a desigualdade" ou ""são desígnios de Deus via o que os economistas chamam de vantagens comparativas de cada país" ou, finalmente, com medidas voluntaristas para desvalorizar o real e reavivar os setores em crise.


LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS , 64, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).

lcmb2 terra.com.br


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