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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Coréia do Sul faz revolução produtiva
GILSON SCHWARTZ
da Equipe de Articulistas
O presidente da Coréia do Sul,
Kim Dae-Jung, anunciou na semana passada uma verdadeira revolução produtiva no país. A julgar
pela reação dos mercados e dos investidores, a economia coreana está prestes a dar uma lição de ajuste
ao mundo.
Ao contrário do que ocorre no
Brasil, onde a mera hipótese de se
criar o Ministério da Produção deflagrou uma das mais violentas ondas de besteirol neoliberal dos últimos anos, os coreanos tratam de
enfrentar a crise com medidas voltadas para a produção.
O princípio é bastante claro: já
que é preciso fazer um ajuste, ao
menos que ele seja organizado, visando ao aumento da competitividade do país. A Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE), à qual já pertence a Coréia do Sul, elogiou na
semana passada a rapidez com que
o país está fazendo a reestruturação produtiva.
Para quem deseja conhecer as diretrizes básicas desse processo, há
uma tradução para o inglês do
"Acordo para a Reestruturação
dos Cinco Maiores Chaebol" na
página do Ministério das Finanças
e Economia da Coréia (http://
www.mofe.go.kr).
O "chaebol" é o conglomerado
ou grupo econômico coreano,
muito semelhante aos "keiretsu"
japoneses: megaempresas atuando
em vários setores, com forte poder
de alavancagem financeira (leia-se
endividamento) e amparadas em
formas variadas de conluio com o
Estado.
O próprio FMI, que empenhou
quase US$ 60 bilhões para evitar o
colapso coreano, pressionou por
uma reestruturação desses grupos
empresariais. A situação lembra
muito o pós-guerra japonês, quando as autoridades de ocupação
norte-americanas exigiram o desmonte dos "zaibatsu", os conglomerados do Japão.
Eles foram eliminados, mas no
seu lugar surgiram os "keiretsu",
novamente megaempresas fortalecidas e com grande poder de articulação com o Estado.
A situação coreana hoje é semelhante. Há o compromisso com a
abertura da economia, a privatização, a flexibilização do mercado de
trabalho. Somente o tempo dirá
até que ponto os coreanos de fato
permitirão a desnacionalização da
economia. O setor de telecomunicações, por exemplo, continua
protegido, e houve adiamento da
sua liberalização.
Na prática, o Estado criou fundos
para sanear as instituições financeiras e apoiar a reestruturação das
empresas. A prioridade é reduzir a
capacidade produtiva redundante
e forçar os "chaebol" a se concentrar em setores onde têm mais
competência.
O processo tem uma tendência a
criar grupos ainda mais poderosos, com poder de mercado ainda
maior. O próprio informe oficial
registra que mais de 20 mil pequenas e médias empresas já foram fechadas, enquanto os maiores conglomerados ainda respondem por
30% do endividamento no país.
O aspecto mais curioso do processo de reestruturação é que nada
é deixado ao sabor das forças de
mercado, tudo passa pela definição de metas e procedimentos por
meio de consultas entre empresas,
bancos e governo.
É o governo que anuncia as diretrizes e orienta a reorganização patrimonial. Em poucas palavras, no
lugar de uma "destruição criadora" que desorganiza a economia e
aprofunda a recessão, os coreanos
fazem na crise uma nova política
industrial.
No mercado global, os coreanos
provavelmente darão outras demonstrações nos próximos meses
de que uma boa política industrial
compensa. Os preços de commodities estão despencando, o que favorece os custos da produção industrial no país. E, em setores de
alta tecnologia, como a produção
de chips de memória eletrônica, os
coreanos dominam nada menos
que 35% do mercado global. Aliás,
os EUA acabam de ser derrotados
na OMC num painel sobre política
antidumping contra semicondutores coreanos.
Com reservas internacionais no
nível mais alto de sua história
(mais de US$ 50 bilhões) e recebendo volumes também recorde
de investimento estrangeiro, o tigre asiático está ressuscitando. E
não está banguela.
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