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OPINIÃO ECONÔMICA
A situação, a oposição e o mercado
FERNANDO NOGUEIRA DA COSTA
A história de "O Velho, o
Menino e o Burro" é contada
há séculos na África, na Ásia e na
Europa. "Era uma vez um homem
já velho que ia para o mercado
com o filho pequeno e um burro
andando atrás..."
Aí encontraram um mercador
que lhes disse que o burro serve
para montar. O pai montou o menino no burro, seguindo viagem.
Pouco depois, passaram por um
especulador, que criticou a preguiça do menino. Ele acatou a sugestão de apear e ceder seu lugar
ao velho. A seguir, encontraram
economistas que criticaram o absurdo de deixar o filhinho andar a
pé.
Ele foi então para a garupa, e o
burro, cambaleando, seguiu para
o mercado. Foi quando encontraram as avaliadoras de risco, que
criticaram a crueldade com o pobre burro. O velho e o menino desmontaram, dependuraram o burro em uma tora e prosseguiram,
carregando-o. Chegando ao mercado, todos os presentes se espantaram com eles. O menino assustou-se e largou sua ponta da tora
justamente quando atravessavam
uma ponte. O burro se desequilibrou e caiu da ponte, afogando-se
no rio.
O velho e o menino aprenderam
uma lição com tudo isso. A moral
da história é: "Se você tentar agradar a todos, acabará não agradando a ninguém".
Essa história pode ser recontada, aqui e agora, em relação à
campanha eleitoral. Aparentemente semelhantes no desejo de
agradar ao mercado, os conteúdos dos discursos dos candidatos
da situação e da oposição sobre
política econômica têm significados bem distintos. Chegamos a essa conclusão se comparamos as
possibilidades de consistência dinâmica de cada uma delas, apresentadas a seguir, usando um modelo de macroeconomia aberta.
Manter a situação, tentando
agradar aos palpiteiros do mercado, significará manter a elevada
taxa de juros, desestimulando os
gastos privados. Os gastos governamentais não compensarão esse
vazio devido à Lei da Responsabilidade Fiscal, ao corte de impostos
e à privatização das empresas estatais. Sobrará como único fator
expansionista da demanda agregada o eventual saldo líquido de
exportações em caso de sucesso da
pretendida política industrial.
O que ocorrerá, então, a médio
prazo? Com a mobilidade perfeita
de capitais, esse impulso na demanda agregada e, a curto prazo,
na renda, provocará aumento da
demanda por moeda. A oferta de
moeda e a taxa de juros, permanecendo estáveis devido ao regime de metas inflacionárias, não a
validarão. A confiança do mercado internacional nessa política
propiciará a arbitragem com os
juros aqui mais elevados, aumentando o saldo da conta de capital.
O balanço de pagamentos terá superávit, o que, em um regime
cambial flutuante, levará à apreciação da moeda nacional. Cairá
a taxa de câmbio real e, com ela, a
competitividade externa da economia brasileira.
De fato, se a taxa de câmbio for
flutuante, a entrada líquida de
capital provocará uma apreciação da moeda nacional que deteriorará o balanço comercial e
exercerá um efeito depressivo sobre a renda. Esse efeito contrariará o efeito expansivo inicial do
acréscimo de saldo comercial positivo. Enfim, haverá uma espécie
de efeito esvaziamento cambial
da exportação e da produção nacional, este devido à concorrência
com as importações. A política
econômica não terá consistência
dinâmica. Apesar de tentar agradar ao mercado, dará com os
"burros n'água".
Com a eventual vitória da oposição, o mercado ficará contrariado a curto prazo, porém a consistência dinâmica de sua política
econômica agradará a todos a
longo prazo. Se não, vejamos. A
progressividade da tributação
propiciará maiores gastos sociais
do governo. Os gastos privados
também se elevarão: o consumo,
pela melhoria da distribuição de
renda, e o investimento, pela queda da taxa de juros. Tendo sucesso também no aumento líquido
das exportações, todos os componentes da demanda se expandirão.
A grande diferença estará justamente no grau de mobilidade do
capital. Nesse caso de imobilidade
de capital, devido à contrariedade
do mercado internacional pela vitória da oposição, as variações da
taxa de juros -a elevação com a
política fiscal frouxa poderá ser
compensada com a redução pela
política monetária expansiva-
não terão efeito sobre a conta de
capital. O saldo do balanço de pagamentos será afetado somente
pela deterioração da balança comercial.
O aumento de importações, induzido pela expansão da renda,
em um regime de câmbio flexível,
provocará uma depreciação da
moeda nacional tal que tenderá a
restabelecer o equilíbrio da balança comercial. Melhorará a relação
competitividade-preço dos produtos nacionais vis-à-vis aos estrangeiros. Crescerá, então, a eficácia
do efeito expansionista da política
monetária e da política fiscal. O
risco inflacionário dessa política
econômica expansiva aumentará,
pois a depreciação da moeda nacional elevará os preços dos produtos importados e, por contágio,
os preços dos bens produzidos internamente e a taxa de salário.
Porém a consistência dinâmica
será alcançada com a simultânea
elevação da oferta agregada de
bens e de serviços.
Fernando Nogueira da Costa, 50, é professor associado do IE-Unicamp e
coordenador da área de economia da Fapesp. É autor dos livros "Economia em 10
Lições" e "Economia Monetária e Financeira: Uma Abordagem Pluralista".
E-mail - fercos@eco.unicamp.br
Hoje, excepcionalmente, não é publicado
o artigo de Antonio Barros de Castro.
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