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ANÁLISE
Ortodoxia permanece após quitação de dívida
GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Ironicamente, o partido que
bradava "Fora, FMI" mostrou-se o melhor cliente do organismo.
Mas, hoje, faz sentido: mergulhado desde o primeiro dia na contradição entre a cartilha econômica ortodoxa e a base social de esquerda, o governo Lula adotou
medida que oferece a oportunidade de um discurso capaz de agradar a seus dois principais e contraditórios pilares de sustentação.
A quitação antecipada da dívida
com o FMI pode ser defendida
com argumentos ao gosto do
mercado financeiro e dos demais
defensores dos "bons fundamentos econômicos". Dá uma demonstração de solidez das contas
externas, eleva a credibilidade internacional do país, reduz os custos para o Tesouro etc. etc.
Ao mesmo tempo, pode ser
apresentada nos palanques de
2006 como a prova de que o governo petista livrou o país da tutela do organismo internacional
que sempre foi alvo preferencial
das palavras de ordem dos tempos de oposição, reforçando uma
tese iniciada já na decisão de não
renovar o acordo com o Fundo,
no início deste ano.
Melhor ainda: permite uma
comparação das mais vantajosas
com os arqui-rivais tucanos e pefelistas. O governo FHC, afinal, teve de recorrer nada menos que
três vezes ao FMI -na última,
deixando para seu sucessor um
acordo em andamento e a condição de maior devedor do Fundo.
Mas, retórica à parte, nada muda tanto assim. Para a maior parte
do mercado, o Brasil continua
uma economia vulnerável a eventuais turbulências financeiras. Foram modestos os avanços obtidos
no principal indicador da fragilidade do país, a dívida pública superior a 50% do PIB; o real se
mantém entre as moedas mais
voláteis do mundo.
Pelos mesmos motivos, não se
deve acreditar que a autonomia
formal em relação ao FMI -com
a quitação, o Brasil deve deixar a
condição de economia sob monitoramento do Fundo- vá se traduzir em uma política econômica
mais distante da ortodoxia.
Segundo as avaliações colhidas
pela Folha, a cúpula do governo,
embora deseje "flexibilizar" a política econômica, não vê margem
para abandonar nenhum de seus
princípios básicos: juros fixados a
partir de metas de inflação decrescentes, câmbio flutuante e
adoção de metas fiscais apertadas
até a queda da dívida pública para
um patamar perto de 40% do PIB.
Não há, por exemplo, justificativa
técnica para abrandar a meta de
inflação de 4,5% fixada para 2006.
No momento, as discussões internas se limitam a ajustes de dosagem. O superávit fiscal destinado ao pagamento de juros não deverá mais ser tão superior à meta
oficial de 4,25% do PIB, mas pode-se acelerar a queda dos juros e
o BC pode continuar atuando para deter a queda do dólar. E isso se
a conjuntura continuar favorável.
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