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São Paulo, sábado, 14 de junho de 2003

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LUÍS NASSIF

Duelo de gigantes

Da série "em todo lugar é assim":
Um dos temas recorrentes do pessoal do Banco Central é que em todo país civilizado as decisões do BC são técnicas e seus diretores, operadores de mercado, único em condição técnica de entender o funcionamento da economia e cumprir a única função que se espera de um banco central: perseguir o controle inflacionário.
Vamos conferir no capítulo de hoje da série o que diz Joseph Stiglitz, economista com reputação internacional equivalente à avaliação que nosso Henrique Meirelles faz de si próprio, posto que Prêmio Nobel de Economia de 2001 e professor da Universidade Columbia, em artigo publicado nesta semana no "The Guardian".
Para Stiglitz, "controlar a inflação não é um fim em si mesmo: é apenas um meio de chegar mais rápido ao crescimento estável e com desemprego mais baixo". Há poucas evidências de que bancos centrais focados exclusivamente na estabilidade de preços sejam mais eficientes. Ele menciona seu colega George Akerlof, com quem dividiu o Prêmio Nobel em 2001, que tem alegado que existe um nível de inflação ótimo sempre maior do que zero. "Nesse sentido, uma busca implacável por estabilidade de preços machuca o crescimento econômico e o bem-estar", diz Stiglitz.
Stiglitz ousa contradizer Meirelles, nosso Alan Greenspan, e sustenta que a maior prova de que a prioridade única dos BCs não pode ser apenas a inflação é a atuação do Fed (Federal Reserve, o banco central dos Estados Unidos). Além de garantir a estabilidade de preços, a autoridade monetária norte-americana visa promover o crescimento e o pleno emprego. "Há consenso nos Estados Unidos contra uma atuação estreita, como a que está em vigor no Banco Central Europeu. Hoje, a economia européia definha porque o BCE está mais preocupado com sua meta de inflação do que em promover a recuperação econômica", afirma ele.
E -heresia das heresias- Stiglitz ousa criticar a suposta visão técnica dos operadores de mercado. Diz ele que "os tecnocratas e "players" do mercado financeiro que se beneficiam desse arranjo institucional [com a inflação sendo o foco de atuação dos bancos centrais] têm feito um bom trabalho ao convencer muitos países de suas virtudes e da necessidade de tratar a política monetária como uma questão técnica". No entanto, pondera Stiglitz, como são decisões de perdas e ganhos, elas só podem ser tomadas por meio de processos políticos.
Continua Stiglitz, o apóstata: "Muitos na comunidade financeira têm pouco conhecimento sobre o intricado funcionamento do sistema macroeconômico -como já foi evidenciado pelos frequentes erros na gestão macroeconômica", diz.
Para países emergentes, Stiglitz sugere que seja posta em discussão não só a questão da autonomia dos bancos centrais mas também sua representatividade e delegações. "Eles [bancos centrais de países em desenvolvimento] precisam balancear as preocupações com eficiência econômica e com responsabilidade democrática", conclui.

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