|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
COMÉRCIO
Rodada Doha não deve sair no prazo, mas países mantêm "balé" de reuniões
OMC tenta avançar nas negociações
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A PARIS
Talvez por não ser a sua praia, o
ministro da Educação do Chile,
Sérgio Bittar, produziu ontem a
melhor avaliação do estágio em
que se encontram as negociações
comerciais globais:
"Todo mundo sabe que a data
de 2005 [para fechar a negociação] não será alcançada, mas, se
for anunciada uma nova data, a
negociação pára imediatamente",
disse Bittar à Folha ao sair da Embaixada do Brasil em Paris, na
qual participara de reunião do
G20, o grupo de países em desenvolvimento que luta para derrubar o protecionismo agrícola dos
países ricos.
Exatamente pela situação descrita por Bittar, os países-membros da OMC (Organização Mundial do Comércio) mantêm o balé
de reuniões de negociação, uma
após a outra.
Hoje, em Paris, é dia de outra
miniministerial, envolvendo cerca de 30 países.
É verdade que, para o encontro
de hoje, há uma dose algo maior
de otimismo, devido à carta divulgada na segunda-feira pela União
Européia na qual anunciou que
elimina seus subsídios à exportação de produtos agrícolas, desde
que seus parceiros na OMC também adotem a sua própria cota de
liberalização comercial -e não
só na agricultura.
Novo e bom
Mas o otimismo é matizado, por
exemplo, por Martín Redrado, o
vice-chanceler argentino e um
dos mais importantes negociadores do Mercosul:
"O que é bom [na carta da
União Européia] não é novo; o
que é novo não é bom".
O bom -a eliminação dos subsídios à exportação- estava, de
fato, previsto desde a reunião da
OMC ocorrida em Doha, na qual
foi lançada a atual rodada de negociações.
O ruim, segundo Redrado, é a
tentativa de dividir os países em
desenvolvimento, ao oferecer aos
mais pobres "uma rodada grátis"
(sem liberalização adicional), mas
cobrando abertura dos algo menos pobres.
Mesmo um otimista profissional como Robert Zoellick, negociador-chefe dos Estados Unidos,
deixa claro que as chances de conseguir cumprir os prazos da Rodada Doha são reduzidas.
"Acredito que as chances [de
atingir um acordo] sejam de algo
mais de 50%, mas ainda há uma
série de importantes temas a discutir", disse em Paris.
Mesmo a carta dos comissários
europeus Pascal Lamy (Comércio) e Franz Fischler (Agricultura)
que deu um novo ânimo à negociação trabalha com um prazo
mais extenso para Doha, ao afirmar que o documento "mostra
que estamos prontos a dar um
passo extra para assegurar que se
concluam 50% da rodada em
2004".
Ou seja, ainda que a oferta européia seja aceita por todos e que os
demais parceiros façam as concessões que os europeus pedem, a
rodada chegaria ao prazo fatal
com apenas a metade do trabalho
concluído.
Probabilidades
Quais as chances de, na reunião
de hoje, se avançar rumo ao menos os 50%?
Não parecem muitas, porque as
exigências permanecem as mesmas desde Doha, há dois anos e
meio.
O G20, por exemplo, segundo o
chileno Bittar, quer que os europeus aceitem reduzir seus subsídios agrícolas sem "uma exigência rígida de acesso a mercado"
(dos países em desenvolvimento).
Se os europeus aceitarem, "o
G20 estaria disposto a ser mais flexível", relata Bittar.
A firmeza com que os europeus
cobram abertura que compense o
seu lance agrícola indica que esse
tipo de barganha não está à vista.
Os Estados Unidos, por sua vez,
ao mesmo tempo em que aceitam
a proposta européia, cobram
também movimento tanto do Japão (ainda mais protecionista na
agricultura) como do G20, que,
segundo Zoellick, é ágil em rejeitar as propostas de redução tarifária dos países ricos, mas não consegue apresentar sua própria alternativa.
Nesse ponto tem razão, tanto
que o G20 na reunião de ontem
decidiu preparar uma proposta
para a redução de tarifas não-agrícolas, ao julgar que o modelo
defendido por Estados Unidos e
Europa "está morto", como afirma o chanceler brasileiro Celso
Amorim.
Mas a proposta alternativa não
estará pronta para o novo balé de
hoje em Paris.
Texto Anterior: Vizinho em crise: Argentina adia revisão de acordo com FMI Próximo Texto: Energia: Petróleo fecha acima de US$ 41 pela 1ª vez Índice
|