São Paulo, quinta-feira, 14 de junho de 2007

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VINICIUS TORRES FREIRE

PIB: bom, medíocre, estável

País cresce bem mais do que previam os financistas, mas estabilidade revela como é difícil sair da mediocridade

O PAÍS DEU MAIS passinhos numa espécie de nova era de mediocridade, não digamos dourada, um exagero, nem mesmo prateada, mas, vá lá, bronzeada, indicam os dados do PIB do início de 2007. Crescer na faixa dos 3,5% a 4,5% não é nada brilhante: é um lembrete do Brasil "devagar e sempre", bem diferente daquele pintado pela recente euforia financista e por gente com paranóia de inflação, quase a mesma coisa, aliás.
Mas, para uma economia que passou um quarto de século à base de racionamento de PIB, na faixa dos 2,5% anuais, a melhora é um alívio e abre uma "janela de oportunidade".
De mais interessante, talvez, os últimos três anos de estabilidade ofereçam um banco de dados para quem se predisponha ao realismo.
Primeiro, está consideravelmente desmoralizada a rapaziada financista para quem o PIB potencial (o quanto o país pode crescer sem inflação) estaria na casa de 2%, 3%.
Segundo, não dá para dizer que o resultado da indústria, apesar de arrastado ou claudicante, esteja pior que o dos anos FHC. De meados de 1996 a meados de 2003, o nível geral de produção da indústria andou de lado. Havia picos e vales, nos momentos de choques. Desde então, a indústria cresce pouco, mas a tendência é de alta. Isto é, assim como na política, em que já foram testados todos os partidos, com grande decepção, vê-se que também na economia ora somos isso aí mesmo, essa lerdeza. Falta inovação, negócio novo, e não é só câmbio que atrapalha.
Terceiro, os dados de 2004 para cá indicam que é preciso dar uma revisada nos modelos que relacionam o nível de uso da capacidade instalada da indústria, o nível de investimento e a evolução dos preços. Sim, a política rígida do Banco Central ajudou a jogar para baixo as expectativas de inflação. Mas foi só isso? Não se trata nem de falar do efeito do dólar barato sobre a contenção de preços, nem da desinflação influenciada pela internacionalização maior da economia e dos produtos baratos de China e cia. Há muito que não se sabe sobre a produtividade brasileira.
Quarto, apesar das medidas estabilizadoras (déficit público menos demencial, preços contidos) e da redução na volatilidade da produção, a economia ainda depende demais do resto do mundo. O conjuntura global reboca o Brasil. Um dos motivos: a economia não consegue incorporar setores produtivos novos e significativos capazes de elevar a produtividade média e/ou geral, não mostra "dinamismo interno".
Talvez as coisas melhorem com um mercado de capitais mais vivo, juro menor (e imposto menor, o que não há, assim como infra-estrutura etc., a ladainha de sempre). Talvez não, vide a falta de dinamismo da indústria. Que negócio grande e novo está sendo gestado no país? Álcool e avião são projetos de 30 anos atrás.
Por fim, mudou para pior a relação entre PIB e emprego. A economia cresce mais e o desemprego continua pela casa dos 9%, 10%. Em suma, a economia reage à base de consumo maior, que corre a 5% ao ano.
O povo vive melhor, mais contentinho, ignaro e inexperiente de alternativas. Da elite aos "excluídos", um quarto de século de desastres, estagnações e decadência do pensamento crítico criou uma geração com expectativas reduzidas. Medíocres.


vinit@uol.com.br

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