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São Paulo, domingo, 14 de setembro de 2003

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CENÁRIOS

Compra de máquinas está na base de 40% do investimento feito no país, diz Cláudio Frischtak, ex-Banco Mundial

Taxar importado trava produção, diz analista

VINICIUS MOTA
DA REPORTAGEM LOCAL

Taxar produtos importados na mesma proporção com que são taxados os fabricados no Brasil pode ser ruim para os investimentos produtivos, afirma o economista Cláudio Frischtak, 53.
O princípio da isonomia, presente no texto da reforma tributária aprovado na Câmara dos Deputados, permite que o fisco brasileiro grave com PIS e Cofins os importados.
De acordo com Frischtak, que trabalhou no Banco Mundial de 1984 a 1991, a compra de novas máquinas e equipamentos do exterior está na base de 40% de todo investimento feito no país. Aumentar a tributação dessas transações, na sua opinião, seria um desestímulo ao gasto na ampliação da capacidade produtiva no Brasil.
Em entrevista, o economista -doutor pela Universidade Stanford (EUA) e hoje consultor de empresas- se mostrou otimista em relação ao comportamento dos juros e do risco Brasil neste e no próximo ano. "Vamos terminar 2004 com Selic [taxa básica de juros] em torno de 13% ao ano", disse. Leia a seguir trechos de entrevista concedida à Folha.
Cláudio Frischtak - A desoneração das exportações é um estímulo ao investimento. Em segundo lugar, do ponto de vista da equidade entre os Estados houve um avanço, e nós teremos, possivelmente, um regime tributário menos extorsivo. Em terceiro lugar, existe hoje um forte sentimento na sociedade e no governo de que é importante desonerar a aquisição dos bens de capital.
Um aspecto potencialmente adverso é que, ao criar o conceito de isonomia de tributação entre os bens importados e os domésticos, a reforma pode fazer aumentar a carga tributária sobre os bens de capital comprados no exterior.
Aproximadamente 40% dos investimentos no país dependem da importação de bens de capital. Portanto isso pode ser ser um desestímulo aos investimentos.

Folha - Que outros instrumentos poderiam ser acionados para estimular os investimentos no país?
Frischtak -
Se o governo fizesse agora um esforço de estimular o investimento, o impacto seria pequeno. Há um desestímulo grande, com crescimento baixo.
No ano que vem, com a retomada do crescimento, o esforço maior deve ser baixar o custo do capital. Reduzir os juros reais e o risco-país já seria grande avanço. Deve-se buscar também a desoneração fiscal dos bens de capital.
Além disso, há um elemento adicional, que tem a ver com os problemas de regulação em setores de infra-estrutura (comunicações, energia e transportes).

Folha - O nível de câmbio tem influência no investimento?
Frischtak -
Nossas simulações mostram que a taxa de câmbio exerce influência pequena no investimento. Se, de um lado, o câmbio desvalorizado estimula as exportações, de outro desestimula o investimento pelo aumento do custo dos bens de capital importados. O efeito líquido é neutro, ou quase neutro.
Pode-se argumentar que, dado o tamanho do nosso passivo externo líquido e da dívida externa diante das exportações, ainda existe um nível de vulnerabilidade externa muito grande.
Essa vulnerabilidade só será afastada efetivamente quando o crescimento das exportações for muito significativo e pudermos dobrar as vendas externas em três, quatro anos. Para isso, aí se necessitaria de um câmbio agressivamente desvalorizado.

Folha - Qual a sua expectativa para o comportamento do juro real e do risco-país até o final de 2004?
Frischtak -
Como o Banco Central atuou com uma certa ousadia responsável com a taxa de juros nominais de curto prazo (a Selic), a tendência dos próximos meses é uma redução da taxa de juros real.
Nós vamos terminar este ano com uma Selic possivelmente em torno de 18% e 2004 com essa taxa em torno de 13% ao ano. Se nós tivermos taxa Selic em torno de 13% e uma inflação de 5,5%, nós teremos 7,5% de juros reais ao ano.
Quanto ao risco-país, a menos que haja um cenário econômico internacional adverso, eu não vejo razões objetivas para não haver uma redução contínua do risco Brasil, que pode chegar ao final de 2004 entre 400 e 450 pontos.
O governo Luiz Inácio Lula da Silva conseguiu fazer ajustes no meio de uma recessão. Com retomada do crescimento, a capacidade do governo de fazer o superávit primário, necessário para reduzir a relação dívida líquida/PIB, é muito maior.

Folha - Qual o papel do Estado na retomada do investimento?
Frischtak -
Um papel muito relevante. Em primeiro lugar, ao criar um clima positivo ao investimento. Além disso, há investimentos fundamentais para o crescimento do país que não são rentáveis. A construção, por exemplo, de uma ferrovia importante, estruturante, em qualquer país do mundo é feita pelo Estado.
Também é preciso investir maciçamente em educação e saúde. Todos os países hoje estão convencidos de que têm que investir em educação para garantir competitividade. Alguns deram saltos colossais: Irlanda, Coréia do Sul. A Espanha deu um grande salto.
O objetivo do nosso país deveria ser a universalização da educação de segundo grau de qualidade. Seria fundamental para poder estimular o investimento.


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