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São Paulo, quarta-feira, 13 de agosto de 2003

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OPINIÃO ECONÔMICA

Basta vontade política para o vôo solo da Varig

GRAZIELLA BAGGIO

O processo de desregulamentação do transporte aéreo, implementado a partir do início da década de 90, pode ser apontado como o maior responsável pela situação pré-falimentar de nossas principais empresas aéreas. Das quatro maiores companhias de então, a Transbrasil quebrou e, se nada for feito, a Varig, a TAM e a Vasp trilharão o mesmo caminho.
Não é por outra razão que o Comitê Técnico de Políticas Públicas, instituído pelo governo em abril, propõe a revisão do atual marco regulatório. O relatório final do comitê, entre outras propostas, incluiu o controle do excesso de oferta. Caso essa medida seja implementada, será possível retomar o crescimento sustentado do transporte aéreo brasileiro e gerar superávits suficientes para fazer frente ao pesado endividamento vigente. Essa meta, no entanto, está condicionada à negociação do alongamento do perfil da dívida que está asfixiando as empresas aéreas brasileiras. O caso da Varig é um bom exemplo para confirmar essa tese.
Em junho de 2002, a oferta do Grupo Varig apresentava um aproveitamento médio de 58% da capacidade de suas aeronaves. Havia, portanto, uma clara necessidade de redução da oferta de assentos. Passados 12 meses, em junho de 2003, a oferta foi reduzida em 30%. A demanda, contudo, devido ao quadro recessivo observado na economia brasileira, foi reduzida em 26,6%. Assim, apesar da melhora verificada na ocupação de suas aeronaves (61%), esta não foi suficiente para que a empresa atingisse o ponto de equilíbrio.
Apesar do desequilíbrio, a partir de maio deste ano a Varig passou a operar com resultado positivo de aproximadamente US$ 4 milhões. Esse lucro operacional pode aumentar com a perspectiva de redução da taxa de juros no segundo semestre. Com a manutenção da oferta da Varig no mercado doméstico nos níveis atuais e a demanda recuperando o patamar do ano passado, a empresa passaria a operar com um aproveitamento de 83% de sua capacidade, índice mais que suficiente para viabilizar o vôo solo da empresa.
Em maio, a receita unitária da empresa foi de US$ 0,0677. Na hipótese de esse valor ter permanecido constante em junho e multiplicando-o pelo total de passageiros/km transportados nos mercados doméstico e internacional relativos a junho de 2002 (2.405.951), chegamos a uma receita líquida de vôo de US$ 162,9 milhões. Subtraindo-se o total de custos/despesas referente a maio/2003, mantido constante para junho (US$ 148,6 milhões), o resultado é um "superávit" de US$ 14,3 milhões, que, projetado para 12 meses, gera um total positivo de US$ 171,6 milhões.
Com base nesse resultado, a Varig poderia enfrentar a sua dívida, estimada em torno de US$ 1,2 bilhão. Com uma taxa de juros de 8% ao ano (em US$) e amortização de US$ 150 milhões anuais, no prazo de 13 anos a dívida estaria totalmente quitada e ainda sobrariam US$ 22 milhões ao ano para investimentos da empresa.
Os sindicatos dos aeronautas e aeroviários encaminharam ao governo federal uma proposta alternativa à fusão que garante a sobrevivência financeira e operacional das companhias aéreas, mantém a concorrência no setor e preserva milhares de empregos. A base dessa proposta é o alongamento do perfil da dívida pública da Varig, com três anos de carência e 15 anos de prazo para a amortização, e a negociação de deságios com seus principais credores privados. Essa é uma alternativa viável para a empresa retomar a sua trajetória de crescimento e fortalecer o conjunto da aviação civil brasileira.
A proposta de fusão entre a Varig e a TAM, pelo contrário, é a certeza de concentração do mercado doméstico, graves prejuízos para a competição no setor aéreo e milhares de demissões de trabalhadores. A fusão também exigirá que o BNDES faça pesados desembolsos para socorrer empresas privadas. Portanto a Varig apresenta todas as condições necessárias para prosseguir em vôo solo. Basta haver vontade política do governo Lula.


Graziella Baggio, 46, comissária de vôo, é presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas.

Hoje, excepcionalmente, a coluna de Antonio Barros de Castro não é publicada.


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