São Paulo, quarta-feira, 13 de outubro de 2004

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LUÍS NASSIF

A perpetuação do erro

Pouca atenção se tem dado à questão dos indicadores no país. Há escassez, é certo. E só a escassez de indicadores para permitir esse fenômeno, de os eleitores paulistanos aprovarem as gestões de Marta Suplicy na prefeitura, de Geraldo Alckmin no governo do Estado e de Lula na Presidência.
À falta de indicadores (ou de divulgação deles), fica-se em uma leitura exclusiva das obras físicas das respectivas gestões. No máximo, agrega-se a gestão fiscal, mas fica por aí.
Qual a relação custo-benefício dos gastos das administrações? Como o dinheiro é finito, qual a maneira de avaliar as escolhas orçamentárias, para saber se as despesas acertadas eram prioritárias?
Nesse campo dos indicadores, nenhum afeta e afetou mais a vida nacional nas últimas quatro décadas do que os índices de inflação. Por servirem de parâmetro para o custo do dinheiro, para as definições do mercado, erros metodológicos se perpetuaram sem que nada fosse feito.
Nos anos de inflação brava, por exemplo, os índices ao consumidor captavam os preços nas vitrines das lojas -no tempo das três ou quatro prestações "sem juros", um produto que custasse R$ 1.000,00, com uma inflação de 10% ao mês, era vendido por R$ 2.147,00 ou em quatro pagamentos de R$ 537,00. Obviamente os juros estavam embutidos no "preço à vista". Se a inflação subisse para 15% ao mês, o preço à vista saltaria para R$ 2.218,00, meramente para acompanhar o novo custo financeiro da inflação. Ou seja, seu impacto sobre a inflação seria zero. Mas a metodologia adotada considerava o diferencial de preço à vista como sendo reajuste.
Outro problema metodológico sério é com o Índice de Preços no Atacado (IPA), da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro. O IPA tem peso de 60% no IGP (o Índice Geral de Preços) e no IGP-M (o IGP do mercado). É calculado simplesmente anotando-se o preço de tabela fornecido pelas empresas. Em momentos de choque de custos (como nas oscilações cambiais), as empresas tendem a reforçar os reajustes de tabela, para depois negociarem com os clientes. Ora, o que vale é o preço final fechado. Mas o índice não capta, criando um aumento artificial nos índices de inflação, com impactos sobre a dívida pública, os juros pagos e os contratos em geral na economia.
Há um velho ditado que diz que, a médio prazo, os índices convergem. Se se tomar de janeiro de 2001 a setembro de 2004, enquanto o IGP-M apresentou variação de 63,6%, o IPA aumentou 78,4%, contra 37,6% do IPC (Índice de Preços ao Consumidor) e 50,63% do INCC (Índice Nacional da Construção Civil).
Nos sete semestres de janeiro de 2001 a junho de 2004, o IPA registrou só uma deflação, contra seis do IPC e três do INCC. Em quatro deles, foi o índice que mais cresceu; em dois, foi o segundo em crescimento, e, em apenas um, foi o terceiro.
No entanto segue intocável, ajudando a irrigar os juros.

E-mail - Luisnassif@uol.com.br


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