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DIAGNÓSTICO & RECEITA
Abuso de poder
OSIRIS LOPES FILHO
Tem ocorrido, em volume
progressivo, a erosão da ordem
jurídica no país. A ineficácia
da norma jurídica sempre foi
tradicional. Aqui, há historicamente leis que pegam e outras
que não colam.
O mais grave atualmente é
que os atentados à lei, os abusos de direito, a vulneração à
dignidade da pessoa humana e
à cidadania, estão sendo praticados pelos que têm o dever de
zelar pelo cumprimento da lei:
os agentes públicos.
O jornalista Janio de Freitas,
na sua coluna de quarta-feira,
aborda um caso emblemático.
Denuncia a arbitrariedade e a
prepotência da Polícia Federal
e da Aeronáutica, praticadas
em relação a passageiros chegados de viagens internacionais, no aeroporto do Galeão,
no Rio de Janeiro.
Depois de liberados pela Alfândega, e já na área externa
do aeroporto, os viajantes foram submetidos a nova revista,
pessoal e de sua bagagem, pelos
agentes das citadas organizações.
Trata-se de evidente abuso de
poder. A Polícia Federal tem
competência para "prevenir e
reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o
contrabando e o descaminho".
Todavia, ela não pode repetir a
ação dos funcionários aduaneiros. Liberados pela Alfândega, não pode a Polícia Federal,
indiscriminadamente, constranger os viajantes a serem
submetidos, em via pública, a
revista pessoal e de seus pertences.
Há um problema de prova jurídica. Enquanto o passageiro e
sua bagagem estiverem na zona primária (recintos da Alfândega, nos portos, aeroportos
e postos de fronteira), o ônus
da prova é do passageiro. É ele
que tem de provar a legalidade
dos bens trazidos do exterior e
o atendimento das normas que
disciplinam a entrada no país
da bagagem acompanhada.
Já no resto do território nacional (a zona secundária), o
encargo da prova é da autoridade. A ela cabe apresentar a
prova da ilicitude. Como exceção, apenas nos casos em que
existam evidentes indícios da
prática de crime pode a autoridade policial revistar pessoas
ou veículos na zona secundária. Fazê-lo nas imediações do
aeroporto, logo após o controle
exercido pela Alfândega, é objetivamente desprestigiar essa
instituição e desrespeitar os direitos do cidadão e agir sem base legal, em intolerável abuso
de poder.
De qualquer forma, o desacerto entre as instituições, Receita Federal e Polícia Federal,
mostra a descoordenação que
prevalece na administração federal. Usando a terminologia
do presidente FHC, trata-se de
um exemplo de administração
vagabunda.
²
Osiris de Azevedo Lopes Filho, 59, advogado, é professor de Direito Tributário da
Universidade de Brasília e ex-secretário da
Receita Federal.
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