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COMUNICAÇÃO & MERCADO
As guerras do
automóvel (3)
HELCIO EMERICH
Ao contar a história da Fiat,
o jornalista norte-americano
Jonathan Mantle, autor de
``Car Wars'', o livro que vimos
comentado nesta coluna, começa mostrando que o domínio
que a empresa e a família Agnelli impuseram, desde o começo
do século, ao mercado automobilístico da Itália, teve origem
na fabricação de caminhões para o exército italiano durante a
Primeira Guerra e em algumas
vantajosas alianças fechadas
com parceiros de outros países,
entre os quais a Rússia.
Na Segunda Guerra, a empresa repetiu a dose, fornecendo
veículos e componentes para as
tropas de Mussolini. Gianni Agnelli, porém, o primeiro
``tycoon'' da Fiat, teve a chance
de viver o conflito nos dois lados: ele serviu como oficial numa divisão de tanques da Itália, no ``front'' russo e, depois
da derrocada do fascismo, se
infiltrou como conselheiro para
assuntos militares italianos
junto ao 5º Exército dos EUA,
que ocupava o país sob o comando do general Mark Clark.
Nessa função, Agnelli teria
convencido o chefe do Serviço
de Inteligência dos EUA, Allen
Dulles, de que a Itália, pela sua
posição estratégica e pelo baixo
custo da mão-de-obra dos seus
milhares de desempregados, poderia representar uma grande
oportunidade para os negócios
norte-americanos na Europa.
A partir daí a Fiat começou a
intermediar pedidos de produtos e equipamentos feitos pelos
alemães aos Aliados e a decidir
quais dessas reivindicações deveriam ou não ser atendidas.
Em troca, recebeu ajuda e proteção dos ex-inimigos, salvando, por exemplo, a pele do então vice-presidente da Fiat, o
``professore'' Vitorio Valleta, de
um julgamento como criminoso
de guerra (os ``partisans'' antifascistas italianos queriam a
cabeça de Valletta, por ter sido
um dos mais próximos colaboradores de Mussolini).
E os automóveis? Terminada
a guerra e já com o patriarca
Agnelli e seu filho falecidos, a
Fiat iniciou para valer a produção do ``Cinquecento'' ou ``Topolino'', um minúsculo automóvel com 500 c.c., criado para
ser a versão italiana do ``carro
do povo'' e que desempenhou,
na expansão da marca, o mesmo papel do Fusca na história
da Volks.
A empresa era comandada
por Valleta e pelo engenheiro
Dante Giacosa, já que o presidente e herdeiro do império, o
jovem Gianni, terceiro na dinastia dos Agnelli e um dos primeiros playboys da Europa,
preferia dividir seu tempo entre
palácios, cassinos e mulheres.
Depois de sofrer um grave acidente, o ``regente'', como Gianni era conhecido, casou-se com
uma princesa napolitana, botou a cabeça no lugar, adotou o
apelido de ``L'Avvocato'' e dedicou-se aos negócios da família.
De 1957 a 1976, a Fiat produziu 3,5 milhões de unidades do
"Nuovo Cinquecento" e a empresa tornou-se sinônimo do
milagre econômico da Itália.
O engenheiro Giacosa virou
herói nacional e em 1962, o
ex-colaborador de Mussolini,
Vitório Valleta, foi recebido na
Casa Branca, quando aconselhou o presidente Kennedy a
prestar ajuda financeira ao
Partido Socialista Italiano.
Helcio Emerich é jornalista, publicitário e
vice-presidente da agência Almap/BBDO.
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